UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO MESTRADO EM DIREITO RACHEL DOS REIS CARDONE POLÍTICAS PÚBLICAS TRIBUTÁRIAS COMO INSTRUMENTO DE VINCULAÇÃO DO DEVER ESTATAL NA PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE Caxias do Sul 2012 2 RACHEL DOS REIS CARDONE POLÍTICAS PÚBLICAS TRIBUTÁRIAS COMO INSTRUMENTO DE VINCULAÇÃO DO DEVER ESTATAL NA PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Direito Stricto Sensu da Universidade de Caxias do Sul, como parte dos requisitos necessários para a obtenção do título de Mestre em Direito na linha de pesquisa Direito Ambiental e Novos Direitos. Orientador: Prof. Dr. Enzo Bello Caxias do Sul 2012 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Universidade de Caxias do Sul UCS - BICE - Processamento Técnico C268q Cardone, Rachel dos Reis Políticas públicas tributáras como instrumento de vinculação do dever estatal na proteção do meio ambiente / Rachel dos Reis Cardone. – 2012. 159 f. ; 30 cm Apresenta bibliografia. Dissertação (Mestrado) – Universidade de Caxias do Sul, Programa de Pós-Graduação do Mestrado em Direito, 2012. Orientador: Prof. Dr. Enzo Bello. 1. Direito ambiental - Impostos. 2. Política pública. 3. Desenvolvimento sustentável. I. Título. CDU 2.ed.: 349.6:336.226.44 Índice para o catálogo sistemático: 1. Direito ambiental – Impostos 349.6:336.226.44 2. Política pública 304.4 3. Desenvolvimento sustentável 332.246.2 Catalogação na fonte elaborada pela bibliotecária Ana Guimarães Pereira – CRB 10/1460 4 Dedico este trabalho ao meu incondicional amor Fernando, pelo eterno incentivo e apoio nesses vinte e cinco anos de trajetória pelos meus caminhos do Direito. 5 AGRADECIMENTOS À Universidade de Caxias do Sul, ao Coordenador, Prof. Dr. Sérgio Augustin e a todos os Professores Doutores do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade de Caxias do Sul e, especialmente, àqueles pelos quais tive a honra de ser aluna, responsáveis diretos por minha formação no Direito Ambiental: Maria Claudia Crespo Bauner, Alindo Butske, Maria de Fatima Schumacher Wolkmer, Leonel Severo Rocha, Maria Carolina Rosa Gullo, Jeferson Dytz Marin, Wilson Antônio Steinmetz, Sandro Trescastro Bergue, Carlos Alberto Lunelli e Antonio Maria de Freitas Iserhard. De todos guardo um pedaço e agradeço pela oportunidade de me fazer enxergar com mais clarividência nosso complexo mundo. Ao meu orientador, Prof. Dr. Enzo Bello, modelo a ser seguido pela conjugação de juventude, inteligência, seriedade e altruísmo acadêmico e, não menos importante, por sua competência, carinho e zelo na condução do orientar desta dissertação. À indescritível Francielly Pattis, por seu trabalho eficiente e prestimoso assim como seu poder de ubiquidade no gerenciar de suas incontáveis tarefas na secretaria do mestrado, sempre recebendo todos com seu caloroso sorriso. A todos os inesquecíveis colegas da Turma XI que convivi por apenas três semestres, mas que já deixam marcas e muita saudade: Alexander Corrêa Pinheiro, Cristina Dias Montipó, Eliane de Oliveira Borges, Fabiana Barcelos da Silva, Fernanda Favarini Odorissi, Jefferson da Silva Varella, Juliana Chilanti Tonial, Laíse Graff, Natacha Souza Jonh, Nicole da Silva Paulisch, Nivaldo Comin, Ricardo Antônio Serrano Osório, Sergionei Corrêa e Vera Lúcia Steiner, de todos também guardo um pedacinho. E aos inesquecíveis Bruno Gabriel Henz, por sua genialidade prematura; à Siele Pontalti, por sua sublime beleza espiritual; à Nicole Freiberger Pimmel, por sua invejável serenidade e parceria; ao Cristiano de Souza Lima Pacheco, por seu incansável ativismo ambiental e aos queridos amigos Jerônimo Giron, por sua pureza interior e Mateus Lopes da Silva, por seu inquestionável companheirismo. Não posso deixar de lembrar dos sagazes predecessores da Turma X que serviram de inspiração aos novatos: Rogerio Santos Rammê, Márcio Frezza Sgarioni e Fabio Scopel Vanin. Por fim, a toda minha família de que tive que me afastar por inúmeras vezes 6 para alcançar esse sacrificado objetivo – o título de mestre – e que tanto senti falta nas longas e inúmeras viagens do Rio Grande a Caxias do Sul. Agradeço em especial, aos meus amados Fernando e Daniela, meu sustentáculo de vida, por toda paciência despendida nesse meu projeto pessoal e, aos meus pais, a dona de casa Dona Tuca e ao magistrado Dr. Apody (in memoriam), responsáveis por plantar em mim a sementinha do Direito e fornecer-me a base da minha formação como pessoa. 7 “Para nascer, o sonho dos utopistas necessitava de duas condições. Primeiro, um sentimento irresistível (mesmo que difuso e ainda não articulado) de que o mundo não estava funcionando de maneira adequada e de que era improvável consertá-lo sem uma revisão completa. Segundo, a confiança na capacidade humana de realizar essa tarefa, a crença de que ‘nós, humanos, podemos fazê-lo’, armados como estamos da razão capaz de verificar o que está errado no mundo e descobrir o que usar para substituir suas partes doente, assim como a capacidade de construir as armas e ferramentas necessárias para enxertar esses projetos na realidade humana. Em suma, era necessário a confiança de que, sob a administração humana, o mundo poderia ser colocado numa forma mais adequada à satisfação das necessidades do homem - não importa quais fossem ou pudessem ainda vir a ser essas necessidades.” Zigmund Bauman, Tempos Líquidos. 8 RESUMO O Estado detém a tarefa constitucional de proteger o meio ambiente. A presente dissertação teve por finalidade abordar a relevância da adoção de políticas públicas na seara tributária como forma de preservar os recursos naturais. Pela iminência do Estado Socioambiental de Direito, resta configurada o dever estatal na garantia de um meio ambiente ecologicamente equilibrado. Percebe-se que a constitucionalização dos diretos ambientais não foram suficientes a estancar sua violação, considerando a ineficiência das inúmeras normas infraconstitucionais no trato de sua proteção. Assim, mesmo presente uma normatização, relativamente, completa e evidenciando um trabalho atuante do Poder Legislativo, restam muitos caminhos a se perseguir, mormente na adoção de políticas ambientais, remédio este que tem mostrado eficiente resultados em outros países. Dentre as várias formas de política ambiental, o direcionamento à área tributária mostra-se eficaz, na medida em que há um liame indissociável entre ambiente, Direito e Economia. O tributo ambiental constitui mais uma estratégia da política pública ambiental, visto que envolve a cooperação do Estado e do cidadão no alcance à sustentabilidade, atento a determinação constitucional de conjugação dos princípios da Ordem Financeira com os da defesa do Meio Ambiente. Característica marcante do tributo ambiental é sua extrafiscalidade, com poder de conduzir os interesses do contribuinte para ações amigas da natureza. Essa não é sua única qualidade, sendo que pelo uso do princípio do poluidor-pagador é possível internalizar as internalidades negativas das ações violadoras do meio ambiente e, assim, corrigir distorções do mercado. Empregando uma abordagem econômica do direito tributário, os indivíduos passam a maximizar racionalmente suas satisfações e, consequentemente, mudam seu comportamento em favor da natureza, cumprindo o Estado sua missão insculpida na Carta Constitucional, que acabou por adotar, a partir de 1988, o modelo de Estado Socioambiental de Direito. Palavras-chave: Estado. Função socioambiental do Estado. Políticas públicas. Tributação ambiental. Desenvolvimento sustentável. Extrafiscalidade. Racionalidade econômica. 9 ABSTRACT The State has the constitutional duty to protect the environment. This dissertation has taken aimed to address the relevance of the adoption of public policies in the tributary area as a way to conserve natural resources. By the imminence of the State Environmental of Law, remains configured the duty of state in ensuring a ecologically balanced environment. It is noticed that the constitutionalization of direct environmental were not enough to stop its violation, considering the inefficiency of many below of the constitution standards in dealing with their protection. So even which present a regulation relatively complete and showing an active work of the Legislative Power, there remain many avenues to pursue, especially in adopting environmental policies, this remedy has proven effective results in other countries. Among the various forms of environmental policy, directing the tributary area is effective, to the extent that there is an inseparable bond between the environment, law and economics. The environment tax is more a strategy of environmental public policy, since it involves the cooperation of the state and citizens in achieving sustainability, given the determination of constitutional combination of the principles of the Order of the Financial with Environmental Defense. Striking feature of the environment tax it is the behind the tribute with power to drive the interests of the taxpayer for friendly actions of nature. This is not his only quality, and by use of the polluter-pays can internalize the negative internalities of the actions which violate the environment and correcting the market distortions. Employing an economic approach to tributary law, the individual shall be rationally maximize their satisfaction and consequently change their behavior in favor of nature, the state fulfilling its mission entered the Constitutional Charter, which eventually adopt, from 1988, the model of the State Environmental of Law. Keywords: State. Environmental function of the State. Public policies. Environmental taxation. Sustainable development. Behind the tribute. Economic rationality. 10 SUMÁRIO INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 11 1. A FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DO ESTADO ..................................................... 17 1.1 Sociedade de Risco e os reflexos no meio ambiente .......................................... 19 1.2 A Constitucionalização da Proteção Ambiental no Estado Socioambiental de Direito ........................................................................................................................ 28 1.3 Ineficiência das normas no trato da defesa do meio ambiente ............................ 38 1.4 Vinculação Estatal no Dever à Adoção de Políticas Públicas Ambientais ........... 48 2. A POLÍTICA AMBIENTAL E SEUS IMPACTOS NA ORDEM SOCIAL, ECONÔMICA E TRIBUTÁRIA ................................................................................... 59 2.1 Diretrizes à adoção de política ambiental ............................................................ 60 2.2 Políticas Públicas Ambientais, economia e direito: um diálogo necessário ......... 76 2.3 Tributo como estratégia de uma política ambiental ............................................. 90 3. TRIBUTO AMBIENTAL ....................................................................................... 102 3.1 O Tributo Ambiental como Instrumento de Promoção do Desenvolvimento Sustentável.............................................................................................................. 103 3. 2 O Tributo Ambiental e sua Função Extrafiscal ................................................. 115 3.3 A Aplicação do Princípio do Poluidor-Pagador na Tributação Ambiental como Forma de Internalização das Externalidades Negativas ......................................... 125 3.4 Racionalidade Econômica, Tributo e Ambiente ................................................. 133 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 145 REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 151 11 INTRODUÇÃO A proteção ao meio ambiente é assunto que passou por grande transformação no direito brasileiro no final do século passado e, recentemente, vem aparecendo com enorme força na mídia e no meio acadêmico. Isso se deve, especialmente, à preocupação com o aquecimento global e suas possíveis consequências à sobrevivência dos seres humanos. Tal proteção, contudo, reveste-se de um caráter sui generis, pois é um direito cujo titular não é aquele que efetivamente será protegido, já que os efeitos da ação humana sobre a natureza podem provocar consequências nefastas no presente, repercutindo, inclusive, naqueles que virão. Diante dessa racionalidade, surge o princípio da responsabilidade entre gerações, em que as gerações presentes não podem utilizar o meio ambiente de forma a provocar a sua escassez para as gerações vindouras. Em paralelo a essa convergência protetiva, percebe-se que as formas de atuação do Estado em face do dano ecológico vêm se mostrando insuficientes, porque lidam, na maioria das vezes, apenas com a reparação do dano ambiental, ou seja, a intervenção do Estado ocorre depois que a lesão ocorreu. Assim, o legislador não pode se ater apenas a tentar retornar ao estado original, deve ele motivar que atos/fatos danosos não aconteçam. Considerando as assertivas de que o Estado é o detentor exclusivo do poder da gestão pública, interferindo na ordem econômica, na arrecadação dos recursos públicos/privados, na preservação/degradação dos recursos naturais, entre outras searas, é inevitável a constatação da relação entre a atuação do Estado e a coletividade: àqueles, por meios diversos, devem salvaguardar o berço ecológico, fomentando a formação de uma conscientização ecológica, sendo a intervenção tributária um dos mecanismos possíveis. A proteção ao meio ambiente está, inevitavelmente, associada à economia, a políticas sociais e ao desenvolvimento sustentável. Ressalta-se que a celeuma sobre tal desenvolvimento recai justamente sobre a compreensão das relações da sociedade para com o meio natural, a adequação do direito ambiental a uma política para além das inúmeras discussões acadêmicas sobre o alcance real e a consequente conservação dos recursos naturais. Deve-se ter em mente que a proteção ao meio ambiente não pode paralisar 12 as atividades econômicas, pois, em tese, tais empreendimentos garantem as bases vitais de sustentação da sobrevivência do ser humano. Assim, deve-se buscar uma proteção mais eficiente, contando com o saber fazer das atividades econômicas. O direito ao desenvolvimento sustentável abarca essencialmente normas capazes de instrumentalizar políticas de desenvolvimento embasadas na qualidade das condições existenciais dos cidadãos. Para tanto, o Estado possui um papel primordial ao delimitar a atuação das forças de mercado, sendo as obrigações tributárias especialmente importantes, já que o poder de cobrar tributos pode colimar a compatibilização de políticas públicas que aumentem as potencialidades do homem e do meio natural, tendo como fulcro a pesquisa científica, preservando dessa maneira os recursos naturais, e evitando seu exaurimento. O desenvolvimento sustentável vincula-se à atividade econômica, pois para os economistas, o crescimento constante da economia é necessário para expandir o bem-estar das pessoas e para os ambientalistas é indispensável a preservação/conservação do meio ambiente para se atingir o bem-estar social. Desse modo, o desenvolvimento sustentável é uma atividade de risco, pois tem de harmonizar dois primados que, em tese, destoam entre si. Assim, o grande desafio para a consecução do desenvolvimento sustentável, está em conciliar a limitação dos recursos naturais com o ilimitado crescimento econômico, onde o máximo econômico reflita igualmente um máximo ecológico, de forma a de fato expandir-se o bem-estar, assumindo que a sustentabilidade é condição necessária para o crescimento econômico. A cultura ambiental tem por fundamento o princípio da cooperação, que faz parte da estrutura do Estado Social, também associado ao princípio do acordo. Ele orienta a realização de políticas relativas ao objetivo de bem-comum, própria da razão constituidora do Estado. Nasce, dessa forma, uma constitucionalização da possibilidade de instituição de tributos ambientais. Embora a Lei Maior não preveja expressamente que o tratamento diferenciado será efetivado mediante uma carga tributária distinta, autoriza a utilização de instrumentos tributários destinados à defesa do meio ambiente que deverão ser criados em um futuro muito próximo. Demonstra-se factível a utilização de tributos para assegurar a preservação do meio ambiente em consonância com o nosso ordenamento jurídico. Também é correto supor que, nesse caso, o principal objetivo do tributo não será aumentar a 13 arrecadação dos cofres fazendários, mas evitar – ou ao menos minimizar – os danos causados ao meio ambiente sem impedir o desenvolvimento econômico, especialmente, do País. Estando o direito tributário mais ligado a fatores modernos da sociedade, atuando basicamente sobre fatos econômicos e observando a integração do direito ambiental com todos os setores do direito, surge a possibilidade de utilizar-se daquele como meio de auxílio deste na proteção ao meio ambiente. Não obstante a gama de instrumentos protetivos, o Estado ainda está muito longe de oferecer uma efetiva garantia de que os resultados serão realmente relevantes. Não deve ser esquecido que é função institucional do Estado a preservação ambiental, sendo que o vínculo com as atribuições fiscais pode repercutir positivamente sobre as futuras gerações. Para que as ações de consciência ambiental se concretizem, de forma a criar de fato uma aceitação e ação por parte dos indivíduos, serão necessárias novas formas de implementação de políticas públicas, utilizando alternativas economicamente viáveis, pautadas na responsabilidade social e na alteração no modelo econômico, estimulando a mudança de paradigmas. Portanto, sugere-se a criação de benefícios fiscais para que o ente protetor (pessoa física ou jurídica) desenvolva uma cultura ambientalista sólida. Objetiva-se estruturar valores ecológicos permanentes próprios de um verdadeiro Estado Socioambiental, alcançando o desenvolvimento econômico sustentável e humano, preservando o meio ambiente para as futuras gerações sem, com isso, impedir que o desenvolvimento econômico e a arrecadação do Estado sejam afetados. A degradação do meio ambiente natural gerada pelo comportamento humano na sociedade de risco contemporânea exige um pacto entre Estado e indivíduos na busca de um desenvolvimento sustentável. O Estado tem por finalidade a realização do bem comum por meio da administração pública, que executará políticas públicas e planos de ação para que o Estado funcione tendo como referência a sociedade. Assim, a utilização de políticas públicas tributárias parece vir ao encontro desse propósito levando em consideração a interdependência das ordens econômica e financeira no Direito. O fenômeno da tributação interfere de forma direta na riqueza individual. O Estado, através dos tributos, retira parcela da riqueza privada transferindo-a para a coletividade. O tributo ambiental tem por finalidade inserir nessa mecânica em prol 14 do ambiente, ou seja, quanto melhor para o meio ambiente, menor a transferência da parcela da riqueza do indivíduo ao Estado. A busca por um meio ambiente saudável tornou-se tão relevante para o bem-estar do homem que transformou o constitucionalismo brasileiro, a partir de 1988, ao exigir de todos – Estado e cidadãos – a proteção do meio ambiente. O Estado Socioambiental foi além, exige a conciliação da ordem econômica com a proteção ambiental. Essa mudança de paradigma ocorreu face ao crescente processo de degradação da natureza provocada pela busca desenfreada e inconsequente do desenvolvimento econômico. Ao mesmo tempo que o Estado detém o poder exclusivo de arrecadar e administrar os recursos públicos, possui o dever constitucional da tutela do ambiente. Considerando a relevante influência da ordem econômica e tributária nas relações jurídicas, o emprego de políticas públicas tributárias mostra-se apto a combater a inefetividade das normas voltadas à proteção ambiental. A relevância da presente pesquisa respalda-se no argumento de que a adoção desse instrumento não requer grandes investimentos, apenas conhecimento técnico sobre sua implementação; possui grande poder de efetividade; e induz mudanças comportamentais por parte do contribuinte em prol da natureza. Assim, o emprego da tributação ambiental poderá contribuir com as relações entre Estado – homem – natureza, melhorando a qualidade de vida, gerando consciência sem descuidar do progresso convergente à sustentabilidade. Esta dissertação está alicerçada na teoria constitucional, na teoria dos direitos fundamentais e nas contribuições do chamado direito ambiental tributário. O tema proposto tem como cerne questionar se a União Federal pode ser mais eficiente na proteção ambiental em face da falta de efetivação das normas constitucionais e infraconstitucionais, através da incorporação de políticas públicas tributárias. A hipótese da presente dissertação colima demonstrar que no modelo de Estado Socioambiental brasileiro existe a possibilidade da União Federal ser mais eficiente na proteção ambiental utilizando-se de políticas públicas tributárias como estratégia no cumprimento de seu dever constitucional de garantia de um meio ambiente saudável. Nesse processo, ao mesmo tempo em que se exigiria uma alfabetização ecológica para sua implementação, faria nascer no contribuinte mudança de comportamento ao desejar auferir as vantagens de ações amigas da 15 natureza e/ou fugir das penalidades tributárias decorrentes de comportamentos ambientais danosos (princípio do poluidor-pagador). O objetivo geral é apresentar a potencialidade na adoção de políticas públicas tributárias face à ineficiência normativa no Brasil na defesa do meio ambiente, destacando-se o dever institucional do Estado nessa tarefa. Os objetivos específicos diluem a racionalidade proposta pela temática buscando: compreender o modelo do Estado Socioambiental da atualidade e a vinculação da União Federal nessa nova perspectiva; demonstrar que a eficiência normativa estatal na tutela do ambiente pode ser potencializada com a implementação de políticas públicas tributárias; evidenciar a relevância de uma alfabetização ecológica para a adoção de políticas públicas ambientais; esclarecer a conexão entre direito ambiental e econômico e a consequente contribuição da tributação ambiental à sustentabilidade; e compreender o papel do tributo ambiental como modificador de comportamento e suas limitações da defesa ambiental. O procedimento metodológico utilizado na edificação da dissertação é o indutivo, pela natureza do estudo desenvolvido e por se adequar melhor aos objetivos propostos. A técnica prioritária é a pesquisa bibliográfica, que revisou conceitualmente os eixos ligados às temáticas, utilizando-se de obras e artigos científicos como fonte para a formação argumentativa e as citações. A dissertação tem recorte eminentemente teórico. Detém-se na análise dogmática-normativa do direito fundamental ao ambiente, preferindo este enfoque à pesquisa jurisprudencial por ser mais adequado à conclusão do tema-problema proposto. O trabalho está dividido em três capítulos estratificados em itens, sendo que numa primeira abordagem é analisado o constitucionalismo socioambiental, garantidor do direito fundamental ao meio ambiente saudável, temas desenvolvidos por Robert Alexy, Norberto Bobbio e Canotilho. O art. 225 da CF/88 garante o direito ao ambiente ecologicamente equilibrado, atribuindo-lhe, a partir da cláusula de abertura do art. 5º, §2º, o status de direito fundamental do indivíduo e da coletividade. Para uma ampla compreensão da conformação jurídico-constitucional do direito ao ambiente faz-se mister, ainda, elucidar a sua natureza de direito fundamental completo ou como um todo, teorizado por Alexy. Hodiernamente, 16 reconhece-se, quase de forma unânime, que a qualidade e o equilíbrio ambiental são imprescindíveis para uma vida digna. Mais do que isso, a tutela de uma série de direitos fundamentais historicamente conquistados – tais como o direito à vida, à moradia, à saúde e à alimentação – torna-se inócua se não estiver atrelada à proteção do ambiente. A situação de vulnerabilidade existencial do ser humano em decorrência da degradação ambiental já alcançou um patamar capaz de prejudicar e quiçá comprometer o bem-estar individual e coletivo. Nesse contexto de crise, é imperioso que o direito constitucional e, mais precisamente, a teoria dos direitos fundamentais, evoluam para apresentar respostas satisfatórias aos graves problemas que se apresentam. Por fim, é analisada a compreensão a respeito da interação entre o direito ambiental e a economia e seus reflexos no direito tributário. Tal percepção é realizada por meio da corrente de pensamento conhecida por Análise Econômica do Direito – AED. A ideia foca a possibilidade de retirar dessa relação um caminho para a sustentabilidade, sendo utilizados os ensinamentos de Cristiane Derani e Claudia Dias Soares, a primeira nas questões ambientais econômicas e a segunda nas ambientais tributárias. 17 1. A FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DO ESTADO O Estado, como gerente das relações sociais, bem como da atuação de seus poderes e órgãos, fundamenta sua atuação pela existência de ordenamento jurídico, que referende direitos e deveres. Tais prerrogativas e obrigações são reflexos do ideário que o Estado adota. Observando a perspectiva brasileira, tem-se por hialino a noção de que ele subsume a ideia de um Estado Democrático de Direito. Contudo, nota-se que tal ideologia está sendo remodelada à compreensão de um Estado Democrático Socioambiental de Direito. Nessa linha, cabe aos agentes políticos, aos servidores e aos cidadãos se conformarem a tal concepção de Estado, para assim concretizar seus objetivos e princípios, os quais convergem para a condução das ações do Estado diante de uma reflexão pautada por uma consciência ecológica. Assim, expõe-se a relação existente entre a sociedade atual, que pode ser entendida como uma sociedade de risco e as repercussões de tal interação social. Ressalta que a sociedade de risco é analisada tendo por foco a exacerbação da técnica e da ciência em face de princípios como da precaução e prevenção, o que pode acarretar consequências socioambientais catastróficos e preocupantes às futuras gerações. Verifica-se a ocorrência da constitucionalização da proteção ambiental, 1 conformando o Estado brasileiro a noção de um Estado Socioambiental de Direito , em que os agentes estatais, bem como os cidadãos passam a ser entendidos como elementos integrantes do meio ambiente, tendo de zelar por ele para assim, qualificar a existência das presentes gerações e possibilitando a permanência das gerações vindouras. Embora exista uma constitucionalização da proteção, vislumbra-se que a aplicação de tais normas de cunho protetivo não são efetivas, pois os instrumentos à disposição não são adequados para que se incentive de maneira plena a preservação ambiental em harmonia com o desenvolvimento econômico. Por fim, como tentativa de arrefecer a inefetividade das normas de proteção 1 De acordo com um levantamento realizado por Fensteisefer, existem inúmeros e diferentes termos para denominar o “novo projeto” da comunidade estatal, dentre os quais podemos destacar denominações como: Estado Pós-social; Estado Constitucional Ecológico; Estado de Direito Ambiental; Estado de Ambiente; Estado Ambiental de Direito e Estado de Bem-Estar Ambiental. Nessa senda, utilizarei tais expressões no decorrer do trabalho como sinônimas. 18 ambiental, propõe a adoção de uma reflexão estatal voltada a consecução de práticas pautadas em políticas públicas intergradas e amplas, integrando os entes federados para concretizar uma idônea preservação ambiental. 19 1.1 Sociedade de Risco e os reflexos no meio ambiente A trajetória da humanidade mostra que a sociedade foi protagonista de grandes movimentos e observa-se que a questão sociológica caracteriza-se por ser um dos embriões das discussões que envolvem o tema proteção ambiental na atualidade. O Direito encontra na sociologia ponto de apoio teórico para a compreensão das relações humanas com o mundo das leis, verifica-se que a aproximação do Direito com a realidade social partiu das concepções de Aristóteles, quando traçou as primeiras diferenciações entre leis e costumes humanos e lei 2 natural. Nas últimas décadas, mudanças na sociedade marcaram a passagem de um período em que o bem-estar era analisado apenas do ponto de vista do desenvolvimento econômico para a valorização de um meio ambiente saudável. Passou-se a contabilizar as externalidades negativas de tal crescimento, sinalizando um déficit capaz de comprometer a própria sobrevivência no Planeta. A ameaça à vida humana fez com que os movimentos de proteção ambiental demarcassem um período de mudanças comportamentais geradas pela necessidade de manutenção da vida no planeta. A segurança das relações jurídicas, que outrora o Estado oportunizava, através da positivação das regras postas, tinha por meta assegurar certeza de estabilidade das relações sociais no presente frente às ameaças do futuro com base nas experiências do passado. Sobre a função Estatal, complementa: Sua meta principal era conferir segurança e estabilidade à sociedade, com um conjunto de regras positivadas, para a defesa do ordenamento jurídico contra circunstâncias de exceção que fugissem à sua lógica e pudessem subvertê-la. Fruto dessa concepção, o direito à segurança jurídica, previsto no art. 5º, XXXVI, da CF/88, tem como corolários o direito adquirido, a coisa 3 julgada e o ato jurídico perfeito. Todavia, a complexidade e o dinamismo das relações sociais não permitem que essa equação simples (dever ser das normas) forneça a segurança desejada, 2 SOUSA JÚNIOR, José Geraldo de. Sociologia jurídica: condições sociais e possibilidades teóricas. Porto Alegre: S. Fabris, 2002, passim. 3 BELLO, Enzo. Conflitos sócio-ambientais na sociedade do risco: um estudo de caso sobre os litígios fundiários no jardim botânico. In: Congresso nacional do CONPEDI, XVII, 2008, Brasília – DF. Anais, Brasília- DF, [S.n.], Nov. 2008. 20 pois que os remédios jurídicos do passado são ineficientes contra as novas demandas consequentes do risco. Eis a grande problemática a ser combatida pelo Estado: encontrar mecanismos para o tratamento da crise instaurada pelo risco. Hodiernamente, frente a esse novo paradigma ecológico que se apresenta, indaga-se sobre a interferência maléfica do ser humano na natureza com sua postura predatória do meio ambiente natural ao longo de sua história, deteriorando e consumindo a própria sustentação da sua vida, sem nenhuma preocupação com o futuro das gerações vindouras. A ação humana predatória que marcou o século XX provocou a crise ecológica cujos reflexos são sentidos atualmente. Vive-se uma época de incertezas, tendo em vista os riscos que podem ser desencadeados do desenvolvimento tecnológico desenfreado em suas mais diversas vertentes, dentre as quais, o risco ecológico consistente numa das espécies mais relevantes. Nasce a necessidade de preocupação com o futuro. Esse é o desafio imposto ao Direito: observar e tomar decisões num presente, incerto e complexo, que exige o controle de riscos, através da análise de eventos futuros. Bello sugere: Ao invés de se tentar regular a sociedade numa abordagem retrospectiva, a atual conjuntura demonstra que é preciso fazê-lo de forma prospectiva; portanto, com análises prognósticas do cada vez mais incerto e imprevisível devir social. Num momento em que o direito, definitivamente, não acompanha o ritmo de mudanças aceleradas da sociedade e não disciplina adequadamente os seus desdobramentos, impõe-se a necessidade da sua 4 re-adequação. A sociedade contemporânea, embrionária das tradições hebraicas e gregas, onde se tinha o homem como o centro do universo, ser dominador e detentor do poder absoluto sobre a Terra, enfrenta uma proliferação de ameaças imprevisíveis e invisíveis ao ambiente, e riscos ecológicos comprometem o bem-estar humano. Essa sociedade é caracterizada pela exposição a situações de incertezas e imprevisões decorrentes dos mais diversos fatores, dentre os quais a interferência humana sobre o ambiente. Por conta desse processo, exige-se uma avaliação constante de suas consequências, bem como do desenvolvimento de ações e mecanismos voltados à preservação ambiental sob pena de comprometer a vida e, conforme Giorgi, “Na sociedade contemporânea, existem condições estruturais que 4 BELLO. Op. cit., [S.n.]. 21 permitem ver que o futuro depende cada vez mais das decisões tomadas no 5 presente”. Vive-se em um momento de ruptura semelhante àquela que a modernização acarretou às práticas feudais, época em que não se falava sobre preservação do ambiente e, muito menos, sobre os possíveis riscos que a destruição do mesmo poderia causar. O surgimento da Era Industrial assumiu contornos transformadores e exigiu mudanças radicais nas searas política, econômica e no próprio comportamento humano, na medida em que a produção de riquezas foi acompanhada de uma produção social de riscos da instabilidade. Essa transmutação foi decorrente do nascimento de uma sociedade dita de risco, ideia 6 desenvolvida por Beck, a qual foi formada a partir da aliança entre capitalismo e desenvolvimento tecnológico. A dinâmica da sociedade atual descortina inúmeros riscos, uma vez que o uso descontrolado dos recursos naturais, do consumismo material e dos avanços tecnológicos desordenados geram degradação ambiental. Preponderam as incertezas científicas e os riscos desconhecidos em meio à complexidade social. Não se desconhece que os riscos sempre pertenceram à sociedade, mas os riscos atuais se diferenciam por serem caracterizados como globais, invisíveis, imperceptíveis, decorrentes do modelo de produção industrial que pode gerar danos irreversíveis. O modelo de desenvolvimento econômico tecnológico reflete-se em consequências negativas à própria sociedade, visto que produz externalidades danosas ao próprio ser humano. Questões que não eram objetos de preocupações no passado, hoje permeiam discussões acerca das novas funções do próprio Estado, v. g., a gestão dos riscos. O desenvolvimento da ciência não se preocupou com o controle dos riscos geradores de consequências desconhecidas sobre o meio ambiente, que, quando percebidas, tendem a ser irreversíveis. Destaca-se a importância do desenvolvimento econômico como um todo, sem ele haveria estagnação da própria humanidade, todavia, a crítica à dinâmica da 5 GIORGI, Raffaele de. O Risco na Sociedade Contemporânea. Revista de Direito Sanitário, São Paulo, v. 9, n. 1 p. 37-49, Mar./Jun. 2008. p.47. Disponível em: . Acesso em: 21 maio 2012. 6 BECK, Ulrich. La sociedad del riesgo. Jorge Navarro; Daniel Jiménez; Maria Rosa Borrás (Trad.). Madrid: Paidós, 1998. 22 sociedade se dirige especificamente ao desenvolvimento econômico não sustentável, despreocupada com as questões ambientais. A crise ecológica se enquadra com o que Beck denomina sociedade de 7 risco . Alguns desses riscos podem ser controlados através de mecanismos tecnológicos, outros, porém, não podem, porque afetam recursos naturais impossíveis de recomposições. Além disso, a crise ambiental, conforme explica 8 Leite, é “proveniente de uma sociedade de risco, deflagrada, principalmente, a partir da constatação de que as condições tecnológicas, industriais e formas de organização e gestões econômicas da sociedade estão em conflito com a qualidade de vida”. A definição de sociedade de risco está umbilicalmente associada à de globalização: os riscos são democráticos, afetando nações inteiras sem respeitar qualquer forma de fronteira. Beck conceitua tal fenômeno como: “Uma fase do desenvolvimento da sociedade moderna onde os riscos sociais, políticos, ecológicos e individuais criados pela ocasião do momento de inovação tecnológica, escapam 9 das instituições de controle e proteção da sociedade industrial”. O citado autor esclarece que a reprodução de ameaças de diversas espécies sempre esteve presente nos muitos contextos de organização social, todavia, o risco é um conceito de origem eminentemente atual, resultado do processo civilizatório do desenvolvimento econômico. Defende a ideia de que o risco deve traduzir a pretensão de se tornar previsíveis e controláveis as consequências imprevisíveis das decisões, na tentativa de submeter ao controle o incontrolável e prevenir o imprevisível e, principalmente, sujeitar os efeitos reflexos de tais decisões a programas de políticas institucionais capazes de gerar segurança em contextos de 10 imprevisibilidade. Uma das funções dos sistemas sociais é a de reduzir sua complexidade e controlar a contingência, viabilizando uma ação direcionada e com sentido de ação integral. É a própria sociedade que estabelece os limites máximo e mínimo do risco capaz de suportar. 7 Idem, ibidem, p. 26. 8 LEITE, José Rubens Morato. Estado de direito do ambiente: uma difícil tarefa. In: ______. Inovações em Direito Ambiental. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2000, p.13. 9 BECK. Op. cit., 1998, p. 32. 10 BECK, Ulrich. Liberdade ou capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. Luiz Antonio Oliveira de Araújo (Trad.). São Paulo: UNESP, 2003, p.115. 23 Luhmann afirma que o risco é uma forma média entre o provável e o improvável, caracterizado como um risco aceitável. Em sua concepção, a sociedade é composta por sistemas autônomos que interagem na medida de interesses incorporados por meio da comunicação e informação, estando tais sistemas inseridos no meio ambiente e que, por sua vez, é parte do conjunto em que os sistemas atuam. Assim, a concretização de um dano ao meio afeta todos os sistemas, uma interação sistemática do efeito danoso, com reflexos em todos os demais sistemas enquanto ausente mecanismo que identifique o sujeito do dever de 11 seu ônus. Nesse contexto, é inevitável a conclusão de que vivemos numa sociedade global do risco, no sentido de que as ações humanas geram consequências imprevisíveis, exigindo mais do que um discurso: deve existir uma efetiva gestão do risco, controlando-se os efeitos colaterais e os perigos produzidos pelas decisões na meta de conduzir os riscos imprevisíveis para riscos calculáveis. Giorgi aduz que a certeza da duração do tempo que falta à humanidade não depende mais da vontade de Deus, mas da capacidade que a sociedade contemporânea dispõe para controlar o potencial de autodestruição que ela mesma produz e arremata: Essa sociedade dispõe de potencial porque esses requisitos estruturais da produção e do controle da complexidade tornaram-se operativos. Essa sociedade, por exemplo, tem um alto potencial para a democracia. Mas, também para a autodestruição. Até agora tem prevalecido a tendência em 12 relação ao segundo mais do que à realização explosiva do primeiro. Os recursos naturais são esgotáveis e a intervenção irrestrita do ser humano tem demonstrado que o homem já ultrapassou os limites do suportável, deflagrando o maior de todos os riscos: o da extinção da própria vida. A administração dos riscos deve ser enfrentada com urgência, embora exista dificuldade de seu diagnóstico e prevenção dos efeitos indesejados. O surgimento de uma preocupação ecológica e seus reflexos no Direito constituem a resposta social à proliferação dos riscos e danos ambientais autoproduzidos por nossa Sociedade. Ao Estado incumbe a complexa tarefa de criar um sistema de gestão de 11 LUHMANN, Niklas. Sociologia del risgo. Guadalaraja: Universidade Ibero-americana, 1991, passim. 12 GIORGI. Op. cit., [S.n.]. 24 riscos ambientais dentro de limites imprescindíveis à efetivação desta proteção, pois muitas dificuldades serão encontradas, considerando a previsão dos riscos ambientais e a dificuldade no reparo dos danos. A ideia de precaução, apontada por de Morato e Ayala como mecanismo de controle dos riscos parece consistente: Um paradigma do desenvolvimento duradouro fundado em equidade intergeracional e uma visão menos antropocentrista radical parecem melhor condizentes para a construção do Estado de Direito do Ambiente, posto que é proveniente de um diagnóstico das políticas anteriores e ineficazes. Não se deve esquecer, contudo, que, mesmo neste novo modelo, o paradoxo existe, pois os Estados são, ao mesmo tempo, forçados a garantir, de um 13 lado, a produção, a tecnologia de ponta e, de outro, o equilíbrio ecológico. Mecanismos voltados à precaução constituem-se como uma ferramenta 14 fundamental à tutela ambiental, podendo-se afirmar que o princípio da precaução (princípio diagnosticador de riscos) é considerado princípio mestre do direito ambiental ao alcance do Estado Constitucional Socioambiental. Considerando-se a sociedade de risco, a deterioração dos recursos naturais é uma constante ameaça ao bem-estar coletivo. Segundo Leite, o princípio da prevenção também se aproxima do ideal em relação aos cuidados com o meio ambiente, pois retrata a ação acautelatória em relação aos riscos e danos ao meio ambiente, já que, no seu entender, “ambos os princípios atuam na gestão antecipatória, inibitória e cautelar dos riscos, sendo ambos similares no gênero. Contudo, a atuação preventiva é mais ampla e genérica: já a precaução, mais específica e conecta com o momento inicial do exame do 15 risco”. A ação preventiva é mais importante que a reparatória, pois tem como fundamento a educação, a consciência e a noção de irreversibilidade dos danos 13 LEITE, José Rubens Morato e AYALA, Patryck de Araújo. Direito ambiental na sociedade de risco. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2002, p. 24. 14 Princípio 15 da Declaração do Rio de Janeiro: De modo a proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deve ser amplamente observado pelos Estados, de acordo com suas capacidades. Quando houver ameaça de danos sérios ou irreversíveis, a ausência de absoluta certeza científica não deve ser utilizada como razão para postergar medidas eficazes e economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental. Sobre princípio da precaução ver SCOVAZZI, Túlio. Sul principio precauzionale nell Diritto Internazionale dell’Ambiente, Apud MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 10. ed. rev. atual. amp. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 56, afirma que o princípio da precaução não possui como finalidade a proteção do meio ambiente, mas procura indicar soluções a serem tomadas em casos onde os efeitos de uma atividade não sejam conhecidos. 15 LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de risco e Estado. In: CANOTILHO, José Joaquim G.; LEITE, José Rubens Morato. Direito Constitucional Ambiental. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 172. 25 ambientais. O princípio da prevenção é o que mais se aproxima do ideal em relação aos cuidados com o meio ambiente, pois, junto com o princípio que retrata a ação acautelatória em relação aos riscos e danos ao meio ambiente, no entender de Leite, “[...] ambos os princípios atuam na gestão antecipatória, inibitória e cautelar dos riscos, sendo ambos similares no gênero. Contudo, a atuação preventiva é mais ampla e genérica: já a precaução, mais específica e conecta com o momento inicial 16 do exame do risco. É com fundamento no ato de evitar a efetivação do dano que o princípio da prevenção integra uma gama de princípios voltados ao Direito Ambiental, representando, talvez, o traço mais forte da inconveniência e do descaso do ser humano em relação ao que se refere ao ambiente e à natureza. A ação preventiva, indubitavelmente, é mais importante que a reparatória ou repressiva, porque a primeira tem como fundamento a educação, a consciência e a noção de irreversibilidade dos danos ambientais; a segunda, por permanecer apenas no campo econômico, é efêmera e não desperta qualquer comprometimento com a natureza. O meio ambiente, como um bem jurídico que exige efetiva proteção, deve estar associado à noção de proteção antecipada a eventuais danos, já que é caracterizado como um bem insubstituível e condição sine qua non aos demais direitos fundamentais. Somente através de um cuidado prévio dos recursos naturais e de um estudo sobre os possíveis riscos é que as chances de segurança de um perigo poderão ser garantidas. Na dogmática jurídica, na aplicação do princípio da precaução, visualiza-se uma substancial mudança, pois através dele é possível prever os atos em virtude da ação ou atividade a considerar-se de risco. O princípio da precaução advém, portanto, do progresso tecnológico e das incertezas científicas quanto aos riscos e 17 danos dele advindos, sendo “fruto da urgência e da prudência”. Segundo Machado, “o princípio da precaução não significa a prostração diante do medo, não elimina a audácia saudável, mas se materializa na busca da 16 Idem, ibidem, p. 172. 17 RIOS, Aurélio Virgilio Veiga. O princípio da precaução e a sua aplicação na justiça brasileira: estudo de casos. In: VARELLA, Marcelo Dias e PLATIAU, Ana Flavia Barros (org.). Princípio da Precaução. Belo Horizonte: Del Rey, 2004, p. 374. 26 18 segurança do meio ambiente e da continuidade de vida”. Esta materialização é prevista ao se aplicarem as exigências constitucionais de preservar os processos ecológicos essenciais. Já para Derani, o princípio da precaução vai além de orientar os objetivos de uma política de proteção ambiental, também integra o planejamento de uma política econômica, visando o desenvolvimento sustentável. Precaução 19 ambiental é a modificação do modo de desenvolvimento da atividade econômica. Nesse início do século, muitos eventos locais podem provocar repercussão global. Muitos perigos se tornaram mundiais: a crise de cada nação, de cada classe e de cada indivíduo é causa e consequência da situação de toda a humanidade. A primordial conclusão é de que deve existir a preocupação pelo todo mormente sob o olhar da proteção do meio ambiente, assim, a questão ambiental não deve se restringir a sistemas jurídicos isolados, estatais ou não, mas deve ter como base sistemas jurídico-políticos, internacionais e supranacionais, observando sempre o alcance da proteção em caráter planetário. Balizando-se por essas perspectivas, é fundamental para todos um redefinir da concepção da sociedade e dos conceitos sociológicos frente ao risco mundial. A ideia é se buscar o contorno de um novo saber para uma nova estrutura governamental, estabelecendo-se uma nova relação entre a sociedade e o meio ambiente. A busca pela qualidade de vida está levando a sociedade a olhar mais atentamente às questões ambientais, formando uma sensibilidade ecológica e um senso de responsabilidade que coloca o ambiente tanto no plano de preocupações sociais, como em agendas governamentais. Esta atenção, dirigida aos riscos da globalização, fomentou a preocupação com a sustentabilidade social, econômica e ambiental, aparecendo como discurso uníssono quando, em 1972, a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio 20 Humano atentou à necessidade do estabelecimento de um critério e de princípios comuns, oferecendo aos povos do mundo inspiração e guia para preservar e melhorar o ambiente humano a partir de diretrizes a serem seguidas. 18 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 65. 19 DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico, 2. ed. São Paulo: Max Limonad, 2008, p. 170. 20 A Conferência de Estocolmo sobre Meio Ambiente Humano reconhece a necessidade de salvaguardar os recursos naturais através de planejamento cauteloso e gerenciamento, como se visualiza em seu princípio 2º: Os recursos naturais da Terra, incluídos o ar, a água, o solo, a flora e a fauna e, especialmente, parcelas representativas dos ecossistemas naturais, devem ser preservados em benefício das gerações atuais e futuras, mediante um cuidadoso planejamento ou administração adequados. 27 Outras convenções e declarações sobre a consagração da proteção ambiental brotaram após a mencionada Declaração de Estocolmo, tais como a Declaração do Rio de Janeiro sobre o Meio Ambiente (1992), a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (1992), a Convenção sobre Diversidade Biológica (1992), a Declaração e Programa de Ação de Viena (1993) e, mais recentemente, Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (2012), todas elas trouxeram à tona novos valores consagradores de um direito ao meio ambiente equilibrado, compatível com a dignidade humana. Esse evoluir social obriga o Estado a uma adaptação constante: as diretrizes de outrora não servem mais para o presente e estas não serão aproveitadas para o futuro, e, assim, caminha o Direito, que a partir de agora segue o rumo à proteção máxima de algo que nunca deveria ter se descuidado: seu meio ambiente. Por tudo isso, o Direito Ambiental nasce como remédio jurídico no combate dos efeitos colaterais da Sociedade Industrial, caracterizada por ameaças de dimensão global e de capacidade destrutiva sem precedentes históricos. Nesse contexto, a contitucionalismo, a reboque de um movimento mundial impulsionado por organizações internacionais, reconhece a relevância do tema e insere na Lei Fundamental título próprio para tutelar o meio ambiente, nascendo assim, o Estado Socioambiental de Direito. 28 1.2 A Constitucionalização da Proteção Ambiental no Estado Socioambiental de Direito O texto constitucional brasileiro vigente (CF/88) contempla a proteção ambiental em harmonia com as mais recentes diretrizes de proteção ambiental, reconhecendo o direito ao meio natural equilibrado como um direito fundamental. Essa constitucionalização da proteção ambiental, conforme Benjamin, 21 acontece em “pleno período de formação do próprio Direito Ambiental”, trazendo na redação do artigo 225, o princípio fundamental do direito a um “ambiente ecologicamente equilibrado”, evidenciando que o ambiente é um “bem de uso comum” e “essencial à sadia qualidade de vida” e, ainda, o princípio da solidariedade na proteção quando diz que cabe ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo. Reconhece, por fim, a questão intertemporal para garantir um mínimo essencial ecológico às futuras gerações O Estado ao constitucionalizar a proteção ambiental, acaba por oferecer subsídios legais à adequação, tanto à administração pública no desenvolvimento das funções estatais, como para toda a sociedade. E vai além: exige que mecanismos específicos sejam desenvolvidos, como normas ou ações administrativas, para a efetivação da proteção dos bens ambientais. Diante disso, o Estado adquire uma nova postura vinculativo-administrativa e também social, impondo limites e deveres às três funções: legislativa, executiva e judiciária. Observa-se que a proteção ambiental aparece no cenário constitucional com novas diretrizes a serem incorporadas em todas as ações de um Estado Socioambiental de Direito. A Constituição Federal de 1988 nasceu em um momento histórico em que se exigia a criação de um novo modelo de organização social: Estado Socioambiental e Democrático de Direito. Essa nova forma de Estado diz respeito a um viés ampliado dos direitos sociais, determinando ações compartilhadas entre Estado e cidadãos 22 em busca da preservação ecológica, com meios precaucionais e preventivos. Esse novo ideal está ligado à justiça intergeracional, passando a natureza a ser protagonista das discussões, o elemento definidor de um novo paradigma para a 21 BENJAMIN, Antônio Herman. Direito Constitucional Ambiental brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2007, pp. 65-66. 22 LEITE. Op. cit., p. 30. 29 sociedade e para a democracia, gerando uma nova relação entre o homem e a 23 24 natureza, denominado por Capra, de “ecologia profunda”, ideia reconhecedora do valor intrínseco de todos os seres vivos de forma não hierarquizada como um fio particular na teia da vida. Nessa nova perspectiva, a clássica teoria do Estado, que considera como elementos constitutivos: povo, poder e território restou defasada, pois o meio 25 ambiente não é mais mero coadjuvante na estrutura estatal. Kloepfer afirma que o Estado necessita de um meio ambiente no seu território que não ponha em risco a continuidade de sua existência. Com esse comprometimento por parte dos Estados à causa ambiental, 26 27 governo e sociedade de muitos países como Portugal (1976) , Espanha (1978) , 23 CAPRA, Fritjof. A teia da vida. Trad. de Newton Roberval Eichemberg. São Paulo: Cultrix, 1996, passim. 24 Segundo Ost, a “Deep Ecology” proclama não ser a terra pertencente ao homem, mas o homem pertence à terra, ou seja, não representa nada mais do que um retorno à natureza, como forma de reativar o desejo de retorno às origens. Assim, o homem, angustiado com a sociedade moderna poluidora, retoma o discurso da regressão ao seio da própria natureza. Desenvolve-se uma consciência entre os seres vivos assim como entre eles e os elementos da terra e, por meio desse entendimento, o homem é deslocado do eixo central terrestre e recolocado na linha de evolução natural, sem qualquer privilégio a ser concedido. Há um deslocamento das leis do homem para as leis da natureza, alargando o círculo de proteção, tornando ilimitado o reino natural. Condena, dessa forma, o homem à imanência absoluta da ecosfera, recusando-lhe qualquer outra possibilidade que não a evolução natural. Neste contexto, o universalismo substitui o individualismo. OST, François. A natureza à margem da lei. Lisboa: Instituto Piaget, 1995, pp. 15-16. 25 KLOEPFER, Michael. A caminho do Estado Ambiental? A transformação da República Federal e econômico da República Federal da Alemanha através da proteção ambiental especialmente desde a perspectiva da ciência jurídica. In: ______. Estado Socioambiental e Direitos Fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010, p.41. 26 Artigo 66.º da Constituição da República Portuguesa que trata sobre Ambiente e qualidade de vida possui o seguinte teor: 1. Todos têm direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de o defender. 2. Para assegurar o direito ao ambiente, no quadro de um desenvolvimento sustentável, incumbe ao Estado, por meio de organismos próprios e com o envolvimento e a participação dos cidadãos: a) Prevenir e controlar a poluição e os seus efeitos e as formas prejudiciais de erosão; b) Ordenar e promover o ordenamento do território, tendo em vista uma correcta localização das actividades, um equilibrado desenvolvimento sócio-económico e a valorização da paisagem; c) Criar e desenvolver reservas e parques naturais e de recreio, bem como classificar e proteger paisagens e Sítios, de modo a garantir a conservação da natureza e a preservação de valores culturais de interesse histórico ou artístico; d) Promover o aproveitamento racional dos recursos naturais, salvaguardando a sua capacidade de renovação e a estabilidade ecológica, com respeito pelo princípio da solidariedade entre gerações; e) Promover, em colaboração com as autarquias locais, a qualidade ambiental das povoações e da vida urbana, designadamente no plano arquitectónico e da protecção das zonas históricas; f) Promover a integração de objectivos ambientais nas várias políticas de âmbito sectorial; g) Promover a educação ambiental e o respeito pelos valores do ambiente; h) Assegurar que a política fiscal compatibilize desenvolvimento com protecção do ambiente e qualidade de vida. 27 A Constituição da Espanha traz os seguintes dispositivos específicos sobre o meio ambiente: 30 28 Equador (2008) seguiram esta linha de proteção normativa de um Estado Socioambiental, além do Brasil (1988), passando a incluir em suas constituições a tarefa de promoção dos direitos sociais com enfoque aos direitos fundamentais, voltados ao ambiente. A qualidade ambiental passou a ser reconhecida como essencial, como âmago ao princípio da dignidade da pessoa humana, como imprescindível a uma vida com qualidade e fundamental ao desenvolvimento do 29 potencial humano, para o bem-estar existencial. As mudanças na sociedade, no evoluir dos séculos, obrigou o Estado a se 30 transformar para acompanhar a atual quebra de paradigma, indicador da sobreposição de valores. A sustentabilidade, princípio indutor desse novo direito, pauta pela preservação da vida no planeta com o escopo de influenciar positivamente os destinos da humanidade. Artículo 45. 1. Todos tienen el derecho a disfrutar de un medio ambiente adecuado para el desarrollo de la persona, así como el deber de conservarlo. 2. Los poderes públicos velarán por la utilización racional de todos los recursos naturales, con el fin de proteger y mejorar la calidad de la vida y defender y restaurar el medio ambiente, apoyándose en la indispensable solidaridad colectiva. 3. Para quienes violen lo dispuesto en el apartado anterior, en los términos que la ley fije se establecerán sanciones penales o, en su caso, administrativas, así como la obligación de reparar el daño causado. 28 A Constituição do Equador trata do direito ambiental nos seguintes termos: Art. 71.- La naturaleza o Pacha Mama, donde se reproduce y realiza la vida, tiene derecho a que se respete integralmente su existencia y el mantenimiento y regeneración de sus ciclos vitales, estructura, funciones y procesos evolutivos. Toda persona, comunidad, pueblo o nacionalidad podrá exigir a la autoridad pública el cumplimiento de los derechos de la naturaleza. Para aplicar e interpretar estos derechos se observaran los principios establecidos en la Constitución, en lo que proceda. El Estado incentivará a las personas naturales y jurídicas, y a los colectivos, para que protejan la naturaleza, y promoverá el respeto a todos los elementos que forman un ecosistema. Art. 72.- La naturaleza tiene derecho a la restauración. Esta restauración será independiente de la obligación que tienen el Estado y las personas naturales o jurídicas de Indemnizar a los individuos y colectivos que dependan de los sistemas naturales afectados. En los casos de impacto ambiental grave o permanente, incluidos los ocasionados por la explotación de los recursos naturales no renovables, el Estado establecerá los mecanismos más eficaces para alcanzar la restauración, y adoptará las medidas adecuadas para eliminar o mitigar las consecuencias ambientales nocivas. Art. 73.- EI Estado aplicará medidas de precaución y restricción para las actividades que puedan conducir a la extinción de especies, la destrucción de ecosistemas o la alteración permanente de los ciclos naturales. Se prohíbe la introducción de organismos y material orgánico e inorgánico que puedan alterar de manera definitiva el patrimonio genético nacional. Art. 74.- Las personas, comunidades, pueblos y nacionalidades tendrán derecho a beneficiarse del ambiente y de las riquezas naturales que les permitan el buen vivir. Los servicios ambientales no serán susceptibles de apropiación; su producción, prestación, uso y aprovechamiento serán regulados por el Estado. 29 SARLET, Ingo Wolfgang e FENSTERSEIFER, Tiago. Estado socioambiental e mínimo existência (ecológico?): algumas aproximações. In: ______. Estado Socioambiental e Direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010, pp. 11-38. 30 Especificamente no campo da ciência jurídica, com o direito como seu objeto, por paradigma deve- se entender o critério de racionalidade epistemológica reflexiva que predomina, informa, orienta e direciona a resolução dos problemas, desafios, conflitos e o próprio funcionamento da sociedade. Trata-se de um referente a ser seguido e que ilumina a produção e aplicação do direito. 31 Esse processo é decorrente das reivindicações dos cidadãos e de movimentos políticos, garantindo-se os direitos civis aos atuais direitos ambientais. Estes são tão relevantes na contemporaneidade que o Estado Constitucional é denominado não apenas Democrático ou Social, mas Ambiental na medida em que almeja garantir como um direito fundamental o meio ambiente saudável e comprometido com a proteção e promoção da dignidade humana. Isso, a partir de uma compreensão multidimensional e não reducionista haja vista ter a dignidade uma referência cultural relativa e cambiante ajustada aos valores presentes no 31 contexto cultural. No que tange a essa dimensão ecológica da dignidade humana, faz-se relevante destacar que a Carta Constitucional brasileira vigente consagra, no seu art. 1º, inciso III, a dignidade da pessoa humana como o princípio fundamental. Dessa forma, não há como se olvidar do reconhecimento de que uma vida digna e saudável depende diretamente da preservação dos recursos naturais. Nessa linha de pensamento, defende-se a necessidade de tutelar a dignidade inerente a outras formas de vida, rechaçando-se o paradigma ético antropocêntrico de matriz kantiana. Nesse diapasão, Tiago Fensterseifer alerta que: O conteúdo conceitual e normativo do princípio da dignidade da pessoa humana está intrinsecamente relacionado à qualidade do ambiente (onde o ser humano vive, mora, trabalha, estuda, pratica lazer, bem como o que ele come, veste, etc.). A vida e a saúde humanas (ou como refere o caput do artigo 225 da Constituição Federal, conjugando tais valores, a sadia qualidade de vida) só são possíveis, dentro dos padrões mínimos exigidos constitucionalmente para o desenvolvimento pleno da existência humana, num ambiente natural onde haja qualidade ambiental da água que se bebe, dos alimentos que se comem, do solo onde se planta, do ar que se respira, da paisagem que se vê, do patrimônio histórico e cultural que se contempla, 32 do som que se escuta, entre outras manifestações da dimensão ambiental. Vários dispositivos legais, de alta relevância à tutela ecológica, foram inseridos no sistema jurídico brasileiro, servindo de sustentáculo do Estado Socioambiental de Direito. Clara está a existência de suporte jurídico suficiente para o desenvolvimento de um Estado, teoricamente, capaz de dar suporte às exigências 31 HABERLE, Peter. A dignidade humana como fundamento da comunidade estatal. Trad. Ingo Wolfgang Sarlet e Pedro Scherer de Mello. In: SARLET, Ingo Wolfgang (org.). Dimensões da dignidade: ensaios de filosofia do direito e direito constitucional. 2 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009, p. 127. 32 FENSTERSEIFER, Tiago. Direitos fundamentais e Proteção do Ambiente: a dimensão ecológica da dignidade humana. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008, p. 61. 32 de um meio ambiente saudável com crescimento econômico sem impor restrições demasiadas às liberdades individuais. Eis, então, o nascimento do Estado 33 Socioambiental de Direito brasileiro. Segundo Canotilho, esse novo padrão de Estado contemporâneo apresenta a integração da juridicidade, democracia, sociabilidade e sustentabilidade ambiental de modo a obrigar a adoção de políticas públicas, responsabilizando-se perante as gerações futuras. A nova dimensão do direito fundamental erigiu a proteção ambiental a essa 34 categoria, inobstante não esteja no catálogo contido no art. 5° da Constituição Federal de 1988, pois nos preleciona Alexy que da norma constitucional retiramos princípios e regras e delas os valores jurídicos sacramentados em nosso ordenamento. Assim, a Constituição admite outros direitos fundamentais constantes 35 36 das leis, aliás, este é o sentido dado pelo parágrafo 2° do referido artigo . O constitucionalismo socioambiental, portanto, um modelo adiante do constitucionalismo social, deflagrado nas últimas décadas e, influenciado pelo ordenamento internacional, preocupa-se com a formação de uma cultura ambientalista no espaço político-jurídico contemporâneo, promovendo o ambiente equilibrado a um direito humano fundamental haja vista a imprescindibilidade do bem-estar existencial. Nessa mesma perspectiva, cumpre ao Estado Socioambiental, como fim e tarefa, o desenvolvimento e a sustentabilidade em todas as suas dimensões a partir dos pilares econômico, social, cultural e ambiental. Para a efetivação desse novo modelo de Estado faz-se necessário analisar 37 as suas dimensões. A partir dos estudos de Canotilho, percebe-se que ele pretende, justamente, formular um Estado Constitucional preocupado com um 33 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Estado de Direito. Cadernos Democráticos, n. 7. Fundação Mário Soares. Lisboa: Gradiva, 1998, p. 23. 34 Há discussão doutrinária a respeito da problemática de ser o meio ambiente fim e tarefa do Estado ou como direito subjetivo fundamental. A discussão cunha-se no plano filosófico-metódico das pré- compreensões desse Estado que se busca, adquirindo centralidade retórica e discursiva nas visões antropocêntricas, ecocêntricas ou economicocêntricas do meio ambiente. 35 ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Virgílio Afonso da Silva (Trad.). São Paulo: Malheiros, 2008, p. 82. 36 0 Art. 5 , § 2º da CF/88: Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. 37 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. 3.ed. Coimbra: Almedina, 1999. ______. Estado constitucional ecológico e democracia sustentada. In: SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). Direitos fundamentais sociais: estudos de direito constitucional, internacional e comparado. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. 33 Estado de Direito democrático e social, além de um Estado regido por princípios ecológicos o que implica em formas novas de participação política. Para tanto, o Estado deve articular-se com uma administração integrada, assim, a proteção ambiental passa a ser sistemática e global, de incumbência não só dos agentes públicos, antes disso, exige novas formas de comunicação e de participação cidadã. Na linha do novo pensamento jurídico, tanto o Estado como os indivíduos estão atrelados a esse contrato político-jurídico ecológico, onde, necessariamente, o homem deve abandonar sua condição de predador do mundo natural para adotar postura ecocêntrica. É tarefa do Estado a proteção e preservação, assim como, um direito/dever do indivíduo a garantia a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, como consequência deste direito ter alçado a status de um direito fundamental frente à galopante degradação. Assim, o texto constitucional consagra o princípio da cooperação, também na seara ambiental, ao prescrever atuação conjunta na escolha de prioridades e nos processos decisórios de política ambiental, bem como, o equilíbrio entre a liberdade individual e necessidade social. Pode-se afirmar que tal princípio resulta de uma divisão de funções dentro da ordem econômica na adequação entre os interesses mais significativos e a orientação do desenvolvimento político. Há, portanto, o reconhecimento, pela ordem constitucional, da dupla funcionalidade da proteção ambiental no ordenamento jurídico brasileiro, que assume tanto a forma de um objetivo e tarefa do Estado quanto de um direito (e dever) fundamental do indivíduo e da coletividade, implicando um 38 complexo de direitos e deveres fundamentais de cunho ecológico. A crise ambiental, desencadeada pela postura parasitária do homem, exige, agora, uma postura ativa para retroceder, estancar ou reduzir as consequências desastrosas de sua postura antropocêntrica. A titularidade ativa, para além de um dever fundamental de proteção ambiental restrito do Estado, também o é da coletividade, independente de sua capacidade política ou enquadramento político, 39 consubstanciada como titular, a humanidade. 38 SARLET, Ingo Wolfgang; FENSTERSEIFER, Tiago. Notas sobre os deveres de proteção do Estado e a garantia da proibição de retrocesso em matéria socioambiental. In: AUGUSTIN, Sérgio; STEINMETZ, Wilson (Orgs.). Direito constitucional do ambiente: teoria e aplicação. Caxias do Sul: Educs, 2011, p. 10. 39 MEDEIROS, Fernanda Luiza Fontoura de. Meio ambiente: direito e dever fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004, p. 141. 34 A sociedade é, para Rawls, uma associação de pessoas que reconhecem caráter vinculativo a um determinado conjunto de regras e atuam de acordo com elas. Essas normas existem para cimentar um sistema de cooperação entre todos, para benefício de todos, assim, numa sociedade, existe certa identidade de interesses, pois todos têm a ganhar com a cooperação: vive-se melhor em sociedade do que viveriam isolados. No entanto, também existem conflitos de interesses, pois os indivíduos não são indiferentes à maneira como são distribuídas as benesses, que resultam da sua colaboração, na medida em que todos preferem receber uma fração maior. Assim, o papel da justiça é mais profundo, exige-se um definir da atribuição de direitos e deveres e a de distribuir os encargos e os benefícios da cooperação social, que só 40 se desenvolve pela vinculação dos indivíduos à comunidade política. O grande desafio que se apresenta é o da efetiva participação cidadã nos instrumentos jurídico/políticos que os determinam. Ricoeur sugere que o sujeito de direitos deriva, necessariamente, do sujeito capaz. Para ele, ser capaz é ter o saber/poder de valorar suas próprias ações bem como as ações alheias de forma a distinguir o bom e o indispensável nelas. Nessa construção do si capaz, é fundamental a consideração da autoestima (vinculada a uma avaliação ética de boa- vida) e do autorrespeito (vinculado a uma moralidade universal) na construção “ética 41 e moral do si-mesmo”. Ao indagar quem é o sujeito do direito, nessa linha de raciocínio, acaba-se levando a discussão para o nível do reconhecimento ético, hábil em identificar o outro como pessoa digna de ser estimada e respeitada. Busca-se formar um sujeito capacitado a desenvolver o seu papel na sociedade como cidadão, como condição existencial indispensável para o aperfeiçoamento de seu intelecto e de sua vocação 42 para a política. O aporte Ricœuriano permite enxergar o sujeito de direito como apto a ser estimado e respeitado, e, consequentemente, capaz de constituir-se em agente ético na reflexão e construção da política e na formação de sociedades mais justas. 40 RAWLS, John. Uma teoria da Justiça. Almiro Pisetta; Lenita Maria Rímoli Esteves (Trads.). São Paulo: Martins Fontes, 2002, passim. 41 RICOUER, Paul. O justo. Trad. Ivone C. Benedetti (Trad.). São Paulo: Martins Fontes, 2008, passim. 42 Idem, ibidem, p. 24. 35 Posicionando-se no sentido de que sem a mediação institucional o indivíduo é um esboço de homem, entende ser primordial, para sua realização, o enquadramento a um corpo político, meio pelo qual seria possível existir uma verdadeira cidadania. Complementando essa linha de raciocínio “El concepto de ciudadanía está íntimamente ligado, por un lado, a la idea de derechos individuales y, por el otro, a la 43 noción de vínculo con una comunidad particular” exigindo um equilíbrio entre direitos e responsabilidades. Por isso, torna-se indispensável seu exercício para o sucesso das políticas ambientalistas, nas quais se exige cooperação voluntária dos cidadãos. O acesso do cidadão comum ao exercício político pode ser exercido através do voto, iniciativas populares para projetos de leis, ação popular, audiências públicas, etc., mas não se pode esquecer que suas limitações necessitam ser combatidas, mediante ações que aproximem sociedade e governo, no sentido de permitir novos acordos e novas formas de decisão, buscando ampliar a participação popular. É preciso superar a ausência de representatividade dos partidos políticos, os quais têm se mostrado especialistas no exercício de discurso demagógicos, divergentes, críticos ao establishment até a chegada ao poder, sendo que se mostram apáticos ao alcançá-lo, num jogo político afrontoso e infiel aos interesses 44 dos cidadãos, pondo em jogo o real sentido da democracia. É mister uma retomada da participação do cidadão para o exercício de seus direitos fundamentais, impondo, além de um discurso vazio, um comprometimento com ações vinculativas do Estado no cumprimento dos princípios constitucionais. Isto é, ainda, mais fundamental em sociedades fragmentadas e injustas com grandes contingentes de cidadãos excluídos como a sociedade brasileira. A efetivação da participação popular no exercício da cidadania possibilita gerar políticas com legitimidade e aceitação social na superação de conflitos, para além da mera fiscalização das ações do Estado. Essa consciência cidadã ativa, participante e crítica só pode ser formada por meio das informações sobre as questões públicas e 43 Tradução livre do autor: “O conceito de cidadania está intimamente ligado, por um lado, a ideia de direitos individuais e, por outro, a noção de vínculo com uma comunidade particular”. KYMLICKA, Will; NORMAN, Wayne. El retorno del ciudadano: una revisión de la producción reciente en teoría de la ciudadanía. Disponível em: . Acesso em: 20 de maio 2012. 44 AZEVEDO, Plauto Faraco. Ecocivilização. São Paulo: RT, 2008, p. 17. 36 da democratização das decisões: formação de uma verdadeira parceria entre Estado-sociedade. Para uma compreensão da dimensão do exercício da cidadania, cita-se as palavras Kymlicka e Wayne: Para la mayor parte de la teoría política de posguerra, los conceptos normativos fundamentales eran democracia (para evaluar los procedimientos de decisión) y justicia (para evaluar los resultados). Cuando se hablaba de la idea de ciudadanía, se la veía como derivada de las nociones de democracia y justicia; un ciudadano es alguien que tiene derechos democráticos y exigencias de justicia. Pero hoy toma fuerza a lo largo de todo el espectro político la idea de que el concepto de ciudadanía debe jugar un rol normativo independiente en toda teoría política plausible, y que la promoción de la ciudadanía responsable es 45 un objetivo de primera magnitud para las políticas públicas. (Grifo nosso). O exercício da cidadania é capaz de promover uma qualificação das pessoas sobre seus direitos e deveres ao meio ambiente saudável e para o qual a reflexão livre é o instrumento fundamental. O pleno exercício da cidadania ambiental, portanto, permite criar e consolidar, instrumentos democráticos para a gestão do ambiente ecologicamente equilibrado, considerado pela Lei Fundamental como um bem de todos, inapropriável por quem quer que seja. A participação política desperta os indivíduos para problemas além de seus interesses particulares, ao perceberem que os assuntos públicos devem ser objeto de sua atenção, v.g, as manifestações populares a cerca do Código Florestal. O exercício da cidadania ambiental deve conduzir e definir as políticas públicas que promovam a justiça social em harmonia com a natureza, para tanto, é indispensável a desconstrução de consciências adormecidas, onde os interesses econômicos tornam os custos ecológicos e sociais questões secundárias frente à ditadura global do mercado, do culto ao lucro. A proposta de garantia dos princípios ecológicos para a formação do Estado Socioambiental exige um compromisso, decorrente de um dever do Estado, mas, 45 Tradução livre do Autor: “Para a maior parte da teoria política pós-guerra, is conceitos normativos fundamentais eram democracia (para avaliar os procedimentos de decisão) e justiça (para avaliar os resultados). Quando se falava da ideia de cidadania, observava-se que ela derivava das noções de democracia e justiça; um cidadão e alguém que tem direitos democráticos e exigências de justiça. Mas hoje toma força ao longo de todo o segmento político a ideia de que o conceito de cidadania deve julgar um rol normativo independente em toda a teoria política plausível,e que a promoção de cidadania responsável é um objetivo de primeira magnitude às políticas públicas”. KYMLICKA; NORMAN. Op. cit. [S.n.]. 37 principalmente da sociedade, indispensável à efetivação da proteção aos recursos naturais e à dignidade de vida humana, tanto das presentes, quanto das futuras gerações. Esse processo gera um pacto socioambiental, balizado especialmente, pelo princípio da solidariedade. Parece inabalável o conceito de que a defesa do meio ambiente seja de responsabilidade comum e, mais do que isso, um dever de cooperação dos grupos e dos cidadãos. 38 1.3 Ineficiência das normas no trato da defesa do meio ambiente A conduta humana encontra-se submetida a um conjunto de normas jurídicas e sociais que visam regulamentar os fatos e atos da vida em sociedade, selecionando o Direito em determinadas categorias, qualificando-as como jurídicas e fazendo-as adentrar na estrutura normativa. Dessa forma, incorporando o espírito do socioambientalismo, preocupado com as consequências da atual sociedade de risco, o texto constitucional, norma do mais alto posto hierárquico dentre as normas, inseriu diversos dispositivos com o objetivo de conciliar o desenvolvimento econômico e a proteção ambiental. Por força desse novo imperativo global, o constituinte brasileiro, em sintonia com o interesse e a pressão das organizações internacionais, estabeleceu capítulo 46 próprio para tratar do tema (art. 225, dispositivo específico sobre o ambiente) além 46 Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. § 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético; III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade; V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente; VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente; VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade. § 2º - Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei. § 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. § 4º - A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato- Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais. § 5º - São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos Estados, por ações discriminatórias, necessárias à proteção dos ecossistemas naturais. § 6º - As usinas que operem com reator nuclear deverão ter sua localização definida em lei federal, sem o que não poderão ser instaladas. 39 47 de outros dispositivos dispersos portanto, hoje no Brasil, toda a base do Direito Ambiental se encontra cristalizada na Lei Maior: competências legislativas (artigo 22, IV, XII e XVI; artigo 24, VI, VII e VIII; artigo 30, I e II); competências administrativas (artigo 23, III, IV, VI, VII e XI); Ordem Econômica Ambiental (artigo 170, VI); meio ambiente artificial (artigo 182); meio ambiente cultural (artigos 215 e 216); dentre outras disposições esparsas não menos importantes, formando o denominado Direito Constitucional Ambiental. Trata-se de dispositivos de alta relevância à tutela ecológica, sustentáculo do Estado Socioambiental de Direito, elevando a proteção ambiental a um direito fundamental do indivíduo. Tais princípios orientam todas as manifestações das normas inferiores de tal modo que estas deverão estar subordinadas em sua forma, conteúdo e efeitos pela Norma Suprema, sob pena de invalidade. Todas as demais normas, para serem válidas, devem buscar fundamento em outra de nível superior, e assim por diante, de maneira que todas, cuja validade pode ser reconduzida a uma 48 mesma norma fundamental, formam uma ordem normativa. Considerando a supremacia da Constituição, a escolha do constituinte, em eleger o meio ambiente como objeto de proteção, deixa evidente que o Brasil possui suporte normativo para o desenvolvimento de um Estado capaz de equilibrar as exigências de um meio ambiente saudável, com crescimento econômico, sem impor restrições demasiadas às liberdades individuais. A respeito da supremacia da lei fundamental do Estado, Gordillo afirma ser ela “algo mais que um simples programa de governo ou expressão de desejos; é como seu nome indica, uma verdadeira lei: porém, ainda mais, é uma lei superior ao denominador comum das leis”, de modo que as leis não podem derrogá-la, 47 No tocante à legislação dirigida à tutela ambiental nacional, vale destacar que é apontada por inúmeros especialistas nacionais e estrangeiros como uma das mais modernas do mundo, inobstante a problemática a despeito de sua efetividade, haja vista déficit procedimental e organizacional dos órgãos incumbidos da proteção ambiental e dos meios disponíveis para bem de externarem suas atribuições. 48 Sistema significa nexo, uma reunião de coisas ou conjunto de elementos e método, um instrumento de análise. É o aparelho teórico mediante o qual se pode estudar a realidade. É, por vezes, o modo de ordenar, logicamente, a realidade, que, por sua vez, não é sistemática. Assim sendo, o direito não é um sistema jurídico, mas uma realidade que pode ser concebida de forma sistemática pela ciência do direito. É tarefa do jurista apresentar o direito sistematicamente, para facilitar seu conhecimento e manejo pelos que o aplicam. É evidente que a função do cientista do direito não é a mera transcrição de normas, fatos e valores, já que estes não se agrupam num todo ordenado, mas sim a descrição e a interpretação, que consistem, fundamentalmente, na determinação das consequências e efeitos produzidos por esses elementos do direito. DINIZ, Maria Helena. Norma Constitucional e seus efeitos. São Paulo: Saraiva, 1992, p.5. 40 tampouco violar seus ditames pois tudo o que o viole é inaplicável em decorrência de ser dentro do sistema normativo Estatal, a expressão suprema de juridicidade. Dessa forma, “tudo que a Constituição concebe com sua imperatividade suprema tem-se o direito de fazer, e tudo que a Constituição exige, tem-se o dever de 49 cumprir”. Eis, então, o Estado Socioambiental de Direito brasileiro, um Estado que redefiniu suas normas jurídicas no campo das suas relações políticas, sociais e econômicas, impondo diretrizes específicas para o bem-estar ambiental. As normas constitucionais apresentam como traço característico, assim como todas as demais normas do sistema jurídico, a sua imperatividade, sua obrigatoriedade de obediência aos seus comandos pelos particulares e, principalmente, pelos próprios órgãos do Poder Público, decorrentes do caráter vinculativo das normas jurídicas. Telles Júnior preleciona sobre a vinculação da imperatividade da norma aportando na sanção: [...] claro é que não podem considerar-se como lei e não podem ter caráter imperativo as disposições sem conteúdo obrigatório, porque nada ordenam, nada proíbem, mas só constituem declarações políticas, afirmações doutrinárias teóricas, recomendações, exortações, conselhos, aspirações idealísticas, promessas de lei, prevenções etc. Ou normas técnicas em matéria industrial ou comercial, regras de contabilidade, enfim, sugestões a que os particulares podem obedecer, ou não, sem incorrerem em sanção 50 alguma. Analisando a força coativa, na seara da normatividade constitucional, a sanção, muitas vezes, não tem caráter de castigo, pode consistir na apuração da responsabilidade política ou na imputação de obrigação de legislar. Não se admite uma Norma Fundamental desprovida de supremacia, de imperatividade ou coatividade, entretanto, é preciso ter claro que nem todas as normas inseridas no corpo constitucional são dotadas da mesma estrutura, densidade e função, vez que sua força vinculativa se processa em níveis distintos sem que com isso sua imperatividade seja ameaçada. A Constituição é lei fundamental dos direitos, liberdades e garantias e na descrição normativa poderá, vez ou outra, restringir a uma mensagem utópica no momento em que foi criada, mas que deverá ser parcialmente atendida, dentro das possibilidades do momento social em que é 49 GORDILLO, Agustin. Princípios gerais do Direito Público. São Paulo: RT, 1977, pp. 94-95. 50 TELLES JÚNIOR, Goffredo. Filosofia do direito. São Paulo: Max Limonad, 1967. T.2, p. 424. 41 vivida. A Norma Fundamental constitui um complexo de regras de Direito que está longe de representar um mero ideário ou simples aspirações. São comandos obrigatórios para os órgãos do Poder Público e aos cidadãos, exigindo comportamentos obrigatórios atento para o Estado como para os indivíduos, de tal sorte que quando dispõe da realização da preservação ambiental, está, imperativamente, determinando que o Estado brasileiro deve realizá-la. À Constituição, todos os poderes da República devem obediência. Ninguém escapa de seu império. Todo e qualquer ato em desconformidade com ela é um ato 51 nulo por ofender ao regramento de escalão máximo. Ressalva deve ser feita, considerando-se que a proteção ambiental esbarra num problema de insuficiência estrutural da fórmula do direito ao ambiente, traduzida pela impossibilidade de determinar o conteúdo de tal proteção, diante do caráter de indivisibilidade das utilidades dos bens naturais, ou seja, não há como cada indivíduo se apropriar de parcela exata de seu direito ao ambiente eis que se trata de direito difuso suscetível de fruição coletiva. Com efeito, esta característica de indeterminação do conteúdo do direito ao ambiente, não lhe confere autonomia e, as dificuldades de sua operacionalização refletem uma característica utópica, na medida em que o legislador constituinte exige comportamentos negativos e positivos, justamente daquele a quem incumbe o dever jurídico, correspondente a tal direito. Sobre esse ponto, Gomes esclarece sobre o despertar da consciência ecológica brasileira: À semelhança do poeta (Camões, agora), o legislador também se apresenta, por vezes, como um fingidor. No caso da configuração da vertente subjetiva da proteção ambiental, o fingimento resulta diretamente da adesão a uma fórmula intensamente simbólica e pedagogicamente interessante, importada de maneira acrítica do Direito Internacional, cuja operatividade real, todavia, é nula. O Direito ambiental, com a sua irrenunciável dimensão utópica’, concretiza a parcela de sonho que 52 qualquer Constituição alberga [...]. Mesmo diante dessa dificuldade de operatividade, o que se evidencia pela degradação recente dos recursos naturais, a norma ambiental constitucional está 51 MELLO, Celso Bandeira de. Eficácia das normas constitucionais sobre justiça social. Revista de Direito Público, n. 57-59, 1981, p. 237. 52 GOMES, Carla Amado. Direito Ambiental: o ambiente como objeto e os objetos do direito ao ambiente. Curitiba: Juruá, 2010, p. 43. 42 posta com sua característica de imperatividade, entretanto, questão primordial repousa na aplicabilidade das normas de proteção e preservação do ambiente. A Constituição, como um sistema de normas e princípios, regulador do fenômeno político, objetiva, como qualquer regra jurídica, a sua concretização no mundo dos fatos. Conforme já assinalado, as normas constitucionais têm imperativo. Sua efetivação ocorre quando seus comandos correspondem aos anseios populares, existindo um empenho dos governantes e da população em fazer cumprir e em concretizar seus dispositivos. A preocupação jurídica do ser humano com a qualidade de vida e a proteção do meio ambiente, como bem difuso, fez surgir a normatização do modo de apropriação dos recursos naturais pelo homem. Todavia, inobstante a farta regulamentação sobre a matéria a degradação se perpetua, permanecendo o desmatamento, a poluição do ar e das águas, ameaça à biodiversidade, entre outros. Nalini sugere que “[...] a proliferação normativa desativa a força intimidatória do ordenamento. Outras vezes, a sanção é irrisória e vale a pena suportá-la, pois a 53 relação custo/benefício estimula a vulneração da norma”. Percebe-se, então, a existência de estrutura legislativo vasta sobre a matéria, assim como, uma preocupação com o meio ambiente no contexto constitucional. Existe, então, proteção legislativa através da norma. Tal premissa leva ao raciocínio de que a imperatividade das normas repousa não em um 54 conhecimento ou reconhecimento, mas em um ato de crença. Por uma questão de justiça intergeracional, o Estado possui um compromisso com a máxima eficácia e efetividade do direito fundamental ao ambiente ecologicamente equilibrado. Para falar sobre a eficácia das normas, primeiro é necessário diferenciar eficácia de efetividade: Eficácia, derivado do latim efficacia, de efficax (que tem virtude, que tem propriedade, que chega ao fim), compreende-se como a força ou poder que possa ter um ato ou um fato, para produzir os desejados efeitos. Efetividade, derivado de efeitos, do latim effectivus, de efficere (executar, cumprir, satisfazer, acabar), indica a qualidade ou o caráter de tudo o que se mostra efetivo ou que está em atividade. Quer assim dizer o que está em vigência, está sendo cumprido ou está em atual exercício, ou seja, que está realizando os seus próprios efeitos. Opõe-se assim ao que está parado, ao 53 NALINI, José Renato. Ética Ambiental. 3. ed. Campinas: Millenium, 2010, p. 23. 54 FERRAZ JÚNIOR, Tercio Sampaio. Teoria da norma jurídica. Rio de Janeiro: Forense, 1978, pp.128-129. 43 55 que não tem efeito, ou não pode ser exercido ou executado. Enquanto a eficácia diz respeito à possibilidade de qualquer norma gerar efeitos, ou seja, o potencial da norma para produzir os efeitos que lhe são próprios; a efetividade aponta para a concretização dos efeitos jurídicos no mundo dos fatos, a realização, a materialização do Direito. A despeito da eficácia jurídica Sarlet discorre: [...] possibilidade (no sentido de aptidão) de a norma vigente (juridicamente existente) ser aplicada aos casos concretos e de – na medida de sua aplicabilidade – gerar efeitos jurídicos, ao passo que a eficácia social (ou efetividade) pode ser considerada como englobando tanto a decisão pela efetiva aplicação da norma (juridicamente eficaz), quanto o resultado 56 concreto decorrente – ou não – desta aplicação. Uma norma vigente pode não ser aplicada, tornando-se ineficaz quando não for respeitada ou cumprida pelos indivíduos, seja em decorrência do costume (entendimento que a prescrição normativa não é justa), seja porque não há uma sanção. Se o descumprimento da norma não implica sanção, isto pode ocorrer porque a norma é mal elaborada ou mal executada (na seara ambiental, por ausência de fiscalização estatal). Ambas as hipóteses ocorrem por ineficiência do Poder Público, seja do Legislativo, seja do Executivo. Sobre a ineficiência da norma, diante da conjunção de problemas ambientais e a mundialização da economia, Wolkmer assinala que: [...] arcabouço normativista da moderna teoria jurídica convencional é pouco eficaz e não consegue atender a extensão competitiva das atuais sociedades globalizadas “[...] que passam por distintas espécies de reprodução do capital, por acentuadas contradições sociais e por fluxos que refletem tanto crises de legitimidade quanto crises na efetivação da Justiça”. Os impasses e as insuficiências do atual paradigma da ciência jurídica tradicional entreabrem, lenta e constantemente, o horizonte para as mudanças e a construção de novos paradigmas, direcionados para uma 57 perspectiva pluralista, flexível e interdisciplinar. 58 Barroso, por seu turno, afirma que a efetividade consiste na realização, no 55 SOIBELMAN, Leib. Enciclopédia do advogado. 4. ed. Rio de Janeiro: Rio, 1983, p. 142. 56 SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 223. 57 WOLKMER, Antonio Carlos. Introdução ao pensamento jurídico crítico. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 01. 58 BARROSO, Luís Roberto. O Direito Constitucional e a efetividade de suas normas. 7. ed. Rio 44 plano do ser (realidade social), do que foi estabelecido no plano do dever-ser (normativo), e, em breve síntese, afirma que: “[...] a efetividade significa, portanto, a realização do Direito, o desempenho concreto de sua função social. Ela representa a materialização dos fatos, dos preceitos legais e simboliza a aproximação, tão íntima 59 quanto possível, entre o dever-ser normativo e o ser da realidade social”. Significa, portanto, a realização do Direito, uma realização concreta de sua 60 função social. Para Sarlet, a eficácia jurídica consistirá na aptidão de uma norma em vigor ser aplicada a casos concretos e, consequentemente, gerar efeitos jurídicos, sendo a efetividade o resultado concreto, decorrente da decisão e da efetiva aplicação da norma. Normalmente, a efetividade, ou seja, a observância das normas constitucionais resulta de cumprimento espontâneo, no caso dos princípios de proteção ambiental, a não submissão expressiva à disciplina constitucional, muitas vezes, decorre com o confronto dos interesses econômicos preponderantes. Nessa hipótese, ou a determinação cairá em desuso, ou sua efetivação dependerá de coação estatal, que deverá impor sua observação obrigatória. Certo é que certas normas constitucionais não podem produzir efeitos jurídicos imediatamente, por ausência de regulamentação ou, muitas vezes, pelo modo de disciplinar o comando. Pecam por ausência efetiva de imperatividade ao empregar expressões sem valor jurídico, comandos que não implicam em nada que se configure como direito ou obrigação relativa a uma prestação. Como consequência, tem-se disposições normativas caracterizadas como meras abstrações inócuas, não se destinando aos órgãos do Estado, tampouco outorgando direitos subjetivos ao cidadão. Neves vai além, ao discorrer sobre as causas de existência da legislação simbólica. Para ele “constitui apenas mais uma tentativa de apresentar o Estado como identificado com os valores ou fins por ela formalmente protegidos, sem 61 qualquer novo resultado quanto à concretização normativa”, que tem por escopo confirmar valores sociais, demonstrar a capacidade do Estado, fortificando a confiança nos cidadãos ou adiar a solução de conflitos sociais através de de Janeiro: Renovar, 2003, p. 85. 59 Idem, ibidem, p. 79. 60 SARLET. Op. cit., 2007, p. 270. 61 NEVES, Marcelo. Constitucionalização Simbólica. São Paulo: Martins Fontes, 2011, p. 33. 45 compromissos dilatórios. Esse tipo de estratégia não deixa apenas os problemas sem solução como também obstrui o caminho para que sejam resolvidos. As normas, então, pressupõem status formal e material que lhes proporcione substrato, assim, quando inseridas no contexto social, emerge a questão de sua 62 presteza, referindo-se, então, à sua aplicação ou execução. A eficácia da norma só poderá ser aferida uma vez executada, tal como prescreve Reale, ao afirmar que o direito autêntico: “Não é apenas declarado, mas reconhecido, é vivido pela sociedade, como algo que se incorpora e se integra na sua maneira de conduzir-se. A regra de direito deve, por conseguinte, ser formalmente válida e socialmente 63 eficaz”. A identidade do valor normativo com a vontade social é fundamental para a efetividade dos comandos constitucionais, caso haja uma dissociação entre o complexo valorativo disposto na Carta Magna e a vontade do povo, a Constituição perde sua legitimidade. Assim, o Estado não se constituirá em um ente democrático, na medida em que não refletirá a legítima vontade do Poder Constituinte que tem sua titularidade no povo de uma nação. Para que se complete a concretização de uma norma jurídica e ocorra a sua plena efetividade, deve haver empenho de governantes e da população em fazer valer os princípios da ordem normativa. Assim, para a Lei Fundamental ganhar realmente efetividade social, é primordial que a população conheça seu texto e reivindique os direitos postos, obrigando o poder público a atuar positiva e concretamente na consecução dos objetivos públicos constitucionalmente delimitados. É vital ressaltar que a efetividade das normas ditas programáticas, ou seja, a concretização fático-social dos direitos sociais, econômicos e dos princípios e objetivos constitucionais, não depende só do poder estatal, sendo indispensável empenho da sociedade, pois o que se discute é a construção de uma cidadania real para cada Estado. Esse trabalho não é elaborado tão somente pelo desenvolvimento eficaz de políticas públicas estatais, mas pela participação da sociedade com a colaboração e atuação concreta no nascimento do espírito de solidariedade e de cidadania. O constitucionalismo, atualmente, não cuida mais do Estado ou do indivíduo 62 GUERRA, Gustavo Rabay. Efetividade e pensamento crítico no Direito. Doutrina Brasil Jurídico, Goiânia, v. 1, n. 1, 2000, p. 12. 63 REALE, Miguel. Lições preliminares de Direito. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 113. 46 isoladamente, como na fase liberal, tampouco se preocupa com a sociedade como um todo, característico da fase social-democrática. O foco constitucional passa a se preocupar com o indivíduo inserido na sociedade, como um ser humano que deve ser tratado com dignidade. Tem sido este o mote principal dos Estados na evolução constitucional. O bem-estar social somente será alcançado com o esforço de toda a sociedade, por meio de um redimensionamento do papel do Estado e da compreensão dos limites entre o espaço público e o privado. A concretização ou a efetividade da norma constitucional é o grande problema que, aparentemente, aflige os estudiosos do Direito Constitucional, o que não impede afirmar que não existem normas constitucionais destituídas de eficácia, mesmo reconhecendo que elas diferem entre si em estrutura. Entretanto, o mais relevante a destacar, é que mesmo aquelas que necessitam de regulamentação e aquelas que determinam programa de ação estatal possuem um plano de eficácia. Diante do crescente alargamento dos direitos e garantias ditos fundamentais de caráter socioeconômicos para a melhora da vida dos cidadãos, fruto do constitucionalismo social, instalou-se uma crise pois que o Estado não confere um 64 tom de efetividade normativa ou social. Considerando o princípio da legalidade que rege o sistema democrático do Estado de Direito, talvez a principal razão para a ineficiência das normas seja a incapacidade estatal em cumprir com todas as suas metas, outrora parcialmente executadas. Essa impotência é decorrente da complexidade dos problemas sociais da atualidade, mormente os riscos e incertezas ambientais gerados pela sociedade de risco contemporânea, com que é confrontada diuturnamente. O fato é que o Estado não está preparado para oferecer tantos serviços e prestações sociais e econômicas à população, direitos que acabam por sucumbir ao modo programático, perdendo a Constituição certa juridicidade. Muitos autores asseveram, ainda como causa da crescente atrofia das prestações estatais, a globalização, por apontar para novas propensões expansionistas do modelo 64 É preciso estabelecer a distinção entre o conceito de eficácia jurídica e eficácia social da norma. Enquanto a eficácia jurídica representa a qualidade da norma produzir determinados efeitos jurídicos, estando relacionada à sua aplicabilidade, exigibilidade ou executoriedade, a eficácia social se confunde com a ideia de efetividade e designa a concreta aplicação dos efeitos da norma juridicamente eficaz. Refere-se ao cumprimento efetivo do Direito por parte de uma sociedade, ou seja, aos efeitos que uma regra opera pelo seu cumprimento. Trata-se da concretização do comando normativo e de sua força realizadora no mundo dos fatos. SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 6. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. 47 econômico com poderes destrutivos no direito e na política. Inobstante a dificuldade apontada, o Estado não pode olvidar que possui a tarefa de cumprir suas metas já bem delineadas pela inúmeras normas voltadas à proteção do ambiente, mormente aquelas descritas no art. 225 da CF/88, razão por que não deve se descuidar de implementar políticas públicas efetivas por todos os entes da federação brasileira, num esforço envolvendo todos os poderes da república: legislativo, executivo e judiciário. 48 1.4 Vinculação Estatal no Dever à Adoção de Políticas Públicas Ambientais Antes de abordar o novo papel do Estado, ou seja, na imposição de assumir um dever/missão de proteção do meio ambiente, é relevante destacar a natureza jurídica do direito ao ambiente para uma ampla compreensão de sua conformação jurídico-constitucional. As discussões jurídicas que envolvem o direito fundamental ao ambiente são controvertidas, especialmente quando se pretende levar a sério o direito ao ambiente no sentido de alcançar uma realização efetiva, pois os direitos fundamentais, somente podem ser concebidos como tal, se houver garantias no ordenamento jurídico que favoreçam seu exercício. Nessa linha de raciocínio, alerta Gavião Filho, que se um direito fundamental não pode ser protegido judicialmente ele é inexistente. Leciona o autor: [...] o direito ao ambiente não é mais do que um princípio da política social e econômica do Estado, que vincula os poderes públicos pelo caráter normativo da Constituição, porém que não outorga uma esfera de proteção especial aos indivíduos porque não poderiam efetivá-la perante os tribunais, salvo aquele eventualmente conformado pela legislação 65 infraconstitucional. Todavia, ao longo da história, a positivação dos direitos fundamentais, imanentes à condição humana, foram reconhecidos constitucionalmente de forma paulatina, seguindo os fatos da história. Após debates ideológicos, os primeiros direitos consolidados foram o da liberdade, passando em seguida aos da igualdade, e, logo após, aos ligados à noção de solidariedade, sequência essa que reflete o lema dos idealistas franceses que viveram no século XVIII: liberdade, igualdade e 66 fraternidade! Importa, ainda, traçar a positivação jurídico-constitucional dos direitos 65 GAVIÃO FILHO, Anízio Pires. Direito Fundamental ao Ambiente. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005, p. 27. 66 Nesse sentido, dentre muitos, Ingo Wolfgang Sarlet, que, de sua parte, lança uma pitada de crítica ao assunto: “Os direitos da primeira, da segunda e da terceira dimensões (assim como os da quarta, se optarmos pelo seu reconhecimento), consoante lição já habitual na doutrina, gravitam em torno dos três postulados básicos da Revolução Francesa, quais sejam, a liberdade, a igualdade e a fraternidade, que, considerados individualmente, correspondem às diferentes dimensões. Todavia, tenho para mim que esta tríade queda incompleta em não se fazendo a devida referência ao mais fundamental dos direitos, isto é, à vida e ao princípio fundamental da dignidade da pessoa humana” SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 8. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 66. 49 fundamentais, dentro daquilo que se convencionou chamar, na doutrina, de 67 68 “gerações” ou “dimensões”. Os direitos de primeira dimensão são os direitos da liberdade, sendo os primeiros como objeto de contemplação constitucional. São os direitos individuais civis e políticos, titularizados pelo indivíduo; são direitos de resistência ou de oposição perante o Estado. Esses direitos surgiram durante o século XVIII e dominaram todo o século XIX. Sua fonte foi a ideologia do liberalismo político e do individualismo jurídico, enquanto reações à ação absolutista dos soberanos, tendo como centro de sua atenção o indivíduo. Não tardou para o liberalismo mostrar seus excessos e falhas. Sem embargo dos reconhecidos avanços, a Revolução Industrial, praticada no campo da liberdade irrestrita, fez-se desembocar em um cenário 69 aterrador: a exploração da classe trabalhadora. 70 Com o nascimento do Estado Social, no século seguinte, surge um novíssimo ramo do Direito, voltado a compensar, no plano jurídico, o natural desequilíbrio travado, no plano fático, entre o capital e o trabalho. Nascem os direitos sociais, culturais e econômicos, fundados no princípio da igualdade, de alcance 67 BONAVIDES, dentre outros, vale-se do termo “gerações” para se referir à gradativa inserção constitucional das diversas nuanças de direitos fundamentais exsurgidas ao longo da história, no que é seguido por grande parte dos autores. Com efeito, diz o mestre cearense que “os direitos fundamentais passaram na ordem institucional a manifestar-se em três gerações sucessivas, que traduzem sem dúvida um processo cumulativo e quantitativo [...]”. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 19. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 563. 68 Ingo Wolfgang Sarlet, em clássica obra, explica o porquê de sua opção, verbis: “Em que pese o dissídio na esfera terminológica, verifica-se crescente convergência de opiniões no que concerne à idéia que norteia a concepção das três (ou quatro, se assim preferirmos) dimensões dos direitos fundamentais, no sentido de que estes, tendo tido sua trajetória existencial inaugurada com o reconhecimento formal nas primeiras Constituições escritas dos clássicos direitos de matriz liberal- burguesa, se encontram em constante processo de transformação, culminando com a recepção, nos catálogos constitucionais e na seara do Direito Internacional, de múltiplas e diferenciadas posições jurídicas, cujo conteúdo é tão variável quanto as transformações ocorridas na realidade social, política, cultural e econômica ao longo dos tempos. Assim sendo, a teoria dimensional dos direitos fundamentais não aponta, tão-somente, para o caráter cumulativo do processo evolutivo e para a natureza complementar de todos os direitos fundamentais, mas afirma, para além disso, sua unidade e indivisibilidade no contexto do direito constitucional interno e, de modo especial, na esfera do moderno ‘Direito Internacional dos Direitos Humanos”. SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 8.ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 55. - Guerra Filho também emprega esse expressão. GUERRA FILHO, Willis Santiago. Processo Constitucional e Direitos Fundamentais. 4. ed. São Paulo : RCS, 2005, p. 46. 69 A respeito, Fábio Konder Comparato ensina que: A sociedade liberal ofereceu-lhe, em troca, a segurança da legalidade, com a garantia da igualdade de todos perante a lei. Mas essa isonomia cedo revelou-se uma pomposa inutilidade para a legião crescente de trabalhadores, compelidos a se empregarem nas empresas capitalistas. - COMPARATO, Fábio Konder. A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 52. 70 Nessa temática, vale conferir: BONAVIDES, Paulo. Do Estado Liberal ao Estado Social. 7.ed. São Paulo: Malheiros, 2004. 50 positivo, pois não exercidos contra o Estado, direitos estes, que exigem do Estado postura ativa para a sua efetivação. A partir desse marco no constitucionalismo, recai sobre os ombros do Estado a obrigação de realizar políticas públicas interventivas tendentes à melhoria das condições de vida da sociedade. O Estado deixa de ser meramente abstencionista, para ser intervencionista, pois passa a intervir no plano socioeconômico. Nas palavras de Krell: Os direitos fundamentais sociais não são direitos contra o Estado, mas através do Estado, exigindo do Poder Público certas prestações materiais. O Estado, através de leis, atos administrativos e da criação real de instalações de serviços públicos, deve definir, executar e implementar, conforme as circunstâncias, as chamadas políticas sociais (de educação, saúde, assistência, previdência, trabalho, habitação) que facultem o gozo 71 efetivo dos direitos constitucionalmente protegidos. Os direitos da fraternidade ou da solidariedade, os classificados de direitos de terceira dimensão, nascem a partir de reflexões sobre o desenvolvimento, a paz, o meio ambiente, a comunicação e o patrimônio comum da humanidade, consolidando-se no fim do século XX. A inserção desses direitos, na esfera de proteção constitucional, surgiu em razão da desigualdade que se verifica entre 72 países desenvolvidos e países subdesenvolvidos. O núcleo de tais direitos é o próprio gênero humano e não mais se destinando a proteção dos interesses individuais, de um grupo ou de um determinado Estado. O direito ao meio ambiente sadio é um direito fundamental de terceira dimensão. No entanto, também se vislumbra no referido direito, um conteúdo de cunho notadamente social, havendo muitos autores que entendem tratar-se o meio 73 ambiente de um direito fundamental social do ser humano. Bonavides explica: 71 KRELL, Andreas J. Controle judicial dos serviços públicos básicos na base dos direitos fundamentais sociais. In: A Constituição concretizada – construindo pontes com o público e o privado. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2000, p. 27. 72 Cuida-se, na verdade, do resultado de novas reivindicações fundamentais do ser humano, geradas, dentre outros fatores, pelo impacto tecnológico, pelo estado crônico de beligerância, bem como pelo processo de descolonização do segundo pós-guerra e suas contundentes consequências, acarretando profundos reflexos na esfera dos direitos fundamentais. SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 8. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 58. 73 DERANI, Cristiane. Meio ambiente ecologicamente equilibrado: direito fundamental e princípio da atividade econômica. In: FIGUEIREDO, Guilherme José Purvin de. (Org.). Temas de Direito Ambiental e Urbanístico. São Paulo: Max Limonad, 1998, p. 100. 51 Com efeito, um novo polo jurídico de alforria do homem se acrescenta historicamente aos da liberdade e da igualdade. Dotados de altíssimo teor de humanismo e universalidade, os direitos da terceira geração tendem a cristalizar-se no fim do século XX enquanto direitos que não se destinam especificamente à proteção dos interesses de um indivíduo, de um grupo ou de um determinado Estado. Tem primeiro por destinatário o gênero humano mesmo, num momento expressivo de sua afirmação como valor supremo 74 em termos de existencialidade concreta. O mesmo autor segue o estudo dos direitos fundamentais, defendendo a 75 76 existência de uma quarta e quinta gerações de direitos. A Constituição Federal trata dos Direitos e Garantias Fundamentais no Título II. Digna de nota é a redação do parágrafo 2º do art. 5º, in verbis: “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”. Depreende-se, portanto, que os direitos fundamentais não são apenas aqueles explicitados no art. 5º, a interpretação do parágrafo 2º do art. 5º da Constituição Federal indica que seu rol de direitos fundamentais não é taxativo, podendo outros direitos fundamentais estar esparsos em seu texto. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, previsto no art. 225 da Constituição Federal é 77 um direito fundamental da pessoa humana. Para Bessa Antunes, no regime constitucional brasileiro, o próprio caput do art. 225 da Constituição Federal impõe a conclusão de que o direito ambiental é um dos direitos humanos fundamentais, aclarando, também, que o próprio art. 5º do texto constitucional faz menção expressa ao meio ambiente, ao tratar da ação popular (inciso LXXIII). Uma das vantagens da constitucionalização do ambiente, leciona Benjamin, é justamente sua proteção como direito fundamental. Por meio da via constitucional, 74 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 19.ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 569. 75 Diz Bonavides: A globalização política na esfera da normatividade jurídica introduz os direitos de quarta geração, que, aliás, correspondem à derradeira fase de institucionalização do Estado social. São direitos de quarta geração o direito à democracia, o direito à informação e o direito ao pluralismo. BONAVIDES. Op. cit., pp. 571-572. BOBBIO também vislumbra uma quarta geração, porém de conteúdo diverso que o traçado por Bonavides. Para o mestre italiano, este novíssimo catálogo surge de novas exigências “referentes aos efeitos cada vez mais traumáticos da pesquisa biológica, que permitirá manipulações do patrimônio genético de cada indivíduo. BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Carlos Nelson Coutinho (Trad.). Rio de Janeiro: Elsevier, 2004, p. 6. 76 BONAVIDES fez expressa menção à possibilidade concreta de se falar, atualmente, em uma quinta geração de direitos fundamentais: um direito à paz. 77 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 8. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 19. 52 o meio ambiente é elevado ao ponto mais alto do ordenamento, galgando status de direito fundamental e, consequentemente, suas normas se afiguram como de aplicabilidade imediata, nos termos do parágrafo 1º do art. 5º da Norma Fundamental. A fundamentalidade do direito justifica-se, primeiro, em razão da estrutura normativa do tipo constitucional (“Todos têm direito...”); segundo, na medida em que o rol do artigo 5º, sede principal de direitos e garantias fundamentais, por força do seu parágrafo 2º, não é exaustivo (direitos fundamentais há – e muitos – que não estão contidos no art. 5º); terceiro, porquanto, sendo uma extensão material (pois salvaguarda suas bases ecológicas vitais) do direito à vida, garantido no art. 5º, caput, reflexamente recebe deste as bênçãos e aconchego, como adverte a boa lição de Nicolao Dino, segundo a qual “o direito ao meio ambiente caracteriza-se como um 78 corolário do direito à vida”. O tema dos deveres fundamentais foi esquecido pela doutrina após a composição do Estado Liberal, preocupada que estava com a afirmação das liberdades individuais contra o arbítrio e opressão estatal, razão por que o foco passou à consolidação dos direitos fundamentais. Com o transcorrer do tempo, a exacerbação da liberdade individual projetou um quadro de injustiça e desigualdade, assim, retomou-se a necessidade de remodelar o excessivo individualismo com a instituição dos deveres fundamentais. Um empenho solidário de todos para a transformação da sociedade passou a ser a nova estratégia do Estado, pois repassa ao indivíduo a competência para exercer suas liberdades. Não necessita apenas de direitos, mas também deveres, de responsabilidade social, denominada por Vieira Andrada de “responsabilidade 79 comunitária". Não se pode deixar de mencionar, no entanto, que o grande titular de deveres é o próprio Estado, já que: [...] todos os deveres fundamentais estão ao serviço de valores comunitários, de valores que, ainda que dirigidos directamente (sic) à realização de específicos direitos fundamentais dos próprios destinatários dos deveres ou de terceiros, são assumidos pela comunidade nacional como valores seus, constituindo assim, ao menos de um modo directo (sic) 78 BENJAMIN, Antônio Herman. Constitucionalização do ambiente e ecologização da Constituição brasileira. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens Morato (Orgs.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2007, pp. 102-103. 79 ANDRADE, Jose Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais na Constituição portuguesa de 1976. Coimbra: Almedina, 2001, p. 155. 53 ou imediato, deveres para com a comunidade estadual. E nesta medida, o estado é o titular activo (sic) número um de todos os deveres fundamentais. Pelo que, neste sentido, todos os deveres fundamentais são deve res do 80 cidadão, não havendo assim lugar para deveres do homem. Associando o dever fundamental aos interesses ecológicos, ou seja, como deveres de defesa do ambiente e de preservação e valorização do patrimônio ambiental, Canotilho entende indispensável deslocar o problema dos direitos fundamentais para o âmbito dos deveres. Isso implica na “necessidade de se ultrapassar a euforia do individualismo dos direitos fundamentais e de se radicar uma comunidade de responsabilidade de cidadãos e entes políticos perante os 81 problemas ecológicos e ambientais”. Nesse cenário constitucional, em função da emergência da implementação da cultura ambientalista e dos valores ecológicos no espaço político-comunitário contemporâneo, o constituinte levou à redação do Capítulo VI na Constituição Federal, intitulado Do Meio Ambiente, que, no seu artigo 225, caput teve a seguinte redação: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e 82 futuras gerações”. O direito ambiental, ecologicamente equilibrado, como direito fundamental, possui uma roupagem de dever e missão de proteção ao conter simultaneamente forma de objetivo e tarefa estatal. Isso porque de tal garantia possui caráter vital para o desenvolvimento humano em níveis compatíveis com sua dignidade e promoção de um completo bem-estar existencial sob pena de incorrer em práticas antijurídicas. Nesse contexto, a Constituição estabeleceu competência administrativa em sintonia com os deveres de proteção ambiental a todos os entes federativos (Municípios, Estados, Distrito Federal e União), cabendo a todos, de forma solidária, 80 NABAIS, J. C. O dever fundamental de pagar impostos. Coimbra: Livraria Almedina, 1998, p. 105. Essa obra, inobstante ter como enfoque o direito tributário, é reconhecida pela doutrina como uma das principais obras a discorrer sobre deveres fundamentais. 81 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. O direito ao ambiente como direito subjetivo. In: ______. Estudos sobre direitos fundamentais. Coimbra: Coimbra, 2004, p.178. 82 BRASIL. Constituição. Brasília: Senado Federal, 1988. 54 83 o dever de proteção. Os deveres de proteção do Estado, para com os direitos fundamentais, representam valores constitucionais de toda a comunidade estatal e, com a transição do Estado Liberal para o Social, nova compreensão da irradiação dos efeitos dos direitos fundamentais surgiu, pois que, não se poderia mais estar cingida ao âmbito privado, mas sobre toda a ordem jurídica e, vinculando, obrigatoriamente, os poderes estatais a sua tutela. Segundo Vieira de Andrade, esse novo efeito do direito fundamental ao ambiente faz nascer uma concepção do Estado-amigo de tais 84 direitos, conduzindo a uma postura ativa de guardião. Configurada a obrigação constitucional do Estado, em adotar medidas legislativas e administrativas em matéria de tutela ecológica, capazes de assegurá- la, cabe ao Executivo o zelo aos deveres definidos pelo legislador, enquanto que ao Judiciário o controle constitucional da concretização do objetivo estatal fixado pelo legislador, acatando sempre o essencial espaço democrático de conformação deste último. Trata-se de um pacto constitucional, um compromisso político e jurídico de proteção ao direito fundamental ao ambiente sadio, seja numa posição ativa, seja 85 criando meios incapazes de obstaculizar sua efetivação (dever de evitar riscos). Destacando essa ideia, Andrade esclarece: [...] passou-se a dar relevo à existência de “deveres de proteção” dos direitos fundamentais por parte do Estado, designadamente perante terceiros: a vinculação dos poderes estatais aos direitos fundamentais não se limitam ao cumprimento do dever principal respectivo (de abstenção, ou ainda de prestação ou de garantia da participação, conforme o tipo de 83 Art. 225 [...]. § 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: I – preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; II – preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético; III – definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; IV – exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade; V – controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente; VI – promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente; VII – proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais à crueldade. 84 ANDRADE. Op. cit., p. 142. 85 SARLET, Ingo Wolfgang; FENSTERSEIFER, Tiago. Direito Constitucional ambiental. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, pp. 183-184. 55 direito do particular), antes implicaria o dever de promoção e de proteção dos direitos perante quaisquer ameaças, afim de assegurar a sua 86 defectividade. A omissão ou a atuação insuficiente no tocante a medidas do poder público, em âmbito legislativo ou executivo, relacionadas ao combate das causas geradoras de degradação ambiental, pode ensejar intervenção e controle judicial, inclusive associadas às políticas públicas, conduzidas pelos entes federativos em matéria 87 relacionada ao ambiente. Apesar do dever geral de efetivação dos direitos fundamentais, atribuído ao 88 Estado, Sarlet esclarece que é compromisso estatal zelar, por sua proteção, até de forma preventiva, não somente contra atos do poder público, mas também, contra quaisquer agressões particulares ou estrangeiras. Aliás, a despeito das tarefas estatais de proteção ao direito fundamental ao ambiente, Alexy leciona didaticamente que: Ele é formado por um feixe de posições de espécies bastante distintas. Assim, aquele que propõe a introdução de um direito fundamental ao meio ambiente, ou que pretende atribuí-lo por meio de interpretação a um dispositivo de direito fundamental existente, pode incorporar a esse feixe, dentre outros, um direito a que o Estado se abstenha de determinadas intervenções no meio ambiente (direito de defesa), um direito a que o Estado proteja o titular do direito fundamental contra intervenções de terceiros que sejam lesivas ao meio ambiente (direito a proteção), um direito a que o Estado inclua o titular do direito fundamental nos procedimentos relevantes para o meio ambiente (direito a procedimentos) e um direito a que o próprio Estado tome medidas fáticas benéficas ao meio ambiente 89 (direito a prestação fática). Aspecto relevante, atrelado ao dever do Estado de proteção, diz respeito à 90 limitação do poder da discricionariedade na adoção das políticas públicas, pois que tal imperativo constitucional limita a liberdade de agir na adoção de políticas públicas ambientais do Poder Público, obrigando-o a uma adequação contínua às novas 86 ANDRADE. Op. cit., p. 142. 87 SARLET. Op. cit., 2011, pp. 41-44. 88 SARLET. Op. cit., 2007, p. 164. 89 ALEXY. Op. cit., p. 443. 90 A respeito de dever discricionário Mello conceitua: [...] margem de liberdade que remanesça ao administrador para eleger, segundo critérios consistentes de razoabilidade, um, dentre pelo menos dois comportamentos cabíveis, perante cada caso concreto, a fim de cumprir o dever de adotar a solução mais adequada à satisfação da finalidade legal. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Discricionariedade e Controle Jurisdicional. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 48. 56 situações de risco, bem como, uma responsabilização na autorregulação social. Nessa mesma linha, Benjamin explica que a redução da discricionariedade do Poder Público conduz em benefício à constitucionalização da tutela do meio ambiente assim, as normas constitucionais vinculam a atuação administrativa na condução do dever de levar a cabo o pacto socioambiental positivado, protegendo-o e exigindo 91 respeito dos demais membros da federação. Nascem, portanto, novas perspectivas de efetivação de uma Administração Pública no Brasil, sob o enfoque socioambiental, com a implementação de políticas públicas na construção de uma gestão mais democrática e participativa. Tudo isso, com base no socioambientalismo, devendo-se incluir, neste contexto, as comunidades locais, detentoras de conhecimentos e práticas de caráter ambiental. Cabe ao Estado propor ações preventivas diante de situações de risco à sociedade por meio de políticas públicas. Na seara ambiental, muito antes da nova formatação do Estado Socioambiental, instituída expressamente no texto constitucional de 1988, a Lei de Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938) criada em 1981, já estabelecia como princípio ação governamental na manutenção 92 do equilíbrio ecológico; Como objetivo à definição de áreas prioritárias de ação 93 governamental relativa à qualidade e ao equilíbrio ecológico; e, como diretriz, 94 orientação de normas e planos, destinados a orientar a ação dos Governos. No transcorrer da história brasileira, a sociedade amadureceu politicamente, por meio da via democrática, destacando-se os aspectos da transparência, da participação e do controle social, cada vez mais presentes nos debates públicos. O 91 BENJAMIM, Antônio Hernan. Constitucionalização do ambiente e ecologização da Constituição brasileira. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes; MORATO LEITE, José Rubens (orgs.). Direito constitucional ambiental brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2007, p.75. 92 Art. 2º - A Política Nacional do Meio Ambiente tem por objetivo a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento socioeconômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana, atendidos os seguintes princípios: I - ação governamental na manutenção do equilíbrio ecológico, considerando o meio ambiente como um patrimônio público a ser necessariamente assegurado e protegido, tendo em vista o uso coletivo. (Grifo nosso). 93 Art. 4º - A Política Nacional do Meio Ambiente visará: [...]; II - à definição de áreas prioritárias de ação governamental relativa à qualidade e ao equilíbrio ecológico, atendendo aos interesses da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios; (Grifo nosso). 94 Art. 5º - As diretrizes da Política Nacional do Meio Ambiente serão formuladas em normas e planos, destinados a orientar a ação dos Governos da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios no que se relaciona com a preservação da qualidade ambiental e manutenção do equilíbrio ecológico, observados os princípios estabelecidos no art. 2º desta Lei. Parágrafo único - As atividades empresariais públicas ou privadas serão exercidas em consonância com as diretrizes da Política Nacional do Meio Ambiente. (Grifo nosso). 57 movimento para a defesa do ambiente, por seu turno, também mereceu prestígio, na medida em que passou por mudanças significativas, no foco da sustentabilidade. A atividade econômica passou a englobar também os aspectos sociais e econômicos, inerente ao desenvolvimento sustentável, atentos ao comando constitucional. O discurso tem sido quase uníssono no sentido de que os problemas socioambientais vivenciados pela sociedade brasileira podem ser solucionados através do aperfeiçoamento de mecanismos de regulação do uso sustentável dos recursos naturais. A busca de soluções à degradação da natureza depende do aprimoramento institucional da sociedade e do incremento da sua capacidade de equilibrar os interesses relacionados ao uso de recursos naturais. A realidade das políticas, na seara ambiental, está ainda bastante afastada do tão debatido conceito de socioambientalismo, pois que existe um abismo entre as questões econômicas e ambientais que têm como principal causa a expansão do capitalismo internacional. Mesmo diante desse disparate, o Poder Público tem o dever de proteger o direito fundamental ao meio ambiente, ameaçado pelo comportamento de risco do ser humano, por meio de políticas públicas – consectário da força da imperatividade da nova ordem socioambiental constitucional, e fruto de um Estado Democrático de Direito como remédio à ineficácia e inefetividade das normas nessa seara. Como corolário dessa postura governamental, é indispensável uma alfabetização ecológica do indivíduo ao Estado, do cidadão ao político. Há que se repensar sobre o que representa o bem-estar para a civilização e o que representa segurança ambiental aos seres vivos. A adoção de instrumentos econômicos ao uso sustentável dos recursos naturais é tarefa que se impõe, pois, sabidamente, é de grande impacto nas relações sociais. São grandes os desafios da política ambiental brasileira na harmonização entre o desenvolvimento econômico, associado ao processo de industrialização, e a utilização dos recursos da natureza. A questão é agravada pela ausência de informações a respeito da extensão e relevância dos problemas resultantes da degradação, fatos esses, impeditivos do controle da poluição e da consolidação do Estado de Direito Ambiental, razão pela qual urge uma formação de alfabetização ecológica. Neste contexto, detectada a situação vulnerável do ser humano na destruição, por ele próprio, de seu habitat, a irreversibilidade e a magnitude dos 58 danos, torna primordial uma intervenção estatal, eficaz à manutenção do meio ambiente, através de políticas ambientais, sendo mister, também, a sua precisa definição. Uma política pública ambiental está indissociavelmente conectada aos fundamentos da economia e do direito, além de questões de ordem social, ética e várias outras. Nesta perspectiva é essencial, inclusive, um processo de racionalização das incertezas decorrentes da forma de viver escolhida pelo homem na seara ambiental. Percebe-se que existe o compromisso jurídico assumido pela sociedade contemporânea em conciliar crescimento econômico e cuidado ao meio ambiente. O bem-estar humano, associado aos bens materiais, não justifica mais a devastação do meio natural. Isso porque, diante dos novos conhecimentos, ocorre a constatação da irreversibilidade da destruição e dos óbvios benefícios que um meio ambiente saudável proporciona à qualidade de vida das pessoas. A elaboração de normas infraconstitucionais tem se mostrado ineficiente para o alcance dos objetivos traçados pelo Estado Socioambiental de Direito. É indispensável o despertar para uma nova forma de pensar, frente aos complexos problemas ecológicos, na busca de uma sociedade mais harmoniosa. Isto só ocorrerá através da construção de uma ética ambiental por parte de todos os personagens desta história, uma interação e cooperação entre os indivíduos, políticos, administradores, magistrados, cientistas, operadores do direito. Observam-se as assertivas de que o Estado é o detentor exclusivo do poder da gestão pública, possuidor de grande controle sobre a ordem econômica, especificamente na arrecadação dos recursos e da degradação do meio ambiente, tornando inevitável a relação entre elas: intervenção tributária estatal na salvaguarda do berço ecológico. Nesse processo, o Estado poderá ser capaz de fazer nascer no contribuinte uma conscientização ambiental ao beneficiar economicamente o comportamento amigo da natureza. 59 2. A POLÍTICA AMBIENTAL E SEUS IMPACTOS NA ORDEM SOCIAL, ECONÔMICA E TRIBUTÁRIA As tarefas que o Estado Democrático Direito se responsabiliza são amplas e complexas, pois não convergem apenas a uma seara de interação social – economia ou direitos sociais ou direito individuais – elas são focadas para todas as áreas que possam interferir sobre a vida dos cidadãos que habitam seu território. Ampliando ainda mais esse cabedal de atuação, pela mudança de concepção do Estado que passa a ser delineado como Estado Democrático Socioambiental de Direito, surge uma nova atribuição àqueles que atuam como servidores estatais: a intervenção efetiva sobre as relações socioeconômicas que interferem sobre o meio ambiente. Nessa linha, em um primeiro momento expõem-se quais são as diretrizes para que o Estado possa agir de maneira oportuna em face das questões ambientais, uma vez que a implementação de políticas públicas ambientais provocam impactos nas mais diversas áreas, dentre as quais a econômica, a social e a tributária. Em face disso, e pela premência da Economia no contexto socioeconômico atual demonstra-se que toda a política pública ambiental, por mais singela que pareça, quando elaborada, deve dialogar com a Economia, buscando harmonizar diversos interesses, dentre os quais a preservação dos recursos naturais e a manutenção de nível coerente de desenvolvimento econômico, possibilitando o aumento do bem-estar social. Por fim, alterca que uma atuação eficaz do Estado em face do meio ambiente em consenso com os primados da Economia, pode ser erigido pela aplicação do tributo ambiental que, em consonância com a Constituição Federal, deve criar um mecanismo idôneo para estimular a preservação ambiental sem olvidar do desenvolvimento econômico. 60 2.1 Diretrizes à adoção de política ambiental Atualmente, há o reconhecimento de que a qualidade e o equilíbrio ambiental são imprescindíveis para uma vida digna. Mais do que isso, a tutela de outros direitos fundamentais historicamente conquistados – tais como o direito à vida, à moradia, à saúde e à alimentação – tornam-se inócuos se não estiveres vinculados à proteção do ambiente. Bobbio considera que o “direito de viver num 95 ambiente não poluído” é o mais relevante dentre os assim denominados direitos de terceira geração ou dimensão. A tentativa de incorporação, tanto pela sociedade como pelos agentes políticos, de uma efetiva consciência ecológica é incipiente e a situação de vulnerabilidade existencial do ser humano em decorrência da degradação ambiental comprometedora é por si só, capaz de prejudicar o bem-estar individual e coletivo. De acordo com Leff, vive-se em um período de irracionalidade ecológica em que o desenvolvimento é meta primordial onde não há espaço para internalização das externalidades: [...] a visão mecanicista da razão cartesiana converteu-se no princípio constitutivo de uma teoria econômica que predomina sobre os paradigmas organicistas dos processos da vida, legitimado numa falsa ideia de progresso da civilização moderna, desta forma, a racionalidade econômica baniu a natureza da esfera de produção, gerando processos de destruição 96 ecológica e degradação ambiental. O primeiro passo à conscientização ecológica ocorreu quando o Direito Constitucional e, mais precisamente, a Teoria dos Direitos Fundamentais evoluiu no sentido de indicar diretrizes à solução dos graves problemas que se apresentam. Essa etapa deve ser necessariamente trilhada no processo de “afirmação histórica 97 dos direitos humanos”. A respeito do tema, Andrade assevera que: Os sociólogos descrevem a sociedade atual, já obviamente pós-industrial, como uma “sociedade de risco” (Beck) ou uma “sociedade do desaparecimento” (Breuer), na medida em que corre “perigos ecológicos” (e perigos genéticos) ou, segundo alguns, caminha mesmo, por força do seu 95 BOBBIO, Op. cit., 2004, p. 06. 96 LEFF, Enrique. Saber Ambiental: sustentabilidade, racionalidade, complexidade, poder. Tradução de Lucia Mathilde e Endlich Orth. 3. ed. Rio de Janeiro: Vozes, 2004, p. 17. 97 COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos direitos humanos. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, passim. 61 próprio movimento, para a destruição das condições de vida naturais e sociais (e da própria pessoa) – é dizer, na medida em que ocorre o perigo de passar, ou transita efectivamente, da autoreferência (autopoiesis) para a 98 autodestruição. 99 Capra, principal autor que discorre sobre a sistêmica conexão entre todos os sistemas, reconhece a interdependência fundamental de todos os fenômenos e o fato de que, como indivíduos e sociedades, todos estão encaixados nos processos cíclicos da natureza e que qualquer modificação nesse quebra-cabeça do sistema natural, provocará consequências em desfavor da “teia da vida”. Assim, a ecologia 100 profunda é uma concepção a ser entendida como o mundo de consciência no qual o indivíduo está conectado com o cosmos como um todo, sendo peça integrante de tal. Tal concepção de sistema surgiu a partir do trabalho desenvolvido por 101 Maturana e Varela onde demonstram que a vida é um processo contínuo de conhecimento e a história descortina a realidade da vida biológica e social na Terra, representando a síntese da dinâmica de fenômenos que são biológicos e sociais a um só tempo. Nessa senda, defendem que a história biológica e social dos seres humanos é apresentada o tempo todo como uma tensão entre o ser e o seu meio. 102 Adotam na obra A Árvore do Conhecimento , a seguinte tese: Vivemos com os outros seres vivos, e portanto compartilhamos com eles o processo vital. Construímos o mundo em que vivemos durante as nossas vidas. Por sua vez ele também nos constrói ao longo dessa viagem comum. 98 ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. 2. ed. Coimbra: Almedina, 2001, p. 61. 99 CAPRA. Op. cit., 1996, pp. 25-26. 100 A expressão ecologia profunda foi criada durante a década de 1970 pelo filósofo norueguês Arne Naess, em oposição ao que ele chama de "ecologia superficial" – isto é, a visão convencional segundo a qual o meio ambiente deve ser preservado apenas por causa da sua importância para o ser humano. Expressa a percepção prática de que o homem é parte inseparável, física, psicológica e espiritualmente, do ambiente em que vive. 101 Ambos os seus autores são biólogos chilenos e orientaram os seus interesses de pesquisa e construção de conhecimento para a compreensão da vida dos seres vivos na terra e o desenvolvimento e funcionamento do sistema nervoso. Suas pesquisas além de se estenderem ao âmbito social e humano, deram um grande contributo para o desenvolvimento da neurociência. 102 O ponto de partida da obra A Árvore do Conhecimento é surpreendentemente simples: a vida é um processo de conhecimento; assim, se o objetivo é compreendê-la, é necessário entender como os seres vivos conhecem o mundo. Denominam esse processo de biologia da cognição. A tese central da obra é de que se vive no mundo e por isso faz-se parte dele; vive-se com os outros seres vivos, e portanto compartilha-se com eles o processo vital. Assim, vivendo e comportando- se de um modo que torna insatisfatória a qualidade de vida, a responsabilidade cabe à coletividade como um todo. 62 Assim se vivemos e nos comportamos de um modo que torna insatisfatória 103 a nossa qualidade de vida, a responsabilidade cabe a nós. Na sequência de sua tese, evidenciam fundamentalidade para uma conexão de sua obra com a educação ao afirmarem que: Se a vida é um processo de conhecimento, os seres vivos constroem esse conhecimento não a partir de uma atitude passiva e sim pela interação. Essa posição é estranha a quase tudo que nos chega por meio da 104 educação formal. A atual crise ambiental propõe a necessidade de internalizar uma nova 105 cultura por meio de uma educação ambiental emergente e de um conhecimento capaz de captar a multicausalidade e as relações de interdependência dos processos de ordem natural e social. Assim, vislumbra-se a construção do Estado Socioambiental: uma racionalidade orientada aos objetivos de um desenvolvimento 106 sustentável, equitativo e duradouro. Caso não haja consciência ecológica, o Estado precisará usar instrumentos repressivos que, por sua vez, serão geradores de restrição da liberdade, o que não se deseja nos Estados contemporâneos. Esta cooperação entre Estado e indivíduo exige metas de proteção ambiental para se assegurar o bem comum, mesmo que isso implique em restrições a interesses individuais. Essa construção de uma consciência ecológica é um desafio enorme na medida em que não se tem a real noção da complexidade que envolve a 107 degradação ambiental. Kloepfer aponta como razões permanentes da sobrecarga ao meio ambiente a impossibilidade de remover os danos passados, a continuidade dos atos de degradação, o desconhecimento da perniciosidade dos atos predatórios, 103 MATURANA, Humberto e VARELA, Francisco. A Árvore do Conhecimento: as bases biológicas da compreensão humana. São Paulo: Pala Athenas, 2001, p. 10. 104 Idem, ibidem, p.12. 105 No Brasil, já há uma Política Nacional de Educação Ambiental (Lei 9.795/99) em que estabelece 0 as diretrizes para a formação de uma educação ambientalista. Descreve o art. 1 da referida lei: Processo em que se busca despertar a preocupação individual e coletiva para a questão ambiental, garantindo o acesso à informação em linguagem adequada, contribuindo para o desenvolvimento de uma consciência crítica e estimulando o enfrentamento das questões ambientais e sociais. Desenvolve-se num contexto de complexidade, procurando trabalhar não apenas a mudança cultural, mas também a transformação social, assumindo a crise ambiental como uma questão ética e política. 106 FREITAS, Vladimir Passos de. Direito Ambiental em evolução. Curitiba: Juruá, 2007, p. 39. 107 KLOEPFER. Op. cit., p. 41. 63 o comportamento de risco do ser humano e a demora de resultados das medidas protetivas. Ademais, não se deve esquecer que o Direito Ambiental está engatinhando haja vista ter surgido recentemente (a partir dos anos 70 do século passado). Não há uma receita pronta para se alcançar os objetivos do novo Estado Socioambiental de Direito. Sabe-se que se pretende a proteção do meio ambiente, mas questões surgem: Como fazê-lo? Qual a limitação do uso da natureza? Quais remédios utilizáveis para proteger? Entre outras indagações. Essa abordagem ecológica do direito explicita uma interdependência entre deveres e direitos. O ser humano precisa saber usar dos recursos naturais, reconhecendo sua dependência a/por ele. Como já abordado, a mera elaboração de normas jurídicas tem se mostrado incapaz de alcançar os objetivos traçados pelo Estado Socioambiental de Direito. Indispensável um despertar para uma nova forma de pensar frente aos complexos problemas ecológicos na busca de uma sociedade mais harmoniosa. Para se alcançar tal meta, é imprescindível à aplicação dos ensinamentos da ética 108 ambiental por todos os personagens da história. Deve haver a interação e cooperação entre os indivíduos, políticos, administradores, magistrados, cientistas, operadores do direito. Diante desta crise ecológica, Ost adverte: “[...] É efectivamente [sic] nossa convicção que, enquanto não for repensada a nossa relação com a natureza e enquanto não formos capazes de descobrir o que dela nos distingue e o que a ela nos liga, os nossos esforços serão em vão, como a testemunha a tão relativa efectividade [sic] do direito ambiental e a tão modesta 109 eficácia das políticas públicas neste domínio”. Uma interiorização de valores éticos pelos cidadãos com atos verdadeiramente empenhados com o meio natural resultará em mudanças comportamentais, pois são atitudes que impedirão o uso da natureza de forma 108 Em busca de uma ética ambiental, o pensamento de MEDEIROS, é que “A questão levantada, neste momento, acerca da relevância de se estabelecer um compromisso sócio-jurídico de preservação do ambiente no qual estamos inseridos, está alicerçada na ideia de que não estamos buscando a proteção do direito de propriedades, de liberdade, de defesa perante o Estado, de prestação social. Procuramos enraizar o respeito ao outro, o respeito às pessoas, como seres vivos, o direito à vida em geral. O grande mérito do direito-dever à preservação ambiental consiste em não desenvolver apenas buscas imediatistas, mas, sim a defesa das medidas a longo prazo. Este direito-dever não se encontra circunscrito a um determinado tempo e espaço, está arraigado ao hoje e a tudo aquilo que está por vir”. In MEDEIROS, Fernanda Luiza Fontoura de Medeiros. Meio ambiente: direito e dever fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004, p. 193. 109 OST, François. A natureza a margem da lei: a ecologia à prova do Direito. Lisboa: Piaget, 1995, p.9. 64 indiscriminada. Portanto, pode-se afirmar que a ameaça ao ambiente é questão eminentemente ética e depende de uma alteração de conduta. Singer, sobre o desenvolvimento de uma ética ambiental, esclarece: “A longo prazo, o conjunto de virtudes éticas louvadas e o conjunto de proibições éticas adotadas pela ética das sociedades específicas vão sempre refletir as condições sob as quais elas devem 110 existir e atuar, para que possam sobreviver”. O reconhecimento pelo Estado dos direitos civis e sociais foi decorrente de longas e, muitas vezes, violentas reivindicações populares. Interesses de uma maioria oprimida, fruto de mutações decorrentes do processo de industrialização provocadas pela evolução do Estado Liberal para o Estado Democrático de Direito, tendo como um desses marcos a Revolução Francesa. Não obstante a devastação do ambiente, a poluição e o notório risco para o bem-estar individual e coletivo desse comportamento destrutivo, não houve um movimento capaz de romper com a sobreposição dos interesses econômicos aos ambientais. Diante do crescente abuso da utilização dos recursos naturais e da poluição em todas as suas formas, em grande parte decorrente das consequências do capitalismo, faz-se urgente a redefinição de uma identidade ecológica na forma de um dever de exercício de cidadania. A Constituição Federal de 1988, conhecida globalmente como a Constituição Verde – ganhou esta nomenclatura por ter sido a primeira constituição no mundo a 111 trazer em seu bojo um capítulo próprio reservado ao meio ambiente – evidencia 110 SINGER, Peter. Ética Prática. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 300. 111 O ordenamento jurídico possui farta normatização da tutela ambiental. A legislação ambiental brasileira já havia dado pequenos passos antes de sua vigência, pois já havia editadas normas como Código das Águas (decreto 24.643/34), Patrimônio Histórico e artístico nacional (decreto-lei 25/37), Desapropriação por utilidade pública (Decreto - lei 3.365/40), o Código Florestal (Lei 4.771/65), Estações Ecológicas e áreas de proteção ambiental (Lei 6.902), Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81) Reservas Ecológicas (decreto 89.336/84), mas foi depois das novas diretrizes constitucionais, pautadas pelo movimento ecológico mundial que se passou a normatizar particularmente e sob este novo enfoque a exploração de recursos minerais (Decreto 97.632/89), diversidade biológica (Decretos 2.519/98 e 4.703/2003), camada de ozônio (Decreto 2.738/98), combate a incêndio na Amazônia Legal (Decreto 2.959/99), agrotóxicos (Lei 7.802/89 e Decreto 4.074/2002), poluição das águas (Lei 9.966/00 e Decreto 4.136/2002), unidades de conservação (Decreto 4.340/2002), transgênicos (Decreto 4.680/2003), patrimônio genético (Decreto 5.459/2005), exploração florestal (Decreto 5.975/2006), Mata Atlântica (Lei 11.428/2006 e Decreto 6.660/2008), pesca (Lei 7.679/88), política agrícola (Lei 8.171/91), emissão de poluentes por veículos automotores (Lei 8.723/93), política nacional de recursos hídricos (Lei 9.433/97), crimes ambientais (Lei 9.605/98), política nacional de educação ambiental (Lei 9.795/99), sistema nacional de unidades de conservação da natureza (Lei 9.985), rejeitos radioativos (Lei 10.308/2001), biossegurança (Lei 11.105/2005), gestão de florestas públicas (Lei 11.284/2006) entre outros temas. 65 que existe uma preocupação com a tutela do meio ambiente, não se tratando mais de mera questão ideológica, e sim de uma necessidade real. A constitucionalização das normas ambientais trouxe novas perspectivas 112 ambientais, repelindo o antropocentrismo do passado. Trata-se de avanço, mormente por ter sido uma das causas à produção normativa acima apontada, ainda mais quando estabelece que todos têm direito à vida, sendo-lhes assegurada a sadia qualidade de vida. Tal fato evidencia que a Carta Magna elevou a proteção ambiental a status de direito fundamental, embora não o declare expressamente, de modo que normas infraconstitucionais não são mais capazes de suprimir tal proteção, vez que os direitos fundamentais são considerados cláusulas pétreas. Os modernos modelos constitucionais ambientais buscam a adoção de uma compreensão sistêmica e legalmente autônoma do meio ambiente, com um compromisso ético de não empobrecer a Terra e a sua biodiversidade. A estimulação da atualização do direito de propriedade para adequá-lo à proteção ambiental, a opção por processos decisórios abertos, transparentes, bem- informados e democráticos (devido processo ambiental), e a preocupação com a implementação das normas constitucionais ambientais, proporciona às constituições 113 instrumentos de efetivação. Nesse modelo, a legislação eclodiu depois da promulgação da Carta Magna, passando a regulamentar as matérias mais relevantes sobre o tema ambiental. Essa nova fundamentalidade para o discurso jurídico ambiental, como meta a ser alcançada pelo Estado Socioambiental do Direito, jamais será atingida com a mera elaboração de normas ambientais. Essa não é só uma incumbência do Direito, mister é o encadeamento com outras ciências face a complexas inter-relações com questões econômicas, ambientais, éticas, ecológicas e sociais envolvidas na proteção integral da vida dos seres vivos, presentes e futuros. Esse processo 112 MILARÉ, Edis. In: Direito do Ambiente: doutrina – jurisprudência – glossário, p. 85 explica sobre ao antropocentrismo: é uma concepção genérica que, em síntese, faz do homem o superior, ou seja, a referência máxima e absoluta de valores (verdade, bem, destino último, norma última e definitiva e etc.), de modo que ao redor desse “centro” gravitem todos os demais seres por força de um determinismo fatal. 113 BENJAMIN, Antônio Herman. Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. In Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. José Joaquim Gomes Canotilho e José Rubens Morato Leite (organizadores). São Paulo, Saraiva, 2007, pp. 66-67. 66 114 começa ao se perceber a abrangência do conceito de ambiente que envolve componentes bióticos e abióticos, sociais, econômicos e político-institucionais, assim como do conjunto intersistêmico de relações que o ambiente gera com outros bens e valores, principalmente nas perspectivas de outros conhecimentos. Quando se tratam de questões ambientais, a interdisciplinaridade é fundamental para se descobrir caminhos possíveis na resolução desses problemas, portanto, não é só a ciência jurídica que está voltada para a questão ambiental, grande parte das ciências humanas, exatas e biológicas trata de questões interligadas com o bem ambiental. Assim, a solução para os problemas ambientais, em razão de sua complexidade, passa necessariamente pela maior interação entre as diversas ciências. Diante dessa visão complexa das ciências, percebe-se que o Direito Ambiental pressupõe uma visão de interdisciplinaridade de forma a propiciar a inter- relação entre os conhecimentos na busca de soluções conjuntas e eficazes ao meio ambiente. Segundo Leff, a interdisciplinaridade pode ser definida como um processo de intercâmbio entre diversos campos do conhecimento científico, nos quais uns transferem métodos, conceitos, termos e inclusive corpos teóricos inteiros, que acabam sendo incorporados uns pelos outros, induzindo um processo contraditório de avanço/retrocesso do conhecimento, característico do desenvolvimento das ciências. Arremata o autor: Nessa perspectiva, reconhece-se que os problemas ambientais são sistemas complexos, nos quais intervêm processos de diferentes racionalidades, ordens de materialidade e escalas espaço temporais. A problemática ambiental é o campo privilegiado das inter-relações sociedade- natureza, razão pela qual seu conhecimento demanda uma abordagem holística e um método interdisciplinar que permitam a integração das ciências da natureza e da sociedade; das esferas do ideal e do material, da 115 economia, da tecnologia e da cultura. Nesse mesmo sentido, a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD), realizada em junho de 1992, conhecida como RIO/92, aprovou a Declaração do Rio, que em seu Princípio 9, proclama: “Os 114 LEFF, Enrique. Complexidade, interdisciplinaridade e saber ambiental. In PHILIPPI JR. A. et al. Interdisciplinaridade em Ciências Ambientais. São Paulo: Signus, 2000, p. 31. Explica que hoje o conceito de ambiente se defronta necessariamente com estratégias de globalização e que a reinvenção de novo mundo, conformado por uma diversidade de mundos, pressupõe que se abra o cerco da ordem econômico-ecológica globalizada. 115 Idem, ibidem, p. 21. 67 Estados devem cooperar para reforçar a criação de capacidades endógenas para obter o desenvolvimento sustentável, aumentando o saber mediante o intercâmbio de conhecimentos científicos e tecnológicos, intensificando o desenvolvimento, a adaptação, a difusão e a transferência de tecnologias, notadamente as tecnologias novas e inovadoras”. Sempre que a sociedade se transforma drasticamente, como ocorreu após a Revolução Francesa, com a adoção de um Estado Liberal, é indispensável a mudança de critério de racionalidade epistemológica a ser adotado como estratégia social. Esses novos princípios nascem para harmonizar-se com os interesses legítimos impostos pelo tempo, pois o comportamento humano está em eterna mutação. Esse liberalismo, nascido no século XIX, se consolidou como uma filosofia de progresso econômico e, nesta medida, tem sido apontado como causa da quebra 116 do paradigma, uma vez que a Revolução Industrial representou o início da utilização em grande escala dos recursos naturais, engendrando o capitalismo predatório. 117 Para Capra, o paradigma social é definido como “uma constelação de concepções, de valores, de percepções e de práticas compartilhados por uma comunidade, que dá forma a uma visão particular da realidade, a qual constitui a base da maneira como a comunidade se organiza”. Assim, os critérios adotados pela sociedade atual como forma de viver têm se mostrado em distonia com a 118 sustentabilidade ambiental por adotar práticas totalmente contrárias ao cuidado com o meio natural. Trata-se de um problema global onde há um enfraquecimento da sociedade, dos costumes e do indivíduo rompendo-se com o que foi instituído nos séculos XVII e XVIII como um processo de mutação histórica dos valores, nascedouro de um 116 Edgar Morin explica que no âmbito das ciências sociais, um paradigma deve conter, para todos os discursos realizados em seu âmbito, os conceitos fundamentais e as categorias mestras de inteligibilidade, assim como as relações lógicas existentes entre esses conceitos e categorias, como acontece com a evolução da cientificização da questão vital ambiental. In: MORIN, Edgar. O método 4: as ideias. 3 ed., Porto Alegre, Sulina, 2002. p. 261. 117 CAPRA. Op. cit., 1996, p. 24. 118 FREITAS, Juarez. Sustentabilidade – Direito ao Futuro. Belo Horizonte: Fórum, 2011. 68 119 novo modo de vida: ausência de substância pós-moderna, com a lógica do vazio. A partir no início do século XX, novo contorno toma a sociedade em decorrência da expansão do capitalismo. O Estado descuida-se das questões sociais agravadas pela eclosão da Revolução Industrial. Nesse processo, submete- se o trabalhador a condições desumanas e degradantes sendo conduzidos a se organizarem com o objetivo de resistir à exploração num processo de ruptura com o Estado Liberal. Surge, então, o Estado Social, com as seguintes características: intervenção do Estado na economia, aplicação do princípio da igualdade material e realização da justiça social. Todavia, o Estado Social no moldes delineados, não atende aos anseios democráticos pois que fundamental a conciliação de duas máximas do Estado 120 Contemporâneo: origem popular do poder e prevalência da legalidade . O nascimento do Estado Democrático agrega ao Estado de Direito nova e fundamental diretriz, observa Bobbio: Estado Liberal e estado democrático são interdependentes em dois modos: na direção que vai do liberalismo à democracia, no sentido de que são necessárias certas liberdades para o exercício correto do poder democrático, e na direção oposta que vai da democracia ao liberalismo, no sentido de que é necessário o poder democrático para garantir a existência e a persistência das liberdades fundamentais. Em outras palavras: é pouco provável que um estado não liberal possa assegurar um correto funcionamento da democracia, e de outra parte é pouco provável que um estado não democrático seja capaz de garantiras liberdades 121 fundamentais. O regime democrático garante a participação popular no processo político, estabelece uma sociedade livre, justa e solidária, em que todo o poder emana do povo, respeitando a pluralidade de ideias, culturas e etnias, considerando o princípio da soberania popular como garantia geral dos direitos fundamentais da pessoa humana. A partir da década de 80 do século XX, o homem percebeu seu 119 LIPOVETSKY, Gilles. A era do vazio. São Paulo: Manole, 2005, pp. XV – XXIV. 120 DANTAS, Ivo. Da defesa do Estado e das Instituições Democráticas. Rio de Janeiro: Aide, 1989, p. 27. 121 BOBBIO, Norberto. O Futuro da Democracia – Uma Defesa das Regras do Jogo. Trad. Brasileira de Marco Aurélio Nogueira. 2 ed., Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1986, p. 20. 69 comportamento destrutivo, a esgotabilidade dos recursos naturais, a devastação ocasionada e as consequências de seus atos, pois que surge com a proclamação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 um Estado Democrático Socioambiental de Direito incorporando à agenda nacional a complexa questão ecológica de nível global. Nessa perspectiva, percebe-se que as ciências sociais estão sendo desafiadas a pensar a globalização do mundo, pois defrontam-se com os dilemas que se abrem com as interações transnacionais dos processos e estruturas sociais, econômicos, políticos, culturais etc. As questões não possuem mais um foco local, nacional e regional, visualizam-se novos problemas com a emergência da sociedade global. Rompem-se com as fronteiras geográficas, culturais e civilizatórias e projetam- modificações por todas as direções numa conformatação surpreendente diante desse novo horizonte. Inevitável o desafio posto ao pensamento científico a enfrentar esses inovadores conceitos de uma realidade pouco conhecida, nascendo 122 teorias da globalização a revelar o empenho em explicar o novo mundo que surge num prenúncio do fim do sistema nacional enquanto núcleo central das atividades e estratégias humanas organizadas. 123 Bauman adverte sobre a total inabilidade do ser humano em solver os efeitos oriundos da globalização, que insistentemente quer empregar soluções locais à poluição e resume: “As cidades se tornaram depósitos sanitários de problemas 124 concebidos e gerados globalmente”. A governança global surge como mais um mecanismo capaz de solver os problemas ambientais na medida em que o meio ambiente é caracterizado como patrimônio comum da humanidade. Mister incrementar ações integradas de proteção, com a cooperação de todos os países, o que necessariamente enfraquece a ideia do Estado-Nação como solução em si 122 Ver mais sobre o tema em GIDDENS, Anthony. As consequências da modernidade. São Paulo: UNESP, 1991 e IANNI, Otávio. Teorias da Globalização. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1998. 123 BAUMAN, Zygmunt. Tempos Líquidos. Rio de Janeiro: Zahar, 2007, p. 89. 124 Definição de Governança Global segundo a ONU:“A soma das várias maneiras de indivíduos e instituições, público e privado, administrarem seus assuntos comuns. É um processo contínuo por meio do qual conflito ou interesses diversos podem ser acomodados e a ação cooperativa tem lugar (...) No nível global, Governança era vista primeiramente como sendo apenas as relações intergovernamentais, mas hoje já pode ser entendida como envolvendo organizações não- governamentais, movimentos de cidadãos, corporações multinacionais e o mercado de capitais global.”(Comissão sobre Governança Global da ONU, s/d.) 70 mesma, com a formulação de tratados para a unificação de valores e o consenso da 125 sociedade civil, ganhando força o Direito Ambiental Internacional . A sustentabilidade em nível mundial aparece como grande potencial axiológico a ser reconhecido como nova ordem jurídica. Nesta linha de pensamento completa Capra sobre a inovadora visão carente de seu emergir: A nova visão da realidade, de que vimos falando, baseia-se na consciência do estado de inter-relação e interdependência essencial de todos os fenômenos — físicos, biológicos, psicológicos, sociais e culturais. Essa visão transcende as atuais fronteiras disciplinares e conceituais e será explorada no âmbito de novas instituições. Não existe, no presente momento, uma estrutura bem estabelecida, conceitual ou institucional, que acomode a formulação do novo paradigma, mas as linhas mestras de tal estrutura já estão sendo formuladas por muitos indivíduos, comunidades e organizações que estão desenvolvendo novas formas de pensamentos e 126 que se estabelecem de acordo com novos princípios. Como consequência desses novos critérios de racionalidade, o paradigma que surge é justificado pela necessidade da preservação da vida no planeta. Caminha-se para uma nova era global, uma época de restrição da liberdade abusiva em que tudo se pode e que a natureza está totalmente à disposição. É inevitável uma mudança drástica de postura: Há soluções para os principais problemas de nosso tempo, algumas delas até mesmo simples. Mas requerem uma mudança radical em nossas percepções, no nosso pensamento e nos nossos valores. E, de fato, estamos agora no princípio dessa mudança fundamental de visão do mundo na ciência e na sociedade, uma mudança de paradigma tão radical como o 127 foi a revolução copernicana. O paradigma do direito na atualidade que nasce para combater os novos riscos, inevitavelmente, impõe limitação à liberdade imposta no contexto global 125 A grande celeuma que pende sob esse ramo do Direito é que as Declarações Internacionais sobre Meio Ambiente têm um caráter de “soft-law”, isto é, não são dotadas de um mecanismo de coercibilidade, portanto, cabe aos Estados signatários criarem condições para cumprir os compromissos moralmente assumidos, v.g., Protocolo de Kyoto de 1988. Sobre o tema ver: SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento. Direito Ambiental Internacional. 2a edição. Rio de Janeiro: Thex, 2002; LAGO, André Côrrea. As negociações internacionais ambientais no âmbito das Nações Unidas e a posição brasileira. Cadernos NAE – Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da República. Mudança do Clima, volume I, no03, 2005; SOARES, Guido Fernando Silva. Direito Internacional do Meio Ambiente - Emergências, Obrigações e Responsabilidades. São Paulo: Atlas, 2001. 126 CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. São Paulo: Cultrix, 1982, p. 244. 127 CAPRA. Op. cit., 1996, p. 23. 71 através da busca do desenvolvimento sustentável, visto que novos modos de vidas individuais e coletivos padronizados evoluem no caminho de uma progressiva deterioração global. O Estado parece incapaz de apreender essa problemática e suas implicações econômicas, apesar de já ter tomado ciência do problema, giza-se tardia e incipiente, dos perigos mais evidentes que o ameaçam. Clara a inexistência de 128 uma articulação ético-política nesse complexo mecanismo de transformação social. 129 Guattari é esclarecedor ao afirmar que não haverá uma resposta à crise ecológica enquanto não se operar “uma autêntica revolução política, social e cultural, reorientando os objetivos da produção de bens materiais e imateriais”, a qual deverá se dar, inclusive, aos domínios moleculares de sensibilidade, inteligência e desejo. Diretrizes deverão ser seguidas para a formação de uma postura ética na superação da crise ambiental. Esses primados são denominados pelo Direito de princípios ambientais, os quais se caracterizam por construções teóricas com o objetivo de orientar a formação do direito, mantendo-se uma meta de desenvolvimento base para os operadores do direito. Tais princípios são norteadores da política ambiental e utilizados como elemento harmonizador de conflitos como instrumentos de interpretação do direito ambiental. O princípio da cooperação, utilizado também em outros ramos do direito, é um princípio fundamental, pois se reveste de cunho eminentemente protetivo do meio ambiente, fazendo parte da estrutura do Estado Socioambiental. 130 Derani alerta que tal mandamento objetiva a escolha de prioridades nos processos decisórios pelo Estado em conjunto com a sociedade e é, nesta medida, indissociável de uma postura ética na tomada destas decisões. Não basta decidir cooperativamente, as medidas práticas devem estar em sintonia com a ética ambiental. Tal princípio implica cooperação interna, entre todos os entes federativos, e externa, entre os Estados, exigindo, outrossim, informação e esclarecimento para a adoção de uma política pública ambiental eficiente. Os problemas ambientais são 128 GUATTARI, Felix. As três ecologias. Campinas: Papirus, 2011, p. 8. 129 Idem, ibidem, p. 9. 130 DERANI. Op. cit., 2008, p. 142. 72 globais, por isso a ética ambiental de caráter universal, serve de guia na condução da crise. Outro princípio importante é o da equidade intergeracional, que decorre do princípio da essencialidade, considerando a relevância do meio ambiente para a humanidade e que deve ser preservado não só no interesse das presentes gerações, como também das futuras. Este acordar para uma ética de solidariedade para com os futuros habitantes da Terra é capaz de redimensionar as prioridades da sociedade na busca por uma igualdade de acesso aos recursos naturais. 131 Machado acrescenta que “a equidade no acesso aos recursos ambientais deve ser enfocada não só com relação à localização espacial dos usuários atuais, como em relação aos usuários potenciais das gerações vindouras”. Wolkmer diz que uma nova ética proposta pela preocupação ambiental encontra fundamento na ética da alteridade, que é representativa de uma: ...ética antropológica da solidariedade que parte das necessidades dos segmentos humanos marginalizados e se propõe a gerar uma prática pedagógica libertadora, capaz de emancipar os sujeitos históricos oprimidos, injustiçados, expropriados e excluídos. Por isso uma ética que traduz os valores emancipatórios de novas identidades coletivas que vão firmando e refletindo uma práxis concreta comprometida com a dignidade do “outro”, encontra subsídios não só nas práticas sociais cotidianas e nas necessidades históricas reais, mas igualmente em alguns pressupostos 132 133 epistemológicos da chamada Filosofia da Libertação . A preocupação com as futuras gerações também está inserido no compromisso ético da presente geração. Esta redistribuição intergeracional está expressa na ordem constitucional e nada mais é do que um compromisso jurídico- ético com o futuro da humanidade. O desafio maior é internalizar ao ordenamento 131 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Op. cit., p. 51. 132 Filosofia da libertação trata-se de uma filosofia em particular e não aquela filosofia clássica que fora tradicionalmente européia (Kant, Hegel e Heidegger, bem como seus críticos, dentre os quais Feuerbach, Marx, Kierkegaard,), pois esta não pode servir de base a um pensamento que se pretenda da libertação latino-americana. Parte da oposição do oprimido, do excluído, da cultura massacrada e explorada, trata de mostrar a possibilidade do diálogo a partir da afirmação da alteridade e, ao mesmo tempo, da negatividade, a partir de sua impossibilidade empírica concreta, pelo menos como ponto de partida de que o dominado possa intervir efetivamente não numa argumentação ou numa conversação, mas num diálogo. Sobre o tema ver DUSSEL, Henrique. Filosofia da Libertação: crítica a ideologia. São Paulo: Paulus, 1995; ZEA, Leopoldo. La filosofia actual en América. México: Grijalbo, 1976; BONDY, Salazar. América latina: Filosofía y liberación. Buenos Aires: Bonum, 1974; ROIG, Arturo Andrés. Teoría y crítica del pensamiento latinoamericano. México: Fondo de Cultura Económica, 1981. 133 WOLKMER, Antonio Carlos. Pluralismo jurídico: fundamentos de uma nova cultura no direito. São Paulo: Alfa Omega, 1994, p. 241. 73 jurídico tal princípio, viabilizando um meio ambiente saudável para as futuras gerações em condições semelhantes as que recebeu de seus antepassados, como forma garantidora de vida digna. Claro está, como já abordado, que não se pode exigir exclusividade estatal no alcance de tal primordial meta: garantia ao direito fundamental ao meio ambiente saudável. É também um dever do cidadão, como bem aponta Bello ao discorrer sobre cidadania, pois o mero texto legal não possui o condão de autoaplicabilidade: Apesar de formalmente garantidos constitucional e legislativamente, os diferentes direitos de cidadania não têm sua aplicação assegurada na prática, salvo em condições propícias para a sua conjugação. Portanto, confiar em um suposto caráter automático dos direitos consiste numa perigosa armadilha, pois desta forma importantes conquistas democráticas 134 ficarão restritas ao âmbito dos textos normativos das constituições e leis. Assim, é imprescindível um comportamento ativo para a garantia do bem- estar ambiental, mas para isso é necessário o desenvolvimento de cultura ambientalista com valores ecológicos solidificados. Enquanto essa ideia não for vontade da maioria, não haverá alteração de paradigma, permanecendo a vontade exclusiva de uma norma sem efetividade, criada por um Estado incapaz de lutar adequadamente contra a escalada de riscos. O texto constitucional consagra o princípio da cooperação também na seara ambiental ao prescrever atuação conjunta na escolha de prioridades e de processos decisórios de política ambiental, bem como o equilíbrio entre a liberdade individual e necessidade social. Pode-se afirmar, então, que tal princípio resulta de uma divisão de funções dentro da ordem econômica para a adequação entre os interesses mais significativos, sendo orientador do desenvolvimento político. Essa nova tarefa do Estado, para ser efetivamente executada, não pode ser mais vista com olhar antropocêntrico. O conduzir dos atos estatais deve levar em consideração o meio ambiente, porque este é a base natural da vida. Pode parecer um encargo demasiado ao Estado, mas somente ele possui o monopólio do poder, apenas ele dispõe de meios de força coercitiva para fazer cumprir metas. Em princípio, nenhuma esfera da vida social se encontra isenta da interferência estatal, embora não signifique que o Estado tenha de intervir ou regular tudo. Significa, no entanto, que é prerrogativa do Estado definir as áreas em que 134 BELLO. Op. cit., [S.n.]. 74 irá ou não intervir, conforme o interesse público. Bobbio esclarece que o Estado tem a possibilidade de comandar de forma imperativa em toda a esfera de ação dos membros do grupo social, direcionando para o fim pretendido ou, ainda, dissuadindo-o de um fim não desejado através do ordenamento jurídico. Esse poder é caracterizado pela universalidade, definindo o autor como a “capacidade que têm os detentores do poder político, e só eles, de tomar decisões apropriadas e efetivas para toda a comunidade no que toca à distribuição e destino dos recursos não 135 apenas econômicos”. Salienta-se que o Estado, além de ter traçado seus deveres ambientais, possui a capacidade de impor, de forma legítima, os objetivos determinados pelo texto constitucional, até mesmo com o uso da força, se necessário. É o que esclarece Weber: O poder punitivo estatal consiste na capacidade do Estado de criar e aplicar punições, por meios legítimos, voltadas para a consecução de objetivos sociais. Trata-se de uma das manifestações mais severas de intervenção estatal. Reflete diretamente a noção weberiana de do Estado como detentor do monopólio do uso legítimo da força sendo uma manifestação da própria 136 soberania. Não obstante tamanho poder, o Estado depende da cooperação dos indivíduos e estes precisam estar conscientes do novo panorama constitucional compreendido como um Estado Socioambiental de Direito. Esta cooperação Estado/indivíduo exige metas de proteção ambiental para se assegurar o bem comum, mesmo que isso implique em restrições a interesses individuais. Outro ponto é saber qual o limite da ação do Estado na defesa do meio ambiente e qual sua relação com o bem estar do homem. O mínimo existencial ecológico surge como um critério limitador entre o desenvolvimento econômico e o bem estar humano em seu meio natural, vislumbrando-se o respeito aos princípios 137 da dignidade da pessoa humana e da segurança jurídica. Sabe-se que os recursos naturais não são infindáveis, nem sempre a 135 BOBBIO, Norberto. O significado da política. In: BOBBIO, Norberto. Curso de introdução à ciência política. Brasília: UnB, 1984, p. 10. 136 WEBER, Max. Ensaios de sociologia. 5 ed. Rio de Janeiro: Guanabara, 1982, p. 98. 137 Sobre o tema SARLET, Ingo Wolfgang. Estado socioambiental e mínimo existencial (ecológico?): algumas aproximações. In: Estado Socioambiental e Direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. E MOLINARO, Carlos Alberto. Direito Ambiental: proibição de retrocesso. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. 75 degradação é recuperável e que, possivelmente, o espaço físico será utilizado pelas gerações futuras. Eis a razão para proteger e preservar. Alerta Kloepfer que a tarefa do Estado deve ir muito além do agora, pois é patrono decisivo do futuro. Pondera, ainda, o limite de atuação do Estado na sua tarefa de proteção ambiental esclarecendo: Uma proteção do meio ambiente não juridicamente determinada, todavia, aumentaria o risco de decisões arbitrárias em atividades relativas ao meio ambiente e, no final das contas, destruiria o sistema político da democracia libertária do Estado de direito. É preciso impedir essa evolução, porque a qualidade da vida não é determinada apenas por um meio ambiente digno, 138 mas também por um sistema político humano. Os agentes políticos que atuam como servidores estatais também são cidadãos, razão por que é primordial a conscientização da complexidade da problemática ambiental na condução das políticas públicas voltadas à tutela ambiental. Eles não devem apenas refletir como administradores, mas também como indivíduos detentores de uma consciência ecológica. 138 KLOEPFER. Op. cit., p. 72. 76 2.2 Políticas Públicas Ambientais, economia e direito: um diálogo necessário Conforme já abordado, a perspectiva interdisciplinar é fundamental para o estudo da Ciência do Direito, principalmente na seara ambiental. Indispensável uma compreensão integrada do Direito com outros campos de conhecimento e, indiscutivelmente, a simbiose com a Economia para entender e superar a crise ambiental por ela potencializada. A efetividade de um instrumento jurídico de intervenção do Estado na Economia remete à relação entre estrutura de um modelo e o objetivo que se pretende com ele atingir. Jansen esclarece que esse mecanismo consiste no problema do alinhamento entre a estrutura de um instituto e sua função reguladora 139 efetiva. Todavia, essa integração ou apropriação do saber econômico não pode perder seu cunho jurídico, que deverá ter dimensão preponderante. As questões do Direito Ambiental possuem viés econômico e negligenciar esse recorte representa uma dissociação dos elementos da realidade. A noção de ordem econômica tem proximidade com a ideia da existência de uma ordem social natural, possuidora de uma lógica auto-ordenadora da dimensão 140 econômica da sociedade. O paradigma é a noção da “mão invisível” de Adam Smith, ideia que é motivo de debate econômico e político nas sociedades ocidentais, estando no centro da própria discussão sobre o significado ou a necessidade da intervenção estatal na economia. Destaca-se, dessa forma, a dependência estrutural que a Economia tem com o Direito e a dificuldade de tratar a ordem econômica sem considerar seu sentido normativo. A simbiose entre Direito e Economia é tratada por Grau: ... o direito (...) é elemento constitutivo do modo de produção: as relações de produção, quaisquer que sejam elas, não se podem reproduzir sem a "forma" direito; o direito é instância de um todo complexo, a estrutura social global, instância no entanto dotada de eficácia própria, que se manifesta no bojo de uma relação de causalidade estrutural, resultante de interação dela (instância jurídica) com as demais instâncias desse todo complexo. A ideia 141 fundamental é o direito como parte constitutiva do modo de produção. 139 JANSEN, Letácio. Introdução à Economia Jurídica. Rio de Janeiro, Lúmen Júris, 2003, p. 18. 140 Este conceito de “mão invisível” foi baseado em uma expressão francesa, “laissez faire”, que significa que o governo deveria deixar o mercado e os indivíduos livres para lidar com seus próprios assuntos. 141 GRAU, Ero Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 70. 77 Segundo informa Nusdeo, a própria etimologia da palavra economia (oikos + nomos, onde oikos pode ser entendido como casa e nomos como norma ou normatização) põe em destaque essa relação. Destaca o autor, após citar Carnelutti (quanto piú economia, piú diritto), que: “Mais do que íntima relação, trata-se na verdade, de uma profunda imbricação, pois os fatos econômicos são o que são e se apresentam de uma determinada maneira em função direta de como se dá a organização ou normatização - nomos - a presidir a atividade desenvolvida na oikos 142 ou num dado espaço físico ao qual ela possa se assimilar”. Marx já enfatizava que a realidade econômica faz surgir a realidade política e jurídica de uma determinada sociedade. Nas palavras do pensador: Na produção social da própria vida, os homens contraem relações determinadas, necessárias e independentes de sua vontade, relações de produção estas que correspondem a uma etapa determinada de desenvolvimento de suas forças produtivas materiais. A totalidade destas relações de produção forma a estrutura econômica da sociedade, a base real sobre a qual se levanta uma superestrutura jurídica e política, e à qual correspondem formas sociais determinadas de consciência. O modo de produção da vida material condiciona o processo em geral da vida social, 143 político e espiritual. Todo o desenvolvimento normativo de uma sociedade está intimamente ligado às relações de ordem econômica, portanto, os fatores econômicos determinam o surgimento de uma superestrutura composta por medidas políticas e jurídicas. Ao Direito caberá estabelecer os limites nos quais se dará a interferência estatal naquelas áreas da atividade humana que, de forma positiva ou negativa, se desenvolvem continuamente. A organização da atividade econômica pode adquirir diferentes configurações, pois sua ordenação está sujeita à normatização estatal. 144 Esse conjunto normativo pode ser compreendido como ordem jurídica econômica. Assim, é necessário um conjunto de parâmetros normativos para que se estabilizem minimamente as relações e as expectativas ambientais. 142 NUSDEO, Fábio. Curso de Economia. Introdução ao direito econômico. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, pp. 29-30. 143 MARX, Karl. Para a Crítica da Economia Política. Trad. Edgar Malagodi. Coleção Os Pensadores. 2. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1978, pp. 129-130. 144 “A ordem econômica representa… o conjunto de normas que define, institucionalmente, um determinado modo de produção econômica. Assim, a ordem econômica, parcela da ordem jurídica (mundo do dever-ser), não é senão o conjunto de normas que institucionaliza uma determinada ordem econômica (mundo do ser).” Eros Grau in GRAU. Op. cit., p. 70. 78 A situação de vulnerabilidade existencial do homem, proveniente do progressivo processo de degradação ecológica exige, além de um comportamento responsável de toda a coletividade, a adoção de um papel intervencionista pelo Estado. Este deve envidar esforços na implantação de políticas públicas eficazes à manutenção de um ambiente saudável, considerando a ordem do texto constitucional. Nessa perspectiva, a atuação estatal, a um só tempo, assenta sua legitimidade sobre o direito e provoca significativos impactos neste, impulsionando, em inúmeros casos, alterações de ordem legislativa. De modo similar, políticas públicas ambientais coerentes e exequíveis não podem ignorar os fundamentos da economia, assim como ações econômicas que pensem adequadamente o desenvolvimento não podem olvidar a necessidade de proteção dos recursos naturais. A área da política pública consolidou-se com um corpus teórico próprio em 145 meados do século passado, momento em que se formou um instrumental analítico útil para a compreensão dos fenômenos de natureza político-administrativa. Inaugura-se, então, a elucidação dos sentidos que a palavra política pode ser tomada. Um primeiro conceito está relacionado a Politics, que na concepção de Bobbio representa a atividade humana ligada à obtenção e manutenção dos recursos necessários para o exercício do poder sobre o homem. O segundo é expresso pelo termo Policy, caracterizado por uma dimensão mais concreta e 146 relacionada a orientações para a decisão e ação. A expressão política pública, como linguagem técnica, representa o segundo sentido explicitado acima, ou seja, trata do conteúdo concreto e do conteúdo simbólico de decisões políticas, assim como do processo de construção e atuação dessas decisões; portanto, corresponde a uma diretriz elaborada para enfrentar um problema público, no caso em estudo, um problema público ambiental. 145 Embora já na década de 1930 aparecessem contribuições teóricas da análise racional das políticas, foi em 1951 que duas obras foram publicadas: o livro de David B. Truman, The governmental process (1951), pioneiro sobre os processos de políticas públicas no Executivo, Legislativo e Judiciário bem como na administração pública e o livro de Daniel Lerner e Harold D. Lasswell, The policy sciences (1951) em que destaca em capítulo específico a formulação e avaliação dos impactos das políticas públicas. 146 BOBBIO, N. Política. In BOBBIO, N; MATEUCCI, N.: PASQUINI, G. Dicionário de Política. 12 ed. Brasília: UnB, 2002. V.2. 79 Uma política pública possui dois elementos fundamentais: intencionalidade pública e resposta a um problema público. Assim sendo, a razão para o estabelecimento de uma política pública é a resolução de uma questão considerada de interesse coletivo e de cunho relevante. Na literatura especializada não há um consenso definitivo sobre uma definição de política pública, pois há divergência sobre diversos pontos, como a titularidade do poder de sua elaboração, na medida em que para alguns teóricos não caberia tal tarefa apenas aos órgãos estatais, estendendo-se também aos particulares. Percebe-se que a atual função estatal não tem sido eficiente no desempenho de seu papel, ou seja, resolver os problemas coletivos por meio de políticas públicas, mormente na seara ambiental, embora detenha o monopólio do uso da força legítima e o controle dos recursos nacionais. No tangente à possibilidade de ser considerada a omissão como uma política pública, cabe destacar não ser possível, uma vez que o conceito denota uma ação, um fazer, uma diretriz intencional, seja uma lei, uma rotina administrativa ou uma decisão judicial. O não agir governamental frente a um problema coletivo não constitui uma política pública mesmo que o problema se resolva por razões alheias. Por fim, a doutrina esclarece que todos os níveis de operacionalização das políticas públicas, sejam elas de diretrizes estruturantes, de nível intermediário ou operacional, são consideradas como tal. Dessa forma, uma política pública pode ser de titularidade pública ou privada, necessariamente de caráter comissivo e de operacionalização em todas as esferas. Políticas públicas são ações desencadeadas pelo Estado, no caso brasileiro, nas escalas federal, estadual e municipal, com vistas ao bem coletivo. Elas podem ser desenvolvidas em parcerias com organizações não governamentais e, como se verifica mais recentemente, com a iniciativa privada e devem decorrer da necessidade de participação social em sua efetivação, objetivando a orientação dos programas de governo relacionados à resolução de problemas sociais. A tarefa de conceituar políticas públicas envolve certa complexidade em sua dinâmica de operacionalização, é mister analisar todo o processo, desde o surgimento da ideia até sua efetivação, resultando numa ação pública fadada a uma ação pública efetiva. As políticas públicas permitem romper com as barreiras que separam a administração pública da sociedade, que passa a participar da 80 147 concepção à implementação do programa de governo. Entende-se que o atual constitucionalismo, além de traçar rumos aos 148 modelos de Estado e ao modelo de administração, inaugura os “novos direitos”, denominados direitos socioambientais, e que, portanto, exige a adoção de novas políticas públicas para o Estado e a coletividade. Nas últimas décadas houve a implementação de leis e orientação para políticas públicas relacionadas à administração pública, em um primeiro momento, voltadas à área dos direitos políticos e, posteriormente, aos direitos sociais, especialmente na fase da elaboração da atual Constituição e, por fim, aos direitos culturais, ligados ao tema da justiça e da equidade social. Sinala-se que os novos direitos estão umbilicalmente ligados às necessidades humanas essenciais de cada época e que, por seu turno, estão em constante evolução, exigindo a criação de espaço dentro do contexto histórico para a múltipla gama de direitos emergenciais. São justamente essas situações de carência as razões geradoras da possibilidade 149 dos novos direitos. As políticas públicas ambientais têm como princípios fundamentais os alicerçados na precaução e prevenção de eventos nocivos à civilização, que devem estar avalizadas por uma avaliação ambiental estratégica, entendida como a análise dos impactos ambientais e socioeconômicos com o escopo de promover o desenvolvimento sustentável em seus pilares ambiental, social e econômico. Pode-se afirmar, então, que a Carta Magna e a Lei Nacional de Políticas 150 Ambientais adotaram expressamente o princípio do desenvolvimento sustentável, 147 BUCCI, Maria Paula Dallari. Direito administrativo e políticas públicas. São Paulo: Saraiva, 2002, passim. 148 Bobbio explicita os Novos Direitos como resultado de uma multiplicação de Direitos em consequência de três fatores de propulsão: o aumento da quantidade de Bens considerados merecedores de Tutela; a extensão da titularidade de certos Direitos típicos a outros sujeitos que não o Homem; e, a consideração do Homem não mais como ente genérico ou “em abstrato”, mas sim na concretude das maneiras de ele ser em Sociedade. In BOBBIO. Op. cit., 2004, p. 68. 149 GOHN, Maria da Glória. O Protagonismo da Sociedade Civil: movimentos sociais, ONGS e redes solidárias. São Paulo: Cortez, 2005. 150 De fato, na década de 1980, com a publicação do Relatório Brundtland e a posterior positivação do princípio do desenvolvimento sustentável no arcabouço jurídico nacional, através da sobredita Lei nº 6.938/81, as diretrizes para formulação de políticas públicas, de um modo geral, passaram a ser pautadas sob a égide da questão ambiental, sendo este, inclusive, um dos objetivos do referido Diploma legal: A política nacional do meio ambiente tem por objetivo a harmonização do meio ambiente com o desenvolvimento socioeconômico (desenvolvimento sustentável). Essa harmonização consiste na conciliação da proteção ao meio ambiente, de um lado, e a garantia de desenvolvimento socioeconômico, de outro, visando assegurar condições necessárias ao progresso industrial, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida 81 ao dispor ser a defesa do meio ambiente um dos princípios gerais da atividade econômica (art. 170, VI da CF). Assim, há um dever de tutela do meio ambiente ao se exercer uma determinada atividade econômica. Veja-se o que diz Derani sobre o assunto: A realização do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado pressupõe a obediência ao princípio da defesa do meio ambiente nas atividades econômicas. Sendo um direito fundamental a ser construído na atividade social, somente a atividade social – por conseguinte a atividade econômica – que contemple o princípio da defesa do meio ambiente poderá concretizá-lo. Assim, será conforme o direito aquela atividade que no seu desenvolvimento orienta-se na defesa do meio ambiente e, deste modo, contribui na concretização do direito fundamental social ao meio ambiente 151 ecologicamente equilibrado. Para alcançar tal desiderato, é mister um projeto político-jurídico que implique em uma modificação de status, da passagem do Estado de Direito para Estado Socioambiental de Direito, onde se incluirá em um mesmo compasso a tutela dos direitos sociais, econômicos, culturais e ambientais para o desenvolvimento humano sustentável como corolário de um constitucionalismo socioambiental. O desenvolvimento sustentável requer a elaboração de um sistema social que garanta emprego, segurança social, erradicação da miséria e do preconceito e respeito para com outras culturas, pois o que se busca, ao final, é a construção de uma sociedade mais justa e equilibrada com uma visão global dos problemas e não meramente locais. Lembra Dahl que a maioria dos países não tem consciência das implicações totais do mercado global, estando apanhados entre interesses irreconciliáveis nas suas sociedades. As economias restam ainda administradas numa base nacional, enquanto a sociedade se move para um sistema mundial. Torna-se indispensável reconhecer o princípio essencial da unidade da humanidade e do ideal da cidadania do mundo, o estabelecimento do eco global, incluindo 152 prioridades sociais e econômicas. Questão tormentosa surge quando o desenvolvimento econômico esbarra na proteção ambiental. A solução apontada é desenvolver-se sustentavelmente, crescer atento às futuras gerações, preservar a natureza ao máximo e usufruí-la o mínimo humana (Art. 2º da Lei n. 6.938/81). 151 DERANI, Op. cit, 1998, p. 100. 152 DAHL, Arthur Lyon. O princípio ecológico, ecologia e economia em simbiose. Lisboa: Piaget, 1996, pp. 35-36; pp. 252- 253. 82 através de políticas públicas eficazes e cooperação da sociedade civil fixada num único caminho: crescer atenta ao meio ambiente. Assim, o Estado Socioambiental deve ter como tarefa a incolumidade do meio ambiente e, com base nisso, pautar suas decisões, para tanto, é inquestionável uma transformação em termos políticos e econômicos no caminho de um projeto ambiental. Afigura-se fundamental uma compreensão da questão, posta a partir de um pensamento sistemático, que leve em conta a interdependência do direito e economia à adoção de políticas públicas ambientais, isto não significa que o direito assume, ao menos na perspectiva atual, uma posição de mera subserviência aos interesses econômicos. A propósito, a Constituição Federal ao tratar da Ordem Econômica e Financeira impõe, v. g., a observância dos direitos do consumidor, a defesa do ambiente e o cumprimento da função social da propriedade. Nessa perspectiva, toda e qualquer política pública de cunho ecológico precisa estar em consonância com o ordenamento jurídico, notadamente a Constituição, bem como evitar prejuízos injustificáveis à produção econômica. As políticas públicas podem incidir sobre um quase infindável espectro de objetos de ação, todos interligados. Incluem-se, além dos aspectos ambientais, questões de ordem econômica, social, ética e inúmeras outras. Esclarecedoras as ponderações de Schimidt: O termo política pública é utilizado com significados distintos, com uma abrangência maior ou menor: ora indica um campo de atividade, ora um propósito político bem concreto, ou um programa de ação ou os resultados obtidos por um programa. [...] em uma política há sempre uma teia de decisões e ações que alocam (implementam) valores; uma instância que, uma vez constituída, vai conformando o contexto no qual as decisões futuras serão tomadas; e, mais do que uma única decisão, o envolvimento 153 de uma teia de decisões e o desenvolvimento de ações no tempo. A partir dessas considerações, políticas públicas ambientais representam um conjunto de desígnios e instrumentos de ação de que dispõe o Poder Público para produzir efeitos benéficos sobre o meio ambiente. Toda e qualquer política pública ambiental deve integrar os eixos econômico, político/institucional. Ademais, a consecução do fim perseguido pode ocorrer por meio de políticas públicas explícitas 153 SCHMIDT, João Pedro. Para entender as políticas públicas: aspectos conceituais e metodológicos. In: Reis, J. R. dos; Leal, R.G (Org). Direitos sociais e políticas públicas: desafios contemporâneos. Santa Cruz do Sul: Edunisc, 2008. Tomo 8, pp. 2311-2312. 83 ou implícitas. As primeiras – eixo econômico – são direcionadas diretamente para a tutela ambiental, como, por exemplo, a regulamentação dos limites de poluição toleráveis para determinado segmento industrial. A segunda – eixo político/institucional –, por sua vez, não é voltada diretamente à proteção do ambiente, porém produz efeitos desejáveis neste âmbito. Exemplo cristalino é a educação, que amplia os horizontes dos cidadãos, tornando-os mais sensíveis e conscientes da sua parcela de responsabilidade no tocante à salvaguarda dos processos ecológicos essenciais. Também o investimento em ciência e tecnologia, historicamente renegado no Brasil, traz benefícios ao bem coletivo: a integridade ambiental, sendo igualmente um bom exemplo de instrumento implícito de política pública ambiental. Hodiernamente, a busca por políticas públicas ambientais eficazes depende largamente de um processo de racionalização das incertezas, guiado pela noção de risco. Com efeito, a grande magnitude e a constante irreversibilidade dos danos ambientais exigem do Poder Público o compromisso efetivo de atuar no gerenciamento dos riscos. Quanto ao tema, traz-se à baila, novamente, a contribuição do sociólogo alemão Beck, o qual explica que a invisibilidade dos perigos e a inviabilidade de conhecê-los a fundo é característica marcante do que denomina de “sociedade de risco”. Pontua, ademais, que os riscos são frutos de decisões racionalizadas e, por conseguinte, estão invariavelmente conectados com 154 ações humanas voltadas para o futuro. A partir desta compreensão, verifica-se a necessidade de uma adequação das políticas públicas no sentido de minimizar as possibilidades de dano ambiental, embora se reconheça a existência de grandes dificuldades para tanto, em razão da impossibilidade, em muitos casos, de mensuração dos riscos ecológicos. Os mecanismos de políticas ambientais voltados ao controle e gerenciamentos dos riscos, entre os quais destacam-se as regulações e autorizações administrativas, o licenciamento ambiental e o exercício do poder de polícia administrativo provocaram relevantes impactos nos âmbitos jurídico e econômico. A Constituição Federal, em seu art. 225, §1º, incorporou uma série de deveres de proteção ambiental do Estado, reconhecendo o caráter vital da 154 BECK. Op. cit., 1998. 84 segurança do ambiente para garantir uma vida digna aos seus cidadãos. Os poderes estatais encontram-se adstritos a atuar positivamente no sentido de eliminar barreiras de origem econômica que impeçam a fruição do direito fundamental ao ambiente ecologicamente equilibrado. A respeito da cogente adoção de políticas públicas ambientais pelo Estado como consequência dos imperativos de tutela previstos no dispositivo constitucional supramencionado, Sarlet e Fensterseifer asseveram que: No caso da proteção ambiental, como expressão mais específica dos deveres de proteção do Estado, além da elaboração de legislação versando sobre a tutela ambiental, pode-se citar a adoção de medidas de controle e fiscalização das ações poluidoras do ambiente, a criação de unidades de conservação, a criação e estruturação de órgãos públicos destinados à tutela ecológica e até mesmo campanhas públicas de educação e conscientização ambiental, além de outras medidas que objetivem a 155 efetividade do direito em questão. O excerto acima evidencia a umbilical ligação entre direito e políticas públicas. A necessidade imposta ao direito de acompanhar a rapidez com que se estabelecem as relações sociais contemporâneas o compele a assumir novas feições e tarefas quase que constantemente, embora muitas vezes ele não alcance a velocidade desejada. Noutras, porém, é o próprio direito que veste uma roupagem vanguardista, servindo como indutor de novas políticas públicas e afastando óbices econômicos e sociais à concretização da dignidade humana. Como a eloquente deterioração da qualidade de vida em razão da destruição ecológica exigiu uma articulação entre as políticas públicas ambientais e o direito, também fez irromper um novo paradigma na seara da economia política, voltado essencialmente para a edificação de um modelo sustentável de desenvolvimento e capaz de ensejar uma nova racionalidade produtiva. Com efeito, as tensões entre crescimento, distribuição e conservação ganham novos significados a partir da introdução de critérios qualitativos de desenvolvimento, que incluem a dimensão ambiental como um aspecto indissociável da qualidade de vida. Nessa senda, Leff ensina que: A produção e distribuição de riqueza neste novo paradigma produtivo dependeria das formas de acesso, propriedade e apropriação dos recursos, 155 SARLET, Ingo Wolfgang; FENSTERSEIFER, Tiago. Direito Constitucional ambiental. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 183. 85 assim como da inovação nas formas alternativas de produção e consumo. Esta avaliação requer a produção de novos indicadores sociais e ambientais, um levantamento das contas patrimoniais dos recursos potenciais de uma região ou uma comunidade, a análise da distribuição social dos custos e benefícios ambientais de estratégias alternativas de aproveitamento dos recursos e a ponderação da contribuição do meio físico e humano ao desenvolvimento das forças produtivas, assim como a 156 distribuição da riqueza social. Todavia, o autor alerta logo a seguir que as dificuldades teóricas e práticas para a execução dessa tarefa fazem com que ela seja substituída por avaliações de impacto ambiental, que frequentemente escamoteiam critérios socioambientais para 157 justificar a tomada de decisões. Cresce a importância da participação direta da sociedade nas instâncias decisórias, a fim de se buscar critérios de utilização mais racionais e de distribuição equânime dos recursos naturais. Com efeito, a preservação do equilíbrio ecológico só é possível se estiver consubstanciada em uma gestão participativa dos bens ambientais, sendo nitidamente insuficientes discussões que tenham por objetivo tão somente uma quantificação econômica dos recursos provenientes da natureza. O diálogo entre economia e políticas públicas cresce ainda mais em essencialidade nos assim chamados países subdesenvolvidos, onde o Estado assume o papel de grande indutor do desenvolvimento e de maior responsável por planificar de que modo isso deva ocorrer. Tal circunstância reflete forçosamente no âmbito das possibilidades de um modelo de crescimento econômico atrelado a melhorias sociais e ambientais. Na visão de Derani sobre o desenvolvimento sustentável, a proposta voltada à satisfação das necessidades de todos os atores sociais, mediante a diminuição dos níveis de consumo “é apenas um modelo de discurso apaixonante que se esgota 158 nas palavras do interlocutor”, já que a produção capitalista exige, ao revés, a expansão do consumo. A autora prossegue defendendo que: Os apelos dos cientistas às modificações sem precedentes operadas pelos homens nos sistemas ecológicos só serão incorporados em políticas ambientais ou econômicas ou sociais – como se as quiser chamar – à medida que se consiga refletir este limite ecológico como limite social. Isto 156 LEFF, Enrique. Ecologia, capital e cultura: a territorialização da racionalidade ambiental. Rio de Janeiro: Vozes, 2009, p. 174. 157 Idem, ibidem, p. 174. 158 DERANI. Op. cit, 2008, p. 136. 86 é, como barreira ao desenvolvimento das atividades sociais até o momento 159 empreendidas. Uma vez que a retórica prevalecente tanto nas ideologias liberais quanto nas socialistas, que sempre enxergou o ambiente sob um prisma funcionalizado ao sistema econômico, urge a necessidade de adoção de políticas públicas na perspectiva da desmistificação da relação entre crescimento econômico e desenvolvimento. Como observa Sen: Vivemos em um mundo de opulência sem precedentes [...], entretanto, vivemos igualmente em um mundo de privação, destituição e opressão extraordinárias. Existem problemas novos convivendo com antigos – a persistência da pobreza e de necessidades essenciais não satisfeitas, fomes coletivas e fome crônica muito disseminadas, violação de liberdades políticas elementares e de liberdades formais básicas, ampla negligência diante dos interesses e da condição de agente das mulheres e ameaças cada vez mais graves ao nosso meio ambiente e à sustentabilidade de 160 nossa vida econômica e social. Os efeitos sociais positivos da relação dialética entre políticas públicas ambientais, economia e direito não prescindem da noção de que todos estes elementos não são mais que mecanismos destinados à melhoria da qualidade de vida, devendo, por conseguinte, estarem obrigatoriamente vinculados aos valores constitucionais. No que concerne à infraestrutura e desenvolvimento, todavia, vários problemas são detectados. Primeiramente, sinalam-se as grandes dificuldades no sistema de comando e controle na gestão de recursos ambientais, que é agravado pela falta de informações sobre a extensão e a relevância dos problemas resultantes da degradação ambiental. Existem graves problemas de fiscalização devidos, principalmente, à escassez de recursos humanos e financeiros. Ademais, o excesso de rigidez do sistema de normas atualmente vigente, que restringe a flexibilidade das ações dos gestores ambientais, tornando-as muito pouco efetivas na criação de estímulos aos 161 agentes sociais para que adotem práticas mais adequadas ao ambiente. 159 Idem, pp. 144-145. 160 SEN, Amartya. Desenvolvimento como liberdade. Trad. Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das letras, 2010, p. 9. 161 FRICKMAN YOUNG, Carlos Eduardo et all. Política Ambiental. In Economia do Meio Ambiente: teoria e Prática. Organizadores: Peter May, Maria Cecília Lustosa e Valéria da Vinha. Rio de 87 A infraestrutura nacional necessita ser aprimorada, principalmente no campo do controle de poluição e degradação no meio ambiente natural, bem como na consolidação do Estado de Direito Ambiental. Trata-se de alguns dos maiores 162 desafios contemporâneos. Nessa tarefa, Irigaray aponta como um grande desafio brasileiro o de aumentar o nível de implementação das normas nacionais, em especial do Código Florestal. Adverte, ainda, para a posição dúbia do governo brasileiro na problemática ambiental que: “De um lado, apresenta ambicioso plano para reduzir as emissões de carbono e, de outro lado, não parece determinado a exercer uma política ambiental eficaz, mantendo um orçamento pífio para os órgãos ambientais enquanto aposta 163 em obras altamente impactantes [...]”. Para o autor, tal contradição se reflete na desestruturação dos órgãos ambientais e na ausência de vontade política para implementar uma gestão eficiente do meio ambiente. Nesse particular, infere que tal gestão demanda a (re) estruturação jurídica do atual sistema de gestão ambiental, a fim de que se compatibilize o “emprego de instrumentos econômicos com a previsão de sanções e procedimentos eficazes para a reparação e compensação de danos causados ao 164 meio ambiente”. Portanto, os princípios contemplados no texto constitucional servem como verdadeiras balizas não apenas na atuação do poder público, como também do setor empresarial e da sociedade em geral, em especial, considerando que se trata de direito fundamental da pessoa humana o meio ambiente ecologicamente equilibrado. A sustentabilidade deve emergir como matriz vinculante da atuação estatal e da coletividade, de forma que se consagre a adoção de um novo paradigma apto a assegurar o direito fundamental ao ambiente limpo e saudável, qual seja, o Estado de Direito Ambiental. As exposições precedentes evidenciaram quão antigas são a devastação do Janeiro: Elsevier, 2003. p. 151. 162 BARROS, Ana Flávia Granja e. O Brasil na governança das grandes questões ambientais contemporâneas. Textos para Discussão CEPAL-IPEA, n. 40. Brasília: CEPAL, Escritório no Brasil/IPEA, 2011, p. 10. 163 IRIGARAY, Carlos Teodoro J. Hugueney. A transição para uma economia verde no direito brasileiro: perspectivas e desafios. In: GRAMKOW, Camila L.; PRADO, Paulo Gustavo (coord). Política Ambiental – Economia verde: desafios e oportunidade. N. 8, jun. 2011. Belo Horizonte: Conservação Internacional, 2011, p. 166. 164 Idem, ibidem, p. 167. 88 meio ambiente e, concomitantemente, a preocupação global, ainda que tímida e 165 ineficaz, com a proteção das bases naturais da vida. O comportamento humano destrutivo demanda por parte do Estado uma reação correspondente: uma política pública ambiental adequadamente planejada, com a utilização de instrumental eficiente que atue de modo a assegurar os valores fundamentais da Constituição Federal. Esse instrumental exige um diálogo interdisciplinar com as ciências econômicas, jurídicas, sociais e naturais muito mais intenso que o praticado até então, prospectando uma análise dos efeitos do agir humano para o futuro. Notório que o homem precisa utilizar-se dos recursos naturais, mas ao mesmo tempo depende inteiramente dele para garantir padrões dignos de vida. Com efeito, o crescimento econômico tem se mostrado o maior obstáculo a uma salutar gestão ambiental e, nesse tocante, não é supérfluo ressaltar, uma vez mais, que a economia precisa respeitar as fronteiras ecológicas. Da mesma forma, porém, não se pode relegar socialmente a importância da economia a pretexto de se garantir a proteção ambiental. Decisiva a utilização dos instrumentos jurídicos de tutela ambiental, com o escopo de aliviar as tensões do crescimento econômico e a conservação dos recursos naturais. Por conseguinte, deve-se evitar na formatação das políticas públicas ambientais qualquer forma de hierarquização prévia quanto aos três grandes pilares do desenvolvimento sustentável: o social, o econômico e o ambiental. Cumpre reforçar que as políticas públicas ambientais devem estar consubstanciadas em uma acurada análise dos riscos inerentes à sociedade contemporânea, a qual se notabiliza pela complexidade das relações sociais e por 165 “Por isso, o desenvolvimento sustentável e a cooperação internacional não são soluções fáceis, porque hoje o compromisso deve ser global e não se pode esperar que os Estados-nação e as corporações econômicas, principais personagens do cenário internacional atual, assumam iniciativas coerentes neste sentido. Para gerar políticas e estratégias em condições de impedir a catástrofe ecológica global é necessário construir os consensos e as organizações globais que os viabilizem. Do ponto de vista do ambientalismo, o aspecto mais forte da Conferência do Rio de Janeiro [ECO 92] não foram acordos assinados pelos governos, mas precisamente a emergência germinal de uma sociedade civil planetária, expressada na constituição de um espaço público comunicativo onde se encontraram as diversas dimensões que compõem o ambientalismo, com raízes tanto no Sul quanto no Norte, no Leste como no Oeste, e pertencentes tanto ao sistema político como aos sistemas social e econômico.” LEIS, Héctor Ricardo. Ambientalismo: um projeto realista-utópico para a política mundial. In Meio ambiente, desenvolvimento e cidadania: desafios para as ciências sociais. Eduardo Viola, Héctor Ricardo Leis et al. (org). 2 ed. São Paulo: Cortez; Florianópolis; Universidade Federal de Santa Catarina, 1998, p. 34. 89 estar em veloz e constante transformação. Por fim, é forçoso reconhecer que a busca por políticas públicas ambientais eficazes envolve uma mudança de paradigma de desenvolvimento, visto que a inconsistência da maior parte das medidas até hoje adotadas pelo Poder Público contribuiu decisivamente para a reprodução de um modelo de exploração predatório, que acarreta enormes prejuízos econômicos e desmantela o sistema ecológico. 90 2.3 Tributo como estratégia de uma política ambiental É notório que a Constituição ocupa posição de estatuto organizacional e normativo do Estado Democrático de Direito, vez que lhe institui poderes e competências, capazes de delinear políticas públicas ambientais, de acordo com os 166 valores norteados pelo povo e pelos agentes políticos. A consciência de que o ambiente é o suporte da vida e de que sua capacidade de resistir à exploração ilimitada era inexistente no passado. As questões relativas à degradação só eram objeto de intervenção legal quando houvesse reflexos econômicos diretos ao dono da propriedade atingida, servindo a legislação civil à proteção de seus direitos. Stuart Mill, no século XIX, já alertava sobre a importância do ambiente para a qualidade de vida enquanto suporte e fornecedor de serviços que potenciam a própria vida. Deve-se atentar que, a ideia de tutela ambiental é, historicamente, 167 recente, datada dos últimos 40 anos do século passado. Os primeiros registros de intervenção pública na defesa ambiental tiveram uma perspectiva antropocêntrica, na medida em que as questões ecológicas não eram protegidas como tal, mas enquanto meios de satisfação das necessidades humanas. Essa ação era justificada pela atividade estatal, uma vez que a base ética da ordem social era constituída, exclusivamente, pela pessoa e seu bem-estar. O rápido processo de evolução, desencadeado em meados do século passado, teve como fundamento a ideia de um favorecimento de todo e qualquer tipo de crescimento econômico, emergindo assim, uma forma de atuar, caracterizada por uma desenfreada criação de indústrias, exploração de recursos naturais e formação de enormes aglomerados humanos, hoje apontados como principais causas dos problemas ecológicos. 168 Antes do surgimento do Estado neoconcorrencial ou intervencionista não era permitido, a princípio, ao Estado interferir na ordem natural do mercado, até mesmo para garantir a propriedade privada. Havia um equivocado consenso de que Estado e sociedade tinham existências independentes uma da outra. Obtempera 166 A esse respeito, consultar GOYARD-FABRE, Simone. Os princípios filosóficos do Estado Moderno. São Paulo: Martins Fontes, 2002, pp. 102-114. 167 CORDEIRO, Antônio Menezes. Tutela do Ambiente e Direito Civil. Lisboa: Almedina, 1996, p. 378. 168 A expressão é de Eros Roberto Grau in GRAU. Op cit. 91 Eros Grau, no entanto, que mesmo desde o Estado Moderno, a burguesia obtinha vantagens no mercado, pondo a sua disposição instrumentos de políticas públicas através da ação estatal sobre o domínio econômico, o que demonstra que não era tão absoluta a afirmação de que o Estado não tinha o poder de intervenção na economia. Discorre o autor: “Estado Moderno nasce sob a vocação de atuar no campo econômico. Passa por alterações, no tempo, apenas o seu modo de atuar, inicialmente voltado à constituição e à preservação do modo de produção capitalista, 169 posteriormente à substituição e compensação do mercado”. A consciência do perigo da esgotabilidade dos recursos, mormente os energéticos, fez nascer a preocupação do Estado em adotar medidas estratégicas de proteção e conservação. A partir disso, ele passou a o utilizar de práticas intervencionistas no combate às externalidades negativas do progresso tecnológico. O Estado do Bem-Estar enfrentou o desafio de reestruturar suas feições, pois a relação entre economia privada e Estado nunca foi tão intensa desde a Revolução Industrial. O homem nunca explorou tanto matéria e energia, a sociedade jamais se apropriou de tantos recursos naturais para sua subsistência quanto hoje. O ataque desproporcional ao ambiente passou a ser questionado frente ao objetivo 170 estatal pretendido: bem-estar social. A crescente procura pela qualidade ambiental, que acompanha o aumento da prosperidade e, a cada vez maior, conscientização dos custos externos, contribuíram para reforçar a pressão sobre as autoridades públicas responsáveis nesta área no sentido de buscar instrumentos de proteção ambiental mais eficazes e eficientes, uma vez que a ciência não tem conseguido dar uma solução satisfatória como instrumento em prol da ecologia. O Estado percebeu que os instrumentos econômicos vinculam a mecânica ambiental, emergindo um cenário favorável a uma mudança do modos faciendi à abordagem não intervencionista estatal quando as tradicionais medidas de comando e controle administrativo não estão sendo aptas a precaver à crise instaurada. Em virtude da incapacidade demonstrada pelo mercado em resolver o problema da degradação ecológica o Estado decidiu assumir um papel ativo no domínio da proteção ambiental. 169 GRAU. Op cit., p.19. 170 HERNANDES, Jorge Gimenez. El Tributo Como Instrumento de Protección Ambiental. Barcelona: Comares. 1998, p. 15. 92 O foco do direito, das políticas públicas e da gestão ambiental passou por transformações, refletindo o problema ecológico em cada época que a sociedade se deparava. Enfatiza D’isep: O Estado – como organização social – está em constante transformação. A evolução dos direitos e garantias, notadamente dos direitos fundamentais, é o grande impulsionador dessa transformação, já que o Estado, para efetivar esses direitos deverá se estruturar. Portanto, quanto mais evoluída a sociedade, quanto mais elaboradas forem as garantias, mais complexo será o Estado e mais sofisticadas deverão ser as Políticas Públicas responsáveis 171 pela concretização dos Direitos consagrados. Nos anos 70, a regulamentação iniciou-se com foco na educação e persuasão. Hoje, os valores de referência são a prevenção, a precaução, a cautela, a integração, a participação e a cooperação, num esforço de corrigir suas próprias 172 falhas e as do mercado, seja em eficiência seja em equidade. O Estado passa a fazer uma análise integrada e sistemática do problema ecológico, onde os instrumentos de incentivo adquirem uma função extremamente relevante. Nessa medida, é necessária a utilização do Direito Tributário como instrumento de realização da Justiça Fiscal. Explica Tipke: Em um Estado de Direito deve-se atuar com justiça na medida do possível. Esta, é a máxima exigência que se deve projetar o ente político. Esta exigência não pode permanecer anulada ou desprezada em seu conteúdo essencial por outras aspirações. Este também é o ponto de partida das constituições que invocam de modo expresso a Justiça ou a Justiça 173 tributária. A Constituição do Brasil adotou um modelo econômico de bem-estar. Esse modelo está evidenciado nos artigos 1° e 3°, assim como no enunciado do art. 174 170. Tais preceitos não podem ser desconsiderados pelas políticas públicas de 171 D’ISEP, C. F. M. Políticas Públicas Ambientais: da definição à busca de um sistema integrado de Gestão Ambiental. In _____; NERY JR, N. & MEDAUAR, O. (Coords). Políticas Públicas Ambientais: estudos em homenagem ao professor Michel Prieur. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 159. 172 HERRERO, Luis M. Herero. Tendencias en el uso de instrumentos económicos y fiscales en la gestión ambiental: reflexiones sobre la unión europea y el caso español in Fiscalidad Ambiental. Org. Yabar Sterling. Barcelona: 1998, p. 165. 173 TIPKE, Klaus. Moral tributaria del estado y de los contribuyentes. Tradução de Pedro M. Herrera Molina. Madrid: Marcial Pons, 2002, p. 27. 174 Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do 93 Governo, muito antes, pelo contrário, deve servir de guia mestre na condução dos comandos estatais. A dignidade de pessoa humana, por seu turno, é consagrada no texto constitucional tanto como fundamento da República Federativa do Brasil (art.1°, III) como fim da ordem econômica (art. 170). Para a concretização de uma existência digna que proporcione efetiva qualidade de vida, é fundamental um meio ambiente ecologicamente equilibrado. De fato, a defesa do meio ambiente é princípio constitucional que deve ser incorporado no processo econômico (art. 170, VI), o qual também deve ser compatibilizado com o comando da norma expressa do art. 225, §1°, IV, tornando, de imediato, inconstitucional qualquer espécie de desenvolvimento da atividade econômica que desrespeite os bens da natureza. Amaral conclui que, mediante a interpretação sistemática da Constituição Federal brasileira, o Direito Tributário poderá desempenhar um papel primordial na defesa do meio ambiente, obrigando a se observar todos os mandamentos por ela impostos e, além de compatibilizá-los entre si, assegurando a sua satisfação através das normas infraconstitucionais e das orientações políticas, seguidas pelos poderes públicos. O autor completa: No entanto, nossa Constituição Federal não previu, expressamente, a possibilidade de utilizar os tributos na defesa do meio ambiente, não querendo isto dizer que a tributação ambiental esteja afastada ou proibida em nosso país. A Carta Magna consagra o princípio da solidariedade (art. 3o, I), o princípio do poluidor-pagador (art. 225, §3o), atribui a proteção ambiental à qualidade de princípio da ordem econômica (inc. VI do art. 170 – inciso com redação determinada pela EC 42/2003), além de colocar a tutela do meio ambiente como um dos pilares da ordem social (art. 225). Logo, interpretando sistematicamente a Constituição brasileira, chegar-se-á à conclusão que a tributação desempenhará excelente papel na realização de seus objetivos constitucionais, por exemplo, a proteção do meio 175 ambiente. trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político. Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição. Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios. 175 AMARAL, Paulo Henrique do. Direito tributário ambiental. São Paulo: Rev. dos Tribunais, 2007, p. 65. 94 A legislação nacional permite a intervenção do Estado no domínio econômico através do tributo ambiental com o fito de correção e direção do mercado, afastando da norma, dessa forma, a característica de neutralidade, própria de sua natureza arrecadatória. Assim, a interligação entre a tutela do ambiente e o sistema econômico deve, através de imposição normativa, proporcionar equilíbrio nas relações sociais e bem estar comum. A necessidade de tutela do bem ambiental justifica a imposição de um tributo ambiental, já que se está a proteger um interesse difuso. Os instrumentos econômicos assumem um importante papel na busca da implantação de um modelo de desenvolvimento equilibrado quando comparado com 176 os resultados pouco satisfatórios dos mecanismos de regulação direta. Esclarece Carneiro: No Brasil ainda são incipientes os exemplos de aplicação de instrumentos econômicos na formulação e no gerenciamento das políticas públicas do meio ambiente. Nossa legislação ambiental [...] é preponderantemente estruturada sobre os alicerces regulatórios de comando e controle, impondo padrões, avaliando impactos, exigindo a obtenção de licenças ambientais, proibindo determinadas atividades em áreas ecologicamente relevantes, estipulando responsabilidades e penalidades nas esferas civil, penal e administrativa, etc. No entanto, os órgãos ambientais responsáveis institucionalmente pela fiscalização e pela aplicação efetiva desse arcabouço legal não escapam às mazelas e deficiências que normalmente caracterizam a Administração Pública no País, fazendo com que a opção representada pelos instrumentos econômicos assuma cada vez mais um papel de destaque, como meio de implementação racional, eficiente e viável 177 de um modelo concreto de desenvolvimento equilibrado. O desenvolvimento econômico deve estar atento à aplicação dos princípios da ordem econômica, garantidos pelo texto constitucional, não olvidando de conciliar-se com os insertos da ordem ambiental, tudo no sentido de coadunar-se com o uso sustentável da natureza. O objetivo tem em vistas o aumento da 176 Notícia veiculada pela Agência Estado em 11/04/2011 aponta que, segundo relatório do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA ), das autuações efetuadas pelo órgão entre 2005 e 2010, o porcentual médio de multas pagas no período foi de 0,75%. O baixo percentual de multas efetivamente pagas reflete, segundo o próprio Ibama e especialistas, a complexa tramitação dos processos de apuração de infrações ambientais. "O processo administrativo de apuração de infração ambiental não tem o poder de, per si, garantir o pagamento de multa", explicou o Ibama em nota. (VIALLI, Andrea. Relatório mostra que menos de 1% das multas aplicadas pelo Ibama são pagas. O Estado de S. Paulo, São Paulo, 11 abr. 2011. Disponível em: . Acesso em: 07 jun. 2012). 177 CARNEIRO, Ricardo. Direito ambiental: uma abordagem econômica. Rio de Janeiro: Forense, 2003, pp. 150- 151. 95 qualidade de vida da população, como bem sintetiza Derani: Este modo de pensar o desenvolvimento econômico decorre da interpretação dos princípios da ordem econômica constitucionalmente construídos, e que se destinam a reger a atividade econômica e seus fatores. Um novo ângulo de se observar o desenvolvimento econômico, inserindo outros fatores na formação de políticas públicas, é conformado pela presença do capítulo do meio ambiente na Constituição Federal. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado exposto no art. 225 se faz presente como princípio a ser respeitado pela atividade econômica no artigo 170, VI. A positivação deste princípio ilumina o desenvolver da ordem 178 econômica, impondo sua sustentabilidade. Não se questiona, diante do comando constitucional, que o desenvolvimento econômico deve respeitar os limites do uso adequado dos recursos naturais, assim, as políticas públicas devem ser orientadas segundo um desenvolvimento econômico sustentável. O Estado pode e deve intervir no domínio econômico como agente normativo e regulador, com o escopo de desempenhar as funções de fiscalização, incentivo e planejamento indicativo ao setor privado sempre atento aos princípios constitucionais da ordem econômica. Aliás, dentre as possibilidades de regulação da ordem econômica, o texto constitucional estabeleceu em seu art. 149, a competência exclusiva da União para instituir contribuições de intervenção no domínio econômico, cuja natureza jurídica é tributária. Face à relevante contribuição do Direito Tributário como instrumento de fomento do desenvolvimento econômico, mormente pela função extrafiscal dos 179 tributos, é urgente a utilização de políticas públicas que contemplem simultaneamente: proteção do meio ambiente e desenvolvimento econômico. É como elucida Becker: A principal finalidade de muitos tributos (que continuarão a surgir em volume e variedade sempre maiores pela progressividade transfigurada dos tributos de finalismo clássico ou tradicional) não será a de um instrumento de arrecadação de recursos para o custeio das despesas públicas, mas a de um instrumento de intervenção estatal no meio social e na economia 180 privada. 178 DERANI. Op. cit., 2008, p. 151. 179 Como se verá mais atentamente no próximo capítulo, a partir do advento do modo de produção capitalista e, em consequência, da reformulação do Estado em meio à proeminência da economia de mercado, a tributação passou a ser utilizada também como instrumento de interferência na economia, com o fim de influenciar na direção dos setores econômicos, tendo essa ‘nova’ função o nome de extrafiscalidade. 180 BECKER. Op. cit., p.587. 96 A atenção dada pela doutrina brasileira à tributação ambiental revela a importância do papel da atividade estatal como agente exclusivo criador dos tributos e seu dever constitucional, mostrando ser uma importante ferramenta para a obtenção de uma satisfatória qualidade do meio ambiente. A possibilidade de proteger o meio ambiente por meio de instrumentos fiscais foi mencionada em 1920, com a proposta do economista inglês Pigou de isentar os impostos que afetassem os custos "externos" da produção e consumo privados. Segundo García: “Semelhante proposta logrou êxito no âmbito acadêmico, porém não teve consequências práticas na política ambiental até os anos 70, quando foram introduzidas as primeiras taxas ecológicas, tendo o princípio do poluidor-pagador sido adotado pela OCDE no primeiro programa de ação das Comunidades em 181 matéria ambiental”. O tributo ecológico é caracterizado como todo aquele encargo cuja principal finalidade é servir à proteção do meio ambiente, incluindo os tributos em que o fato gerador não está relacionado diretamente com atividades contaminantes, mas que a arrecadação seja afetada para a proteção ambiental. Sendo assim, os resultados pretendidos por esses tributos constituem um instrumento de financiamento de 182 políticas públicas. O Estado pode empregar instrumentos tributários que compatibilizem a tributação com a preservação ambiental por meio da fiscalidade, que tem por 183 objetivo o desestímulo, ou que contemplem – através da extrafiscalidade – um 184 duplo benefício, qual seja, arrecadar e incentivar a conservação ambiental. Pode, 181 GARCÍA, Aurelio de Prada. Justicia y protección fiscal del medio ambiente. In: STERLING, Ana Yábar (Org.). Fiscalidad ambiental. 1. ed. Barcelona: Cedecs, 1998, p. 245. 182 MOLINA, Pedro Manuel Herrera; VASCO, Domingo Carbajo. Marco Conceptual, constitucional y comunitario de la fiscalidad ecológica. In: TÔRRES, Heleno Taveira (Org.). Direito tributário ambiental. São Paulo: Malheiros, 2005, pp. 157– 234. 183 “...existem três modos de impedir uma ação não desejada: torná-la impossível, torná-la difícil e torná-la desvantajosa. De modo simétrico, pode-se afirmar que um ordenamento promocional busca atingir o próprio fim pelas três ações contrárias, isto é, buscando tornar a ação desejada necessária, fácil e vantajosa” BOBBIO, Norberto. Da estrutura à função: novos estudos de teoria do direito. São Paulo: Manole, 2007, p.15. 184 Ver, a propósito dos mais diversos instrumentos tributários para a conservação ambiental: TÔRRES, Heleno Taveira. Da relação entre competências constitucionais tributária e ambiental – os limites dos chamados "tributos ambientais". In: TÔRRES, Heleno Taveira (Org.). Op. cit., 2005, pp. 96-156. COSTA, Regina Helena. Apontamentos sobre a Tributação Ambiental no Brasil. In: TÔRRES, Heleno Taveira (Org.). Op. cit., 2005, pp. 312-332. MUÑOZ, José Manuel Rodríguez. Op. cit., 2004. MOLINA, Pedro Manuel Herrera; VASCO, Domingo Carbajo. Marco Conceptual, 97 dentro das disposições que a lei lhe faculta, criar políticas de incentivos fiscais, de isenções de tributos entre várias outras medidas capazes de contemporizar questões que, consequentemente, venham a proteger o meio ambiente, sem deixar de cumprir com seu primordial objetivo que é o de arrecadar valores para os cofres públicos. O direito tributário tem um relevante papel: o de implementar políticas públicas através da ação coordenada da intervenção estatal na atividade econômica. O direito tributário ambiental, por sua vez, se tornou um instrumento de transformação da sociedade. Ao tratar da inerente relação entre meio ambiente e direito tributário, assim se pronuncia Ribas: O direito ambiental transpassa diferentes áreas jurídicas, que se devem levar em conta princípios de natureza ambiental, por isso chamado de horizontal e também de integração, uma vez que se penetra em todos os setores do direito, para neles introduzir a ideia ambiental. A tributação atua basicamente sobre fatores econômicos, que têm que estar de acordo com princípios estabelecidos no direito ambiental. A atividade legislativa deve implementar os instrumentos jurídicos e, entre eles, os tributários são de extremar relevância e eficácia, pois se revelam hábeis à proteção do 185 ambiente. Um efetivo aporte estatal através de medidas tributárias é instrumento de persuasão, pois os tributos ecologicamente orientados influenciam na decisão econômica de agir mais acertadamente na opção desejada em favor da natureza. Na atividade econômica, as decisões são tomadas, quase que exclusivamente, através do binômio custo/benefício. O custo, então, é critério de extrema relevância nas decisões diárias de todos os indivíduos, assim, se os custos da degradação não se refletirem nos preços, as decisões econômicas jamais serão ecologicamente acertadas. A função do tributo ambiental é justamente trazer para o custo de cada bem o que verdadeiramente custa ao ambiente. A experiência estrangeira e os estudos acadêmicos sobre a ecotributação têm demonstrado que a proteção fiscal do meio ambiente tem se revelado constitucional y comunitario de la fiscalidad ecológica. In: TÔRRES, Heleno Taveira (Org.). Op. cit., 2005, pp.157-234. OLIVEIRA, José Marcos Domingues de. Direito tributário e meio ambiente. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. LOBATO, Anderson Orestes Cavalcante; ALMEIDA, Gilson César Borges de. Tributação ambiental: uma contribuição ao desenvolvimento sustentável. In: TÔRRES, Heleno Taveira (Org.). Op. cit., 2005, pp. 624-640. MORO, Cristobal J. Borrero. La tributación ambiental en España. Madrid: Tecnos, 1999. 185 RIBAS, Lídia Maria Lopes Rodrigues. Defesa ambiental: utilização de instrumentos tributários. In: TÔRRES, Heleno Taveira (Org.). Direito tributário ambiental. São Paulo: Malheiros, 2005, pp. 684-685. 98 instrumento eficaz de política pública ambiental. São muitas as vantagens frente a outras medidas, haja vista apresentar características que exigem uma aplicação não só do ponto de vista técnico, como também de um ponto de vista ético. A aplicação de instrumentos fiscais à tutela do ambiente é ainda incipiente, não se pode desconsiderar a dificuldade de sua implementação e sua atuação limitada. Todavia é remédio de grande eficiência de cobranças recuperadoras de custos e penalizadoras de comportamentos ambientalmente incorretos. Inúmeros são hoje as possibilidades da fiscalidade na área ambiental e, normalmente, estão relacionadas ao princípio do poluidor-pagador. Este princípio somente em maio de 1972 conquista oficialmente o status de princípio de política do ambiente por meio da Recomendação C(72)128, de 26 de maio de 1972, da 186 Organization et Coopération et de Développement Economique – OCDE , que trata dos princípios orientadores relativos aos aspectos econômicos internacionais das políticas ambientais, devendo ser entendido como: O princípio a ser usado para alocar custos das medidas de prevenção e controle da poluição, para encorajar (estimular) o uso racional dos recursos ambientais escassos e para evitar distorções do comércio internacional e investimentos é denominado de princípio do poluidor pagador. Este princípio significa que o poluidor deve suportar os custos do implemento das medidas acima mencionadas, decididas pela autoridades públicas para assegurar que o ambiente possa ficar num nível aceitável. Em outros termos, o custo dessas medidas deveriam refletir-se no preço dos bens e serviços, cuja produção e consumo são causadores de poluição. Tais medidas não deveriam ser acompanhadas de subsídios, porque criariam distorções 187 significativas ao comércio e investimentos internacionais. Na esfera infraconstitucional, o princípio do poluidor-pagador vem expressamente previsto no inc. VII do art. 4o da Lei n. 6.938/81 (Lei de Política Nacional do Meio Ambiente), portanto, desde a égide da constituição anterior já se afirmava que a “Política Nacional do Meio Ambiente visará” impor “ao poluidor e ao 186 A OCDE é um fórum único em que governantes de dezenas de democracias trabalham em conjunto para responder aos desafios econômicos, sociais e ambientais da globalização com o objetivo de compreender e auxiliar os governos a compreender os novos desafios como a governança coorporativa, a economia da informação e os desafios referentes ao envelhecimento da população. Nesse espaço os governos podem trocar experiências de políticas econômicas, sociais e ambientais, com o fim precípuo de encontrar respostas para problemas globais, identificar os bons resultados e trabalhar para coordenar políticas domésticas e internacionais. As publicações da OCDE disseminam amplamente os resultados de compilações estatísticas da Organização, pesquisas econômicas, sociais e ambientais, assim como convenções, diretrizes e padrões acordados pelos seus membros. 187 RODRIGUES, Marcelo Abelha. Elementos de Direito Ambiental. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 191. 99 predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados e, ao usuário, da contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos”. A tributação ambiental se caracteriza por ser uma política pública preventiva, principalmente, em relação à incorporação de tecnologias limpas e, incentivos às políticas restauradoras do meio ambiente. Sua utilização já é uma realidade em muitos países. A Suécia, v.g., foi inovadora, adotando uma Reforma Fiscal Verde na década de 1990, seguindo-se outros países, como Dinamarca, Noruega, Finlândia, 188 Itália, Reino Unido, Espanha e Portugal. No Brasil, há parcas experiências de tributação ambiental, portanto há muito a se fazer diante da carência de uma sistematização nacional. Para tanto, é indispensável a reflexão a respeito das funções e consequências políticas, sociais e econômicas da área do direito tributário ambiental, de modo a adaptá-la as novas realidades e necessidades sociais, rumo à consolidação do “direito tributário das futuras gerações”. A maioria dos instrumentos tributáveis aplicáveis na seara ambiental no Brasil é recente e tem por base a utilização de tal premissa. Além da experiência do ICMS ecológico, tem-se questões abertas à discussão relacionadas ao incentivo ao Etanol; energias “limpas” como o biodiesel, energia solar, energia eólica; ações na Bolsa de Valores, através do Mercado de Carbono, previsto no Protocolo de Quioto; isenção sobre o ITR da Reserva Particular do Patrimônio Natural e a Isenção da contribuição de intervenção no domínio econômico (CIDE); a recuperação dos custos da oferta de serviços de esgoto entre outros. A proteção ao meio ambiente está inevitavelmente associada aos temas do direito econômico e das políticas sociais. Pode-se afirmar que, no que tange à função social do tributo, possui relação direta com o desenvolvimento sustentável. A celeuma sobre tal desenvolvimento é justamente sobre a compreensão das relações da sociedade para com o meio natural, a adequação do direito ambiental a uma política para além das inúmeras discussões acadêmicas sobre o alcance real e a consequente conservação dos recursos naturais. 188 Para saber mais, consultar TUPIASSU, Lise Vieira da Costa. Tributação ambiental: a utilização de instrumentos econômicos e fiscais na implementação do direito ao meio ambiente saudável. Rio de Janeiro: Renovar, 2006; MORO, Cristobal J. Borrero. La tributación ambiental en España. Madrid: Tecnos, 1999 e TÔRRES, Heleno Taveira (org). Direito tributário ambiental. São Paulo: Malheiros, 2005. 100 Importante destacar que o direito tributário pode ir além da mera atividade arrecadatória, pois também pode servir como um instrumento de aplicação de políticas públicas em diversas outras áreas do conhecimento humano, mormente na seara ambiental. Assim, ultrapassa-se a preocupação única com os aspectos qualitativos do tributo para atingir a justiça fiscal por meio de mecanismos de 189 articulação com outras determinações constitucionais. Sem dúvida, a proteção ao meio ambiente não pode paralisar as atividades econômicas, pois deve garantir as bases vitais de produção do homem e de suas atividades. Mas justamente a proteção mais eficiente é aquela que conta com as atividades econômicas, que interfere no plano econômico, em busca de uma maior efetividade de suas ações. O direito ao desenvolvimento sustentável envolve normas capazes de instrumentalizar políticas de desenvolvimento, embasadas na qualidade das condições existenciais dos cidadãos. Para tanto, o Estado também possui um papel relevante ao delimitar a atuação das forças de mercado em que as obrigações tributárias são especialmente importantes. Fundamental a concretização de políticas compatibilizantes com a atividade econômica capazes de aumentar as potencialidades do homem e do meio natural, sem exauri-las. O desenvolvimento sustentável vincula a expansão da atividade econômica a uma sustentabilidade tanto econômica quanto ecológica. Trata-se de uma estratégia de risco, pois, para ordem econômica, o crescimento constante da economia é necessário para expandir o bem-estar pelo mundo. O grande desafio para a consecução do desenvolvimento sustentável implica em conciliar a limitação dos recursos naturais com o ilimitado estímulo ao crescimento econômico, onde o máximo econômico reflita igualmente um máximo ecológico, de forma, a de fato, expandir-se o bem-estar, assumindo-se que a sustentabilidade é condição necessária para o crescimento econômico. A preservação do equilíbrio ecológico exige que o bem-estar seja avaliado pela qualidade de vida e não pela quantidade de recursos consumidos. Torna-se necessária uma atribuição de valor econômico aos recursos e ao ambiente, para depois serem monetarizados pelo mercado. 189 COELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 143. 101 Estando o direito tributário mais ligado a fatores modernos da sociedade, atuando basicamente sobre fatos econômicos e, observada a integração do direito ambiental com todos os setores do direito, insurge-se a possibilidade de utilizar-se daquele como mecanismo de auxílio deste na proteção ao meio ambiente. A integração da ecologia e da economia parece ser um dos maiores desafios da sociedade pós-industrial, tornando mister uma articulação entre as instituições políticas e o mercado, assim como, a introdução das questões ambientais no sistema econômico capaz de eliminar comportamentos insustentáveis. Não se pode negar que a defesa do ambiente requer a participação ativa do Estado por meio do recurso ao sistema fiscal, como um serviço de real interesse público, diante da notória insatisfação das necessidades de eficiência e eficácia pelos institutos de direito privado e pelos mecanismos de comando e controle. A utilização do sistema fiscal pelo Estado em prol da tutela ambiental impõe uma participação no processo político de toda a comunidade, pois os impostos ambientais representam o que se deveria pagar pela preservação. 102 3. TRIBUTO AMBIENTAL O crescimento econômico é ditame constitucional brasileiro e desejo global, pois proporciona qualidade de vida e comodidade material. Um meio ambiente saudável, por sua vez, também oferece qualidade à vida, razão por que, diante da evidente relação entre estes dois fatores, o tributo ambiental caracteriza-se por ser um instrumento de promoção do desenvolvimento sustentável. A sustentabilidade tem sido objeto de profundos debates. Pretende-se, após anos de discussões, encontrar um consenso a respeito de seu conteúdo e alcance: algo que não seja insustentável, tampouco utópico. Inúmeras são as vantagens do emprego da ecotributação, uma delas decorre de sua função extrafiscal, que incentiva um comportamento pró-natureza transformando esse remédio jurídico em um operacionalizador da aquisição de benefícios financeiros já que o homem é, em regra, um ser maximizador de riquezas. O tributo ambiental, como instrumento econômico, também é meio para internalização das externalidades negativas decorrentes das ações degradadoras do ambiente, um dos focos da problemática ambiental. Dessa forma, penaliza-se o poluidor a fim de evitar danos à coletividade. Adverte-se, outrossim, da relevância da associação do direito ambiental com outras ciências, mormente a econômica. A interdisciplinaridade não poderá ser deixada de lado principalmente se for considerada a complexidade da questão ambiental. Por isso, a aplicação da Análise Econômica do Direito – AED – pode constituir relevante auxílio para a compreensão do homem econômico, pois consegue antever seu comportamento e influenciar na sua decisão. Desta forma, a ideia do tributo ambiental, pautado pelo binômio custo- benefício, estimula que a preservação ambiental se torne economicamente interessante no meio social e, com isso, ajude o Estado a alcançar seu dever constitucional, proporcionando aos cidadãos um meio ambiente ecologicamente saudável. 103 3.1 O Tributo Ambiental como Instrumento de Promoção do Desenvolvimento Sustentável A relação jurídica do Estado com o ambiente não é de poder, mas de dever de proteção. Esta relação, prevista constitucionalmente, transforma a defesa do equilíbrio ecológico numa função pública, com caráter de tarefa, sendo que a mesma norma que lhe atribui a obrigação de cumpri-la, também lhe outorga o poder (tributário) de exigir de todos os cidadãos uma contribuição para custear tal despesa pública. Todos têm a obrigação de colaborar para a preservação do ecossistema no qual a sociedade se integra e se desenvolve. Portanto, não é só legítimo que o Estado utilize o sistema fiscal para atingir suas inúmeras atribuições constitucionais, como constitui um dever de prezar pela sustentabilidade. A defesa ambiental constitui um princípio geral da atividade econômica, concluindo que para o modelo econômico de bem-estar é fundamental um meio ambiente ecologicamente equilibrado. Este direito está expresso no artigo 225, como princípio a ser respeitado pela ordem econômica no artigo 170, VI, ambos do texto constitucional vigente, assim, a positivação de tal princípio destaca o desenvolver da ordem econômica, vinculando à sustentabilidade. Derani bem sintetiza esse assunto: Este modo de pensar o desenvolvimento econômico decorre da interpretação dos princípios da ordem econômica constitucionalmente construída, e que se destina a reger a atividade econômica e seus fatores. Um novo ângulo de se observar o desenvolvimento econômico, inserindo outros fatores na formação de políticas públicas, é conformado pela presença do capítulo do meio ambiente na Constituição Federal. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado exposto no art. 225 se faz presente como princípio a ser respeitado pela atividade econômica no artigo 170, VI. A positivação deste princípio ilumina o desenvolver da ordem 190 econômica, impondo sua sustentabilidade. Considerando que o crescimento econômico é tido como condição necessária para o desenvolvimento, embora não se confundam, entende-se que deve haver mútua contemplação entre esse desenvolvimento econômico, a preservação ambiental e a intervenção estatal tributária. A tributação não se caracteriza apenas como geração de receitas, mas também como instrumento para a persecução de outros fins, dentre os quais, a preservação ambiental. Portanto, a 190 DERANI, Cristiane. Aplicação dos princípios do direito ambiental para o desenvolvimento sustentável. In: TÔRRES Heleno Taveira (Org.). Direito tributário ambiental. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 642. 104 chamada tributação ambiental é tida como instrumento catalisador e incentiva o valor do desenvolvimento sustentável. A Constituição brasileira fornece sustentáculo jurídico ao Estado para combater a crise ambiental vivenciada na atualidade. A sustentabilidade ambiental na produção econômica de bens e serviços, apesar de não constar expressamente dos artigos 145 a 169 da Constituição de 1988, consubstancia parâmetro atual e requisito futuro à concessão de favores fiscais, de acordo com uma interpretação sistemática e teleológica da Lei Maior, a despeito de os formuladores da política tributária nacional não observarem esse vetor axiológico implícito primário. Sob o ponto de vista jurídico-constitucional é possível demonstrar que a sustentabilidade ambiental constitui parâmetro atual não observado e requisito futuro necessário à concessão de benefícios fiscais a partir de três linhas de pensamentos. Existe interação entre o Título VI da Constituição de 1988 e a disciplina da ordem econômica, em seu Título VII, sendo a última expressamente conformada pelo princípio da defesa do meio ambiente (inciso VI do art. 170). O constituinte, ao mesmo tempo em que conferiu competência aos entes políticos para tributar e desonerar a produção econômica de bens e serviços no bojo da política extrafiscal, estabeleceu a sustentabilidade ambiental da atividade empresária como princípio constitucional, razão pela qual a unidade da Constituição pressupõe a interdependência entre três imperativos: a prerrogativa estatal de tributar a atividade econômica objetivando financiar as despesas públicas; a possibilidade de utilização do tributo com intuito extrafiscal, visando à intervenção na Ordem Econômica e Social; e a defesa do Meio Ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado considerando o impacto ambiental dos produtos e serviços e 191 de seus processos de elaboração e prestação. Sustentabilidade é a base desta nova política, pois então convém definir de que se trata. O desenvolvimento sustentável é um princípio diretor para o planejamento do desenvolvimento econômico e tem por base a satisfação das necessidades presentes, sem o comprometimento das gerações futuras em suas próprias necessidades. Não se trata, pois, de desenvolver sem destruir, porque, 191 COSTA, Leonardo de Andrade. A sustentabilidade ambiental na proteção econômica de bens e serviços como requisito progressivo à concessão de incentivos e benefícios fiscais no Brasil. In A sustentabilidade ambiental em suas múltiplas faces. Nilton Cesar Flores (org.). Campinas: Millennium, 2012. 105 conforme Derani, toda atividade humana consome e altera. Discorre a autora: O direito do desenvolvimento sustentável aporta essencialmente normas capazes de instrumentalizar políticas de desenvolvimento com base no aumento da qualidade das condições existenciais dos cidadãos. A normatização do desenvolvimento, para procurar uma disposição racional dos seus elementos, procura geri-lo sob um ponto de vista macro, ou seja, como desenvolvimento socialmente analisado, sintetizado na expressão “desenvolvimento econômico”. Este, por sua vez, só pode ser compreendido integralmente quando vinculado a sua forma individualizada, expressa na garantia do desenvolvimento das expressões humanas (cultura, saúde, atividades individuais ou intersubjetivas que proporcionariam felicidade). Assim, políticas que reencontrem uma compatibilização da atividade econômica com o aumento das potencialidades do homem e do meio natural, sem exauri-los; apoiadas por normas de incentivo à pesquisa científica de proteção dos recursos naturais e de garantia de uma qualidade ambiental, são expressões do direito do desenvolvimento sustentável – uma 192 outra forma de ver e compreender o direito ambiental. Dentro desse conceito, a conduta humana pode modificar a natureza, apropriando-se de seus recursos somente para a manutenção da vida humana, sem danificar a sua reprodução. Portanto, tal princípio é aplicável aos recursos 193 renováveis. Deve haver uma harmonização com o potencial atual e o futuro o que requer uma transformação da cultura empresarial e uma justa distribuição de riqueza a nível global, equilibrando-se os interesses particulares de lucro e o interesse do bem-estar coletivo. O conteúdo da definição do desenvolvimento sustentável vincula a atividade presente aos resultados para as futuras gerações, sob pena de inviabilização dos direitos das próximas gerações, sendo necessário planejamento jurídico-político estratégico com base num crescimento econômico em harmonia com o bem-estar mundial. 194 Nessa linha, deve-se tentar conceituar desenvolvimento sustentável, sob a perspectiva de conservação dos recursos naturais. A World Commission on Environment and Development – WCED, em documento sobre as estratégias do desenvolvimento, foi a primeira a divulgar o princípio do desenvolvimento sustentável como princípio diretor para o planejamento do desenvolvimento 192 DERANI. Op. cit. 2008, p. 171. 193 Idem, p. 108. 194 Nas palavras de Enrique Leff, “o discurso da sustentabilidade admite várias interpretações que correspondem a visões, interesses e estratégias alternativas de desenvolvimento. Por um lado, as políticas neoliberais estão levando a capitalizar a natureza, a ética e a cultura. Por outro, os princípios de racionalidade ambiental estão gerando novos projetos sociais, fundados na reapropriação da natureza, na ressignificação das identidades individuais e coletivas e na renovação dos valores do humanismo”. LEFF. Op cit., 2004, p.319. 106 econômico, segundo o qual o desenvolvimento é sustentável quando satisfaz as necessidades presentes, sem comprometer a habilidade das futuras gerações em satisfazer suas próprias necessidades. 195 O Relatório de Brundtland, estudo de alternativas para o desenvolvimento e o meio ambiente, diz que o “desenvolvimento sustentável pretende satisfazer as necessidades do presente sem comprometer os recursos equivalentes de que farão uso no futuro outras gerações”. O conceito de desenvolvimento sustentável contido no relatório e que se tornou linha mestra da Agenda 21 tem como pontos centrais: ... tipo de desenvolvimento capaz de manter o progresso humano não apenas em alguns lugares e por alguns anos, mas em todo o planeta e até um futuro longínquo. Assim, o "desenvolvimento sustentável" é um objetivo a ser alcançado não só pelas nações ‘em desenvolvimento’, mas também pelas industrializadas. ... atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem suas próprias necessidades. Ele contém dois conceitos chaves: i) o conceito de ‘necessidades’, sobretudo as necessidades essenciais dos pobres do mundo, que devem receber a máxima prioridade e: ii) "a noção das limitações que o estágio da tecnologia e da organização social impõem ao meio ambiente, impedindo-o de atender às necessidades presentes e futuras. Em essência, o desenvolvimento sustentável é um processo de transformação no qual a exploração dos recursos, a direção dos investimentos, a orientação do desenvolvimento tecnológico e a mudança institucional se harmonizam e reforçam o potencial presente e futuro, a fim de atender às necessidades e aspirações humanas. A partir da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e 196 Desenvolvimento em 1992, o termo desenvolvimento sustentável ganhou grande 195 O relatório “Nosso Futuro Comum”, lançado em 1987 (também conhecido como "Relatório Brundtland"), veio atentar para a necessidade de um novo tipo de desenvolvimento capaz de manter o progresso em todo o planeta e, no longo prazo, ser alcançado pelos países em desenvolvimento e também pelos desenvolvidos. Nele, apontou-se a pobreza como uma das principais causas e um dos principais efeitos dos problemas ambientais do mundo. O relatório criticou o modelo adotado pelos países desenvolvidos, por ser insustentável e impossível de ser copiado pelos países em desenvolvimento, sob pena de se esgotarem rapidamente os recursos naturais. Cunhou, desta forma, o conceito de desenvolvimento sustentável, ou seja, "o atendimento das necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem as suas próprias necessidades". 196 “Por isso, o desenvolvimento sustentável e a cooperação internacional não são soluções fáceis, porque hoje o compromisso deve ser global e não se pode esperar que os Estados-nação e as corporações econômicas, principais personagens do cenário internacional atual, assumem iniciativas coerentes neste sentido. Para gerar políticas e estratégias em condições de impedir a catástrofe ecológica global é necessário construir os consensos e as organizações globais que os viabilizem. Do ponto de vista do ambientalismo, o aspecto mais forte da Conferência do Rio de Janeiro [ECO 92] não foram acordos assinados pelos governos, mas precisamente a emergência germinal de uma sociedade civil planetária, expressada na constituição de um espaço público 107 popularidade e, vem sendo alvo de muitos estudos e tentativas de estabelecimento de políticas de gestão que buscam contemplar os seus princípios centrais. Resta evidente que a proposta da sustentabilidade é a formação de uma norma de conduta em que a modificação da natureza somente é aceitável para a manutenção da vida humana ou proteção de outro valor fundamental. Todavia, o desenvolvimento sustentável nasceu como uma proposta utópica, irreal e inconsistente que implicava na incorporação de uma intervenção transformadora do mundo e de um compromisso com a perenização da vida alçando a natureza o lugar mais alto na escala da valoração dos bens. A sustentabilidade era entendida, então, como uma inocente ideia de que a sustentabilidade ecossistêmica corresponderia a um suposto equilíbrio ou maneira consciente em todos os atos de maneira a transformar algumas atitudes humanas em resultados sólidos, visando atingir um ideal onde os interesses econômicos não deveriam prevalecer. A sustentabilidade, por vezes, está a representar um mito onde todos estão falsamente preocupados com o meio ambiente, como que num forjar de uma ecologia simbólica: uma farsa ideológica que não sai de mero discurso. Passou a constituir-se uma posição politicamente correta, mas não passando de mera articulação. Discorre Lorenço e Oliveira: O problema de fundo é que a noção de sustentabilidade, e mesmo a de preservação ou conservação do meio ambiente, parte de representações simbólicas e culturais que os seres humanos fazem do mundo natural, ou seja, o conteúdo material do conceito pode variar conforme as visões de 197 mundo que informam a relação homem-natureza. Recentemente, o conceito desenvolvimento sustentável tem sido objeto de reconstrução, diante de sua ausência de factibilidade na medida em que o desenvolvimento econômico não é conciliável com a sustentabilidade nos moldes delineados outrora por seus idealizadores. Para Ignacy Sachs, no prefácio da obra comunicativo onde se encontraram as diversas dimensões que compõem o ambientalismo, com raízes tanto no Sul quanto no Norte, no Leste como no Oeste, e pertencentes tanto ao sistema político como aos sistemas social e econômico” LEIS, Héctor Ricardo. Ambientalismo: um projeto realista-utópico para a política mundial. In Meio ambiente, desenvolvimento e cidadania: desafios para as ciências sociais. Eduardo Viola, Héctor Ricardo Leis et al. (Orgs.). 2 ed. São Paulo: Cortez; Florianópolis; Universidade Federal de Santa Catarina, 1998, p. 34. 197 LOURENÇO, Daniel Braga e OLIVEIRA, Fábio Correa Souza de. Sustentabilidade insustentável?.In A sustentabilidade ambiental em suas múltiplas faces. Nilton Cesar Flores (org.). Campinas: Millennium, 2012, p. 294. 108 198 de José Eli da Veiga , diz que o adjetivo sustentável da expressão deveria ser substituído por “socialmente includente, ambientalmente sustentável e economicamente sustentado no tempo”. Sobre a definição do termo, Viola e Olivieri esclarecem: Em outras palavras, a luta pelo significado legítimo do desenvolvimento sustentável expressa diversas categorizações e classificações fundadas, obviamente, em práticas diferentes e ligadas a múltiplas cosmovisões provenientes de uma pluralidade de pontos de vista essencialmente conflitantes. ... Em outras palavras, os diferentes atores do ambientalismo formulam e pleiteiam suas diferenças internas dentro desse campo de significado, denominado ambientalismo multissetorial. ... Nesse sentido, pode-se afirmar que as diversas posições do ambientalismo em relação ao significado da “transição em direção a uma sociedade sustentável” implicam lutas simbólicas pelo poder de produzir e de impor uma visão legítima de 199 sustentabilidade. A realidade tem evidenciado que aquele ideal utópico dificilmente será 200 alcançado, uma vez que tem se mostrado uma falácia. Não há elementos suficientes capazes de indicar medidas concretas que levem a uma manutenção dos recursos naturais perante o crescimento da produção de bens. Assim, é indispensável a busca de novo paradigma científico, capaz de substituir o industrialismo. Conclui Veiga sobre o desenvolvimento sustentável: Em meio a tantas linhas especulativas, o que parece se destacar é uma forte visão convergente de que as sociedades industriais estão entrando em uma fase de sua evolução. E que essa transição será tão significativa quanto aquela que tirou as sociedades europeias da ordem social agrária e levou-as à ordem social industrial. Ao mesmo tempo, as diversas versões sobre o “desenvolvimento sustentável” parecem estar muito longe de delinear, de fato, o surgimento dessa nova utopia de entrada no terceiro 201 milênio. Este é o enigma à espera de um Édipo que o desvende. 202 Na visão de Freitas, a sustentabilidade é princípio e valor constitucional, de caráter vinculante, possuindo o poder de modificar o modo de ver e praticar tanto direitos como deveres. Destaca que o modelo atual de insaciabilidade patológica e 198 VEIGA, José Eli da. Desenvolvimento sustentável: o desafio do século XXI. Rio de Janeiro: Garamond, 2010, p. 10. 199 VIOLA, E, J e OLIVIERI, A. Globalização, sustentabilidade e governabilidade democrática no Brasil. In: TRINDADE, A e CASTRO, M. F. A. A sociedade democrática no final do século. Brasília: Paralelo 15, 1997, p. 212. 200 FREITAS. Op. cit., 2011, p. 154. 201 VEIGA. Op. cit., p. 208. 202 FREITAS. Op. cit., 2011. 109 do crescimento econômico desmedido tem que estar atento à economia verde e aos princípios da precaução e prevenção. Alterca: Sustentabilidade, como valor e como princípios, exige lucidez ativa, isto é, não cair em falácias e armadilhas, no processo de tomada da decisão. Apenas a mudança de paradigma, liberdade de enganos e auto enganos [sic], com o consequente abandono da insaciabilidade patológica, é que se anuncia, num crescendo, capaz de garantir o primado, não propriamente das regras ou rules, mas dos princípios e dos direitos fundamentais, na 203 condição de diretrizes vinculantes do resiliente desenvolvimento... Inobstante a crítica ao discurso da sustentabilidade, convém destacar a preocupação acerca do modo de desenvolvimento a ser apreendido na atualidade. A proposta teve o mérito de introduzir a temática ambiental em fóruns nacionais e internacionais, conquistando um reconhecimento inédito na trajetória do ambientalismo. Não se trata de uma construção ingênua na medida em que revela uma hábil operação político-normativa e diplomática, empenhada em conciliar um conjunto de contradições não respondidas pelos modelos anteriores de desenvolvimento. O desenvolvimento sustentável deve ser entendido como um grande ideal, surgido no século XX, segundo Veiga, talvez comparável à antiga ideia de justiça social, valores fundamentais que expressam “desejos coletivos enunciados pela humanidade, ao lado da paz, da democracia, da liberdade e da igualdade” e que “compõem a visão de futuro sobre a qual a civilização contemporânea necessita 204 alicerçar suas esperanças”. A incompatibilidade entre economia e ecologia tem sido a tônica dos grandes eventos ambientais internacionais promovidos pela ONU, e se expressa na dificuldade em se definir compromissos e metas ambientais que representem algum tipo de restrição econômica. Derani esclarece que: Toda atividade humana consome e altera, isto é, nada que é envolvido pela atividade humana permanece como antes, pois onde há vida, há transformação... desenvolvimento da atividade econômica significa consumo de recursos; como alcançar o ideal de diminuição do consumo sem danificar o desenvolvimento econômico é uma questão fundamental não trabalhada 205 por estes ideólogos. 203 Idem, p. 150. 204 VEIGA. Op. cit., p. 14. 205 DERANI. Op. cit., 2008, p. 114. 110 O desenvolvimento sustentável passa por uma relação intertemporal ao vincular a atividade presente aos resultados no futuro. Assim, a ação humana não pode ser custeada pela escassez futura de recursos naturais, mesmo visando a uma vida melhor hoje. A sustentabilidade possui como base a composição dos valores materiais e a coordenação de valores de ordem moral e ética, ou seja, “uma justa distribuição de riquezas nos países e entre países, e uma interação dos valores sociais, onde se relacionam interesses particulares de lucro e interesses de bem- 206 estar coletivo”. São necessárias modificações institucionais, em sede de políticas públicas, planejando-se uma redistribuição das riquezas e dos ônus da atividade humana. A expansão da atividade econômica, indispensável ao bem estar mundial, deve estar atrelada, concomitantemente, a uma sustentabilidade econômica e ecológica. Parece ser impossível seguir com o desenvolvimento econômico nos moldes do final do segundo milênio por causar um acelerado e, por vezes, irreversível desgaste dos recursos naturais. A sustentabilidade é condição necessária para o crescimento econômico a fim de que o estoque desses recursos permaneça constante. Caso contrário, a economia não poderá mais cumprir os objetivos de satisfação social. Busca-se um desenvolvimento harmonioso entre economia e ecologia que deve “ser ajustado numa correlação de valores em que o máximo econômico reflita igualmente um máximo ecológico exigindo-se, para tanto, mudanças no estado da técnica e na 207 organização social”. A magnitude da crise contemporânea demanda um projeto de sustentabilidade que transcenda as fronteiras do mercado. O próprio discurso da sustentabilidade pressupõe uma articulação complexa que integra uma multiplicidade de fatores. Impõe-se a adoção de postura estatal ativa, considerando o caráter vinculante da norma constitucional ao determinar a compatibilização da ordem econômica e ambiental. O direito econômico e o ambiental não só se interceptam, mas possuem as mesmas preocupações: buscam a melhoria do bem- estar de todos e a estabilidade do processo produtivo. A estrutura normativa do 206 Idem, p. 111. 207 Idem, p. 113. 111 direito econômico objetiva garantir a existência digna da realização da justiça social; o direito ambiental, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. A despeito dessa confluência, disserta Derani: Qualidade de vida, proposta na finalidade do direito econômico, deve ser coincidente com a qualidade de vida almejada nas normas de direito ambiental. Tal implica que nem pode ser entendida como apenas o conjunto de bens e comodidades materiais, nem como a tradução do ideal de volta à natureza, expressando uma reação e indiscriminado desprezo a toda 208 elaboração técnica e industrial. A Constituição ocupa posição de estatuto orgânico e normativo do Estado de Direito, posto que lhe institui poderes e competências, capazes de delinear políticas. O Estado, órgão titular do poder político e único capaz de elaborar normas jurídicas que vinculam os fatos sociais, precisa efetivar o interesse de toda a coletividade por meio de ações concretas e, para tanto, necessita de recursos financeiros, na medida em que os bens jurídicos a serem postos à disposição de todos têm valor pecuniário. Portanto, o poder público possui força superior de desenvolver atividade financeira frente à economia de mercado. Reconhece-se que o Estado necessita de recursos pecuniários para cumprir com seus objetivos institucionais, o que se faz através da arrecadação de receitas. Dessa forma, a sociedade paga pelos serviços e bens colocados à sua disposição 209 pelo Estado. O tributo é a forma mais importante de arrecadação de receitas 208 Idem, p. 59. 209 A despeito das diferentes formas de arrecadação, Sacha Calmon identifica as diferenças entre o tributo e as outras formas de arrecadação financeira do Estado, que merece consideração. Veja- se: “O tributo legitima-se e diferencia-se das prestações pecuniárias e apropriações até agora referidas em função, precisamente, de sua hipótese de fato relacionada ao preceito. Tributo é toda prestação pecuniária em favor do Estado ou de pessoa por ele indicada, tendo por causa um fato lícito, previsto em lei, instituidor de relação jurídica, diferenciando-se da multa porque esta, embora prevista em lei em favor do Estado, decorre de um fato ilícito. Extrema-se da indenização porque esta, posto que também prevista em lei, tem por “razão de ser” prévia e comprovada lesão ao patrimônio alheio, inclusive o estatal. Contrapõe-se às prestações pecuniárias “contratuais” ou de jus gestionis, porque tais receitas decorrem de acordos de vontades (contrato). Enquanto o tributo é unilateralmente previsto em lei, o objeto de tais obrigações é ajustado ex voluntate, tendo por mira múltiplas situações (aluguel ou venda de coisas, contratos de mútuo, aplicações financeiras, prestações de serviços, etc.). Distingue-se, por sua vez, de outros deveres pecuniários de índole privada, como seguro obrigatório automobilístico, ou da obrigação alimentar, porque, nesses casos, o credor é pessoa jurídica de Direito Privado ou pessoa natural, e também, porque em tais casos, a cobrança não é feita mediante atividade administrativa plenamente vinculada à lei. E finalmente, diferencia-se das apropriações de dinheiro abandonado porque aí o fato, embora lícito e a contratual, não é causador de relação jurídica, pois a existência de dinheiro na condição res nullius ou res derelicta não é fundamento, razão, hipótese ou causa de uma obrigação. Em resumo, o que entrar em dinheiro para os cofres estatais, sob a forma de prestação pecuniária, o que exclui as entradas de caixa, como fianças e cauções, e as apropriações, que não sejam 112 sendo considerado um instrumento de ação insubstituível na economia capitalista e para que o Estado possa realizar os seus fins sociais. A ordem tributária funciona como efetivo instrumento de intervenção do Estado no domínio econômico e, considerando a visão não utópica do desenvolvimento sustentável aqui defendida, parece coerente a adoção do tributo ambiental na medida em que há “ligação entre o dever de contribuir do particular e o 210 dever de prestação do Estado, isto é, entre receita pública e o gasto público”. A tributação ambiental pode ser vista como instrumento de geração de recursos para o custeio dos serviços públicos de cunho ambiental e de orientação do comportamento do contribuinte. O direito tributário pode ir além da mera atividade arrecadatória, como será explicitado mais adiante, transcendendo a mera preocupação com os aspectos qualitativos do tributo para vislumbrar a justiça fiscal por meio de mecanismos de articulação com outras previsões constitucionais, posicionamento que valoriza a visão sistêmica e harmônica dos preceitos da ordem constitucional. Assim, pode-se influir no comportamento dos particulares e dos agentes econômicos incentivando condutas positivas e repelindo as que são nocivas à coletividade, constituindo parâmetros a justificar a sua utilização enquanto elemento apto a promover a proteção ambiental. Portanto, dentre os meios de prevenção e combate aos danos ocasionados ao ambiente, os tributos constituem instrumentos eficientes para a promoção e sua defesa, pois são capazes de onerar as atividades poluentes, através do aumento da carga tributária e incentivar as posturas de preservação e proteção ambiental. Neste sentido, esclarece José Marcos Domingues de Oliveira: Sem dúvida, entre os meios de prevenção e combate à poluição, o tributo surge como instrumento eficiente tanto para proporcionar ao Estado recursos para agir (tributação fiscal), como fundamentalmente para estimular condutas não poluidoras e desestimular as poluidoras (tributação extrafiscal) [...] assim, o Estado reconhece o esforço do cidadão em cumprir a lei, e não apenas castiga o recalcitrante; tributa-se menos – a título de 211 prêmio – quem não polui ou polui relativamente pouco. indenização, multa ou contrato, aluguel, juro, foro, laudêmio, ou preço, só pode ser tributo.” COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, pp. 381-382. 210 SOARES, Claudia Alexandra Dias Soares. O imposto ecológico – contributo para o estudo dos instrumentos económicos de defesa do ambiente. Coimbra: Coimbra, 2001, p. 65. 211 OLIVEIRA, José Marcos Domingues de. Direito Tributário e Meio Ambiente – 113 Não há dúvida que os tributos atuam como instrumentos da intervenção estatal na economia, assumindo uma postura ambiental quando orientados a incentivar os poluidores a buscar meios alternativos à degradação e promover a adequação comportamental a padrões ambientalmente desejáveis, sendo, inclusive, capazes de gerar receitas aptas a financiar medidas de política ambiental. A tributação ambiental no ordenamento brasileiro se mostra relevante ao bem-estar da coletividade, já que se caracteriza pelo emprego dos instrumentos tributários à geração de recursos direcionados à prestação de serviços públicos ambientais, bem como para direcionar a postura dos contribuintes à preservação da natureza, permitindo realizar a internalização das externalidades. A despeito das finalidades do tributo ambiental, Soares esclarece: Os tributos ambientais podem prosseguir uma finalidade recaudatória... ou uma finalidade extrafiscal – incentivante. Ambas as modalidades permitem realizar uma internalização das externalidades e têm um efeito estimulante, ainda que em grau diverso. Mas enquanto os primeiros, mais frequentes, visam recolher fundos a aplicar na despesa pública de natureza ambiental, operando, simultaneamente, uma redistribuição dos custos associados à defesa do equilíbrio ecológico por todos os sujeitos...; os segundos pretendem, em primeiro lugar, “incitar o poluidor a tomar por si próprio, pelo menor custo, as medidas necessárias para reduzir a poluição, escolhendo 212 vias alternativas de actuação... Destaca-se a importância da inclusão de dispositivos específicos sobre a função ambiental dos tributos no Sistema Tributário Constitucional. Esse ramo do direito deve desempenhar papel relevante neste contexto, por meio da integração das normas tributárias às recentes exigências socioambientais, utilizando-se dos 213 instrumentos jurídicos disponíveis para fomentar o desenvolvimento projetado para o futuro. A sustentabilidade ambiental constitui parâmetro atual e requisito indispensável à concessão de benefícios a partir da indissociável correlação existente entre os princípios da dignidade da pessoa e a defesa do meio ambiente. proporcionalidade, tipicidade aberta, afetação da receita. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2007, p. 38-39. 212 SOARES. Op. cit. p. 292. 213 Inúmeras são as possibilidades da utilização do tributo ambiental: ICMS ecológico; o incentivo ao Etanol; incentivos fiscais as energias “limpas”: biodiesel, energia solar, energia eólica, etc.; ações na Bolsa de Valores, através do Mercado de Carbono, previsto no Protocolo de Kyoto, dentre outros. 114 Importa destacar que a Constituição é instrumento de disciplina jurídica para o futuro, o que implica dizer que a dignidade será prospectivamente alcançada somente se realizado, no presente de produção econômica de bens e serviços e de consumo coletivos sustentáveis ao longo do tempo. O desenvolvimento sustentável é pressuposto fundamental à eficácia jurídica e à efetividade concreta da própria dignidade das gerações futuras, motivo pelo qual constitui verdadeiro vetor axiológico constitucional implícito primário. Não deve deixar de ser observada na seara tributária, pois fundamenta-se na tese de que é princípio constitucional relacionado com inúmeras outras áreas, não apenas vinculado ao direito ambiental. Nessa forma, a tributação, sob a visão da sustentabilidade, deve ser norteada pelo critério da longevidade da política pública e voltada a interesses de curto prazo. Assim, uma política pública tributária deve ser concebida por parâmetros que visualizem uma racionalidade de longo prazo, comprometida com as atuais e futuras gerações. Portanto, com as inovações tecnológicas voltadas a preservação ambiental, sua defesa na produção econômica de bens e serviços deve constituir novo parâmetro a ser considerado com os demais valores e princípios para o status de requisito indispensável à concessão de favores fiscais. Assim, uma proposta legislativa positivadora deve estar expressa no sistema normativo infraconstitucional com vista a eficácia progressiva da sustentabilidade ambiental e pressuposto à concessão de benefícios fiscais no Brasil. Percebe-se a necessidade de uma mudança de paradigmas, com profundas reflexões a respeito das funções políticas, sociais e econômicas da tributação, de modo a coaduná-las às novas realidades e necessidades humanas, rumo à 214 construção do “direito tributário das futuras gerações”. 214 SCAFF, Fernando Facury. TUPIASSU, Lise Vieira da Costa. Tributação e políticas públicas: o ICMS Ecológico. In Direito tributário ambiental. Heleno Taveira Tôrres (org). São Paulo: Malheiros, 2005, p. 724. 115 3. 2 O Tributo Ambiental e sua Função Extrafiscal A Constituição Federal de 1988 prevê a garantia de um meio ambiente ecologicamente equilibrado, incumbindo ao Poder Público, tal tarefa. Ela preceitua como princípio da ordem econômica a defesa do meio ambiente, sugerindo a utilização, pelo Estado, de políticas públicas eficientes no combate à abusiva utilização dos recursos naturais, autorizando a utilização dos meios necessários ao seu alcance. Contudo, percebe-se que os remédios jurídicos utilizados até então não são suficientes à cura da saúde ambiental. É notória a força do poder econômico como remédio jurídico no controle e modificação do comportamento humano, portanto, uma política pública tributária torna-se um instrumento vinculado à tutela dos bens ambientais. Hodiernamente, no Estado Socioambiental brasileiro, uma política pública tributária ambiental volve-se ao alcance do desenvolvimento sustentável que 215 segundo Derani, representa um desafio complexo para as sociedades contemporâneas, considerando ainda, sua conexão com a política econômica. Não se trata, pois, apenas considerar a preservação dos recursos ambientais, mas também de assegurar condições de vida digna à população, propiciando que parcelas da sociedade não sejam excluídas do processo de desenvolvimento sustentável. Uma política tributária ambiental de valia é aquela capaz de proporcionar uma efetiva contribuição, v.g., concedendo isenções para aqueles que se comportem a favor do ambiente. De grande proveito é a utilização do Direito Premial, no qual a norma estabelece incentivo e sanção positiva, essa função promocional estimula o comportamento tido como desejável e, portanto, o Direito não se restringe a proibir, obrigar ou permitir, como outrora era delimitado. Não se pode reduzir o Direito à aplicação de sanção – pensamento base do positivismo normativista da 216 Teoria Pura do Direito de Hans Kelsen. 215 DERANI. Op. cit. 2008, p. 110. 216 Em que trata do Direito como uma ordem coativa: “Uma outra característica comum às ordens sociais a que chamamos Direito é que elas são ordens coativas, no sentido de que reagem contra as situações consideradas indesejáveis, por serem socialmente perniciosas – particularmente contra condutas humanas indesejáveis – com um ato de coação, isto é, com um mal – como a privação da vida, da saúde, da liberdade, de bens econômicos e outros -, um mal que é aplicado ao destinatário mesmo contra sua vontade, se necessário, emprestando até força física – coativamente, portanto. Dizer-se que, com o ATO COATIVO que funciona como sanção, se aplica 116 Bobbio alerta sobre essa função do Direito ao alterar o caráter normativo como mero impositor de sanções negativas, como um ordenamento protetivo- repressivo. É indispensável o uso de técnicas de encorajamento, através de incentivos e prêmios, assim, o ordenamento jurídico exercerá a importante função 217 promocional. Esta faceta do Direito é uma excelente ferramenta na política tributária, como nos esclarece Melo Filho: Manifesta-se, igualmente, a Ação direta do Estado, pelo oferecimento de prêmios e estímulos àqueles que adotam a linha pretendida pelo Estado (...) configurando-se, aí, a sanção premial, que tem prefeita identificação, principalmente com a natureza jurídica dos estímulos financeiros e fiscais, 218 largamente em uso na política tributária atual. Muito embora a política pública possa também ser exercida por particulares, o Estado é o único capaz de fazer valer o direito premial, na medida em que é o único imbuído do poder de oferecer prêmios e impor sanções. As políticas públicas que utilizam como instrumento a tributação são capazes de alcançar inúmeros objetivos, no campo político, econômico, social a até ambiental. Nesse caso específico, servindo de instrumento de mudança comportamental na proteção do meio ambiente. Fica patente a desvinculação do Direito Tributário como instrumento exclusivo para o alcance de objetivos de cunho financeiro diante de sua peculiar característica de um instrumento político. Essa função extrafiscal dos tributos em que se operacionalizam benefícios tributários representa um estímulo face à perspectiva de aquisição de um benefício financeiro. Evidenciada a relevância jurídica desse instrumento jurídico intervencionista do Estado e, atentando-se às metas socioambientais, insculpido no inciso I do artigo 219 151 da Carta Magna, não resta dúvida de que se trata de remédio a ser utilizado uma mal ao destinatário, significa que este ato é normalmente recebido pelo destinatário como um mal”. Adiante, p. 37: “Dizer que o Direito é uma ordem coativa significa que as suas normas estatuem atos de coação atribuíveis à comunidade jurídica. Isto não significa, porém, que em todos os casos sua efetivação se tenha de empregar COAÇÃO FÍSICA. Isto só deverá suceder quando essa efetivação encontrar resistência, o que não é normalmente o caso”. In KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 2009, p. 36. 217 BOBBIO, Norberto. Dalla struttura Alla funzione: nuovi studi di teoria dal diritto. Milano: Edizioni di Comunità, 1984, p. 24. 218 MELO FILHO, Álvaro. Teoria e prática dos incentivos fiscais: introdução ao direito premial. Rio de Janeiro: Eldorado Tijuca, 1976, p. 186. 219 CF/88: Art. 151. É vedado à União: I - instituir tributo que não seja uniforme em todo o território 117 francamente na seara do Direito Ambiental. Sobre a importância do papel do tributo como ferramenta transformadora da sociedade, Justen Filho esclarece que: O direito tributário não é apenas um conjunto de normas repressivas da atuação estatal, mas apresenta também uma função promocional, para utilizar o pensamento de Bobbio. Apenas através da conjugação e efetivação de suas diversas funções é que se realizarão os desígnios constitucionais e nos aproximaremos da sociedade mais justa que nos 220 comprometemos a produzir. A utilização de uma política tributária como remédio jurídico à crise ambiental representa avanço, haja vista a experiência de países da União Europeia, Estados Unidos, Austrália, Japão, entre outros, que têm obtido resultados importantes. No Brasil, a iniciativa do legislador ainda é incipiente, é necessário atenção para a relevância da implementação de uma tributação com fins ecológicos, assim como, para uma consciência da dimensão do problema ambiental a ser atendido. A tributação ambiental pode ter por finalidade, tanto a geração de recursos para custear serviços públicos de natureza ambiental, como a orientação do comportamento dos contribuintes para a preservação do meio ambiente através de 221 incentivos. Diante dessas peculiaridades, o sistema de tributos ambientais foi recomendado pela Conferência da Organização das Nações Unidas para o Meio Ambiente em 1992, como ferramenta salutar à preservação ambiental. O que se observa no Brasil é, por um lado, a fúria arrecadatória que, muitas vezes, inibe o poder público de instituir benefícios fiscais e, por outro, a falta de consciência ecológica do contribuinte, que acaba burlando os fins da lei de incentivo. Sobre a importância da tributação ao não servir apenas para auferir receitas, com a instituição de novos tributos ou a majoração dos existentes, e sua utilização em políticas públicas no estímulo à formação de uma consciência ecológica, discorre Figueiredo: nacional ou que implique distinção ou preferência em relação a Estado, ao Distrito Federal ou a Município, em detrimento de outro, admitida a concessão de incentivos fiscais destinados a promover o equilíbrio do desenvolvimento socioeconômico entre as diferentes regiões do País. 220 JUSTEN FILHO, Marçal. Sistema constitucional tributário: uma aproximação ideológica. Revista da Faculdade de Direito da UFPR. Curitiba: n. 30, 1998, p. 233. 221 COSTA, Regina Helena. Princípio da capacidade contributiva. São Paulo: Malheiros, 1996, p.34. 118 A criatividade do homem não tem limites. É preciso realmente incentivá-la, de tal maneira que o meio ambiente possa ser preservado, não com a oneração da carga tributária, repito, mas com instrumentos de política extrafiscal. Eu também acredito que o melhor mecanismo para a preservação ambiental e recuperação do meio ambiente seja a utilização dos chamados impostos indiretos, através do princípio da seletividade, como um dos mecanismos, podendo graduar a produção e o consumo através de incentivos, gradação de alíquotas, isenções, restituições, figuras 222 premiais do direito tributário etc. O sistema tributário nacional possui várias modalidades de tributos (imposto, taxas, contribuição de melhoria, empréstimo compulsório e contribuições especiais), com incidência sobre quase todas as atividades (circulação de mercadoria, produção de bens, auferição de renda...) prestação de serviços e bens (imóveis, automóveis), podendo ser utilizado por todos os entes federativos (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), razão porque se pode afirmar ser utilizado como instrumento do controle ambiental em todo território nacional e de incidência sobre bens, serviços... Basta, quiçá, uma política pública consciente, informada e empenhada na solução dos problemas. Mister a aplicação de uma política tributária eficiente e eficaz a fim de que o efeito jurídico pretendido seja efetivamente alcançado. Em outras palavras, os incentivos fiscais devem ser ecologicamente orientados. O Estado deve estar atento para que a política tributária ambiental não se limite tão somente a desonerar o contribuinte que efetivamente esteja contribuindo com a proteção ou conservação ambiental, sob pena de se perder o foco do benefício desejado, seja elaborando norma eficaz, seja fiscalizando seu cumprimento. Ressalta-se que não basta a elaboração de norma fiscal, mesmo que em desatenção aos preceitos fundamentais do sistema tributário como aconteceu com a Lei 9.960/2000, que instituía a cobrança da Taxa de Fiscalização Ambiental (TFA), 223 declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal na ADIn 2.178-8/DF por 222 FIGUEIREDO, Marcelo. Tributação, ecologia e meio ambiente. Revista de Direito Tributário. São Paulo: Malheiros, n. 78, 2001, pp. 83-84. 223 O STF em sede de liminar considerou inconstitucional a TFA e em 14/02/2001 foi julgado prejudicial a ADIn vez que foi editada a lei 10.165, DE 27.12.2000 que alterou o teor do artigo objeto da ação, diz a decisão liminar: EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGO 8º DA LEI Nº 9.960, DE 28.01.2000, QUE INTRODUZIU NOVOS ARTIGOS NA LEI Nº 6.938/81, CRIANDO A TAXA DE FISCALIZAÇÃO AMBIENTAL (TFA). ALEGADA INCOMPATIBILIDADE COM OS ARTIGOS 145, II; 167, IV; 154, I; E 150, III, B, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Dispositivos insuscetíveis de instituir, validamente, o novel tributo, por haverem definido, como fato gerador, não o serviço prestado ou posto à disposição do contribuinte, pelo ente público, no exercício do poder de polícia, como previsto no art. 145, II, da 119 apresentar hipótese de incidência de um imposto. Atente-se para a relevância do incremento de incentivos e desestímulos fiscais (formas tributárias exonerativas ou redutoras da carga tributária) a serviço da proteção do meio ambiente, uma vez que estimula nos contribuintes um comportamento considerado de interesse ao objetivo da política pública ambiental. Sobre este mecanismo de incentivo a doutrina nos esclarece: Ora, entre os numerosos e diversos meios ou instrumentos de que a política (de defesa) do ambiente vem lançando mão, conta-se, como um dos mais importantes instrumentos de orientação indirecta [sic] ou mediata dos comportamentos ou condutas (dos particulares), a extrafiscalidade nas duas modalidades ou manifestações de que vimos falando: 1) a contenção, ou, cerceamento das actuações [sic] antiambientais através duma maior tributação concretizada em imposto ecológico ou até em agravamentos ecológicos de impostos (consubstanciada, por exemplo, na não dedução ou no estabelecimento de limites mais baixos à dedução de despesas com a utilização de veículos poluentes como os automóveis, ou na fixação de taxas mais elevadas relativamente a impostos sobre consumos causadores de danos ambientais); 2) o estímulo ou incentivo das actuações [sic] 224 filoambientais através de eco-benefícios fiscais. Pode parecer, num primeiro momento, que essa limitação à competência impositiva seja uma desvantagem financeira, na medida em que o Estado deixa de arrecadar recursos, indispensáveis à movimentação da máquina pública. Entretanto, o custo ecológico para a recuperação do dano é muito maior do que o tributo que deixou de ser recolhido ao beneficiar o ato protetivo. A utilização de tal ferramenta já foi empregada no Imposto sobre Produtos Industrializados (Decreto Federal 755/93, Medida Provisória 75/2002), Imposto de Renda (Lei Federal 5.106/66), Imposto de Circulação de Mercadoria, em alguns Estados denominado de ICMS ecológico e Imposto Predial Urbano em seletos Carta Magna, mas a atividade por esses exercida; e como contribuintes pessoas físicas ou jurídicas que exercem atividades potencialmente poluidoras ou utilizadoras de recursos ambientais, não especificadas em lei. E, ainda, por não haver indicado as respectivas alíquotas ou o critério a ser utilizado para o cálculo do valor devido, tendo-se limitado a estipular, a forfait, valores uniformes por classe de contribuintes, com flagrante desobediência ao princípio da isonomia, consistente, no caso, na dispensa do mesmo tratamento tributário a contribuintes de expressão econômica extremamente variada. Plausibilidade da tese da inconstitucionalidade, aliada à conveniência de pronta suspensão da eficácia dos dispositivos instituidores da TFA. Medida cautelar deferida. DI 2178 MC / DF - DISTRITO FEDERAL 
 MEDIDA CAUTELAR NA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 
 Relator (a): Min. ILMAR GALVÃO 
 Julgamento: 29/03/2000. Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28+2178%2ENUME%2E+ OU++2178%2EACMS%2E%29&base=baseAcordaos 224 NABAIS, José Casalta. O dever fundamental de pagar impostos: contributo para compreensão constitucional do estado fiscal contemporâneo. Coimbra: Almedina, 1998, pp.651-652. 120 municípios brasileiros. A CF/88, ao proclamar terem todos, direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, determinou a repartição do dever de preservação entre o Poder Público e a sociedade, sendo que sobre a tributação ambiental, aquele deve estabelecer as regras de proteção e estes podem usufruir dos benefícios tributários ou curvar-se às punições legais. O estudo está direcionado à relevância do incentivo tributário a fim de proporcionar um ambiente sadio e uma boa qualidade de vida ao homem como garantia ao direto à higidez do meio ambiente. A extrafiscalidade nada mais é do que o emprego de regras tributárias que vão além da mera captação de recursos financeiros para o Estado e importa uma inteligente maneira de atingir sua mais nova atribuição constitucional de proteção do ambiente. O Estado pode se utilizar dos tributos com o intuito de estimular comportamento protetivo ou inibir a adoção de condutas maléficas, mesmo que não haja arrecadação financeira. É necessário encontrar meios para combater a crise ambiental não só socorrendo-se da ciência jurídica como de todas as outras ciências, face à interdisciplinaridade da questão posta, bem como, empregar todos os recursos que cada uma oferece. A Conferência Mundial Sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Brasil em 1992, evento em que foi aprovada a Agenda 21, apurou que apenas os instrumentos de comando e controle não têm sido eficazes na proteção do meio ambiente, pois não basta apenas utilizar-se de ordens coativas aos infratores da natureza, mas sim, estimular uma postura ativa protetiva. A proteção ambiental não deve ser adotada apenas por ações governamentais, mas também por ações da iniciativa privada, na medida em que a tarefa/dever incumbe solidariamente a todos. Os instrumentos econômico- financeiros possuem de grande importância, mormente as espécies tributárias, que surgem como armas de corresponsabilidade dos particulares na proteção do bem comum. Dessa forma, a doutrina tem ficado mais atenta às inúmeras vantagens oferecidas pelo denominado tributo verde. Ao tratar da relação entre meio ambiente e direito tributário, Ribas leciona: O direito ambiental transpassa diferentes áreas jurídicas, que se devem 121 levar em conta princípios de natureza ambiental, por isso chamado de horizontal e também de integração, uma vez que se penetra em todos os setores do direito, para neles introduzir a ideia ambiental. A tributação atua basicamente sobre fatores econômicos, que têm que estar de acordo com princípios estabelecidos no direito ambiental. A atividade legislativa deve implementar os instrumentos jurídicos e, entre eles, os tributários são de extremar relevância e eficácia, pois se revelam hábeis à proteção do 225 ambiente. A tributação ambiental brasileira poderia estar mais desenvolvida. Porém, isso não ocorre pela falta de conhecimento dos agentes públicos da potencialidade da utilização do tributo como ferramenta de transformação ambiental e pela falta de uma conscientização ecológica global. Não se pretende concluir, outrossim, que uma política pública tributária voltada ao ambiente é a chave para a solução da crise, mesmo porque, a questão ambiental é intrincada. Todavia, pode-se afirmar que esta ferramenta é de grande relevância no combate à crise ambiental, na medida em que intervém diretamente na dinâmica econômica da ordem social. A utilização do tributo pode servir como ferramenta para se atingir uma finalidade direcionada a determinado objetivo, como geração de recursos para custear serviços públicos de cunho ambiental, custear meios estratégicos a uma orientação de uma reeducação socioambiental e do comportamento do contribuinte para um meio ambiente voltado para a sustentabilidade. Através dessa concepção jurídica, voltada a múltiplos objetivos, surge uma dupla faceta dos tributos, vistos antes apenas como meios arrecadatórios de recursos financeiros, despontando então uma ideia pautada em instrumentos 226 eficientes para a persecução de finalidades ambientais. Assim, ao se falar em tributação ambiental como forma de assegurar um desenvolvimento econômico sustentável, a extrafiscalidade mostra ser mais um caminho ao combate à má gestão dos recursos postos na natureza, bem como, mecanismo indutor de comportamentos do sujeito passivo da obrigação tributária. Embora o texto constitucional brasileiro não estabeleça expressamente a aplicação desse fenômeno, em relação aos tributos está implicitamente reconhecido no artigo 151, 225 RIBAS, Lídia Maria Lopes Rodrigues. Defesa ambiental: utilização de instrumentos tributários. In: TÔRRES, Heleno Taveira. Da relação entre competências constitucionais tributária e ambiental – os limites dos chamados "tributos ambientais". In: TÔRRES, Heleno Taveira (Org.). Direito tributário ambiental. São Paulo: Malheiros, 2005. (p.675 – 723), pp.684-685. 226 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. São Paulo: Saraiva, 1993. 122 227 I, ocasião em que faculta ao Estado sua utilização para prover o equilíbrio e o desenvolvimento do país. A conjugação dos preceitos da ordem econômica com os da defesa ambiental resultam no desenvolvimento sustentável. O uso da extrafiscalidade tributária constitui um estímulo para que as condutas fiquem em sintonia com a preservação, pois é capaz de ora incentivar, ora desestimular, atuando por meio de reduções, isenções, suspensões, tributação progressiva ou até mesmo restituições. Becker esclarece: [...] na construção jurídica de todos e de cada tributo, nunca mais estará ausente o finalismo extrafiscal, nem será esquecido o fiscal. Ambos coexistirão sempre – agora de um modo consciente e desejado – na construção jurídica de cada tributo; apenas haverá maior ou menor prevalência neste ou naquele sentido, a fim de melhor estabelecer o 228 equilíbrio econômico-social do orçamento cíclico. A política fiscal moderna não adota mais uma postura neutra. Hoje as finanças estatais se regem por finanças funcionais, isto é, uma atividade financeira orientada no sentido de influir sobre a conjuntura. Consolidando-se o intervencionismo estatal, o tributo demonstra uma capacidade especial ao alcance dos fins públicos específicos, funcionando como ferramenta que influi diretamente nos direitos econômico e fiscal. Assim, as políticas governamentais devem ser 229 orientadas na esteira do interesse público. Com tamanhas vantagens, espera-se a ampliação do emprego da extrafiscalidade pelo poder público. Sobre os objetivos do tributo para além da arrecadação, Machado discorre: No estágio atual das finanças públicas, dificilmente um tributo é utilizado apenas como instrumento de arrecadação. Pode ser a arrecadação o seu principal objetivo, mas não é o único. O tributo também é largamente utilizado com o objetivo de interferir na economia privada, setores 227 CF/88: Art. 151. É vedado à União: I - instituir tributo que não seja uniforme em todo o território nacional ou que implique distinção ou preferência em relação a Estado, ao Distrito Federal ou a Município, em detrimento de outro, admitida a concessão de incentivos fiscais destinados a promover o equilíbrio do desenvolvimento sócio-econômico entre as diferentes regiões do País; II - tributar a renda das obrigações da dívida pública dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, bem como a remuneração e os proventos dos respectivos agentes públicos, em níveis superiores aos que fixar para suas obrigações e para seus agentes; III - instituir isenções de tributos da competência dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios. 228 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. 3. ed. São Paulo: Lejus, 2002, p. 597. 229 BALEEIRO, Aliomar; CAMPOS, Dejalma de (atualizador). Uma introdução à ciência das finanças. 15. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p.30. 123 econômicos ou regiões, desestimulando o consumo de certos bens e 230 produzindo, finalmente, os mais diversos efeitos na economia. Considerando as diretrizes do atual Estado Socioambiental de Direito, é primordial que os comandos de otimização de condutas ambientais estejam presentes em toda a amplitude de organização estatal, reservando às diretrizes da ordem econômica, que dispõe sobre o dever de assegurar “a defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado, conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação”. A extrafiscalidade tributária é instrumento a ser utilizado pelas políticas públicas, pois é capaz de concretizar a ação do Estado sobre o domínio 231 econômico, já que se trata de uma orientação econômica dirigida pelo Estado através de estímulo ou desestímulo da atividade econômico. Carrazza, sobre a efetividade da função extrafiscal dos tributos, leciona: Por outro lado, ao utilizar o mecanismo da extrafiscalidade para estimular comportamentos (comissivos ou omissivos) dos contribuintes, o Estado quase sempre obtém vantagens maiores do que se previamente arrecadasse os tributos para, depois, aplicá-los aos gastos públicos. Realmente, com a supressão das instâncias burocráticas encarregadas de controlar a destinação do dinheiro obtido mediante o exercício da tributação, a despesa pública tende a diminuir, sem prejuízo do atendimento das 232 exigências de estabilidade e progresso sociais. Modifica-se o conceito de justiça fiscal ao não se levar em consideração a capacidade econômica do contribuinte, mas sim um benefício pró-natureza. Todavia, necessária mudança no agir do legislador, exigindo dele conhecimento de sua capacidade de intervenção em fazer uso desse instrumento, na medida em que a extrafiscalidade não se coaduna com omissão governamental. O Estado passa a assumir uma posição indutora da ação do indivíduo, quando estimula atitudes ambientalmente benéficas ou inibe as tidas por prejudiciais num agir harmonioso com os princípios ambientais. Oliveira disserta: 230 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 11. ed. São Paulo: Malheiros, 1996. p. 46. 231 GOUVÊA, Marcus de Freitas. A extrafiscalidade no direito tributário. Belo Horizonte: Del Rey, 2006, p. 43. 232 CARRAZZA. Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 25. 124 A extrafiscalidade permite ao contribuinte alternativa de escolha de gravame mais ameno [...] sem dúvida, entre os meios de prevenção e combate à poluição, o tributo surge como instrumento eficiente tanto para proporcionar ao Estado recursos para agir (tributação fiscal), como fundamentalmente para estimular condutas não-poluidoras e desestimular as poluidoras (tributação extrafiscal), encontrando para tal sólidos fundamentos na doutrina kelseniana da sanção premial ou recompensa tória, por sua vez, estribada no princípio retributivo (Vergeltung): assim, o Estado reconhece o esforço do cidadão em cumprir a lei, e não apenas castiga o recalcitrante. 233 É relevante se destacar o papel interventor e monopolístico do poder do Estado na condução do comportamento dos indivíduos, pois estes acabam agindo adstritos a seus próprios interesses. O Poder Público tem o dever de restringir a conduta às finalidades públicas descritas no texto constitucional. A extrafiscalidade sinaliza os novos caminhos que o direito tributário deve trilhar no século XXI. É um dos instrumentos mais racionais e eficientes que a Administração dispõe para efetivar os valores constitucionais. Superada a fase em que o Estado era visto como o "Leviatã" de Hobbes, em que o fundamento dos tributos decorria exclusivamente do poder de império do Estado, a tributação vai paulatinamente absorvendo os insumos 234 constitucionais, na busca do bem-estar social. Portanto, os fins extrafiscais no emprego dos tributos se caracterizam como relevantes instrumentos para que se concretize o direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente saudável, possibilitando uma consolidação do desenvolvimento sustentável e a melhoria da qualidade de vida. 233 OLIVEIRA, José Marcos Domingues de. Direito tributário - capacidade contributiva: conteúdo e eficácia do princípio. Rio de Janeiro: Renovar, 1998, p. 38. 234 PINTO, Tibério Carlos Soares Roberto. Seletividade ambiental do IPI: um novo modelo de tributação para um novo modelo de cidadão. Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010, p. 4385. Disponível em: http://www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/anais/fortaleza/3796.pdf 125 3.3 A Aplicação do Princípio do Poluidor-Pagador na Tributação Ambiental como Forma de Internalização das Externalidades Negativas A natureza como fornecedora de matéria prima e, consequentemente, fonte de produção econômica, constitui motivo de preocupação, tendo em vista sua eminente finitude. Portanto, é indispensável a adoção de estratégias baseadas nos princípios jurídicos para prevenir danos possíveis, bem como, para reorientar as atividades potencialmente destruidoras, a fim de implementar estratégias de sustentabilidade. Um princípio ambiental constitui uma construção teórica, que tem por meta orientar as diretrizes traçadas pelo direito do ambiente, encadeando uma logicidade entre todos os demais instrumentos normativos, com o fim precípuo de fornecer um caminho sólido, com racionalidade e harmonia às ações políticas de todas as esferas de poder do Estado. Pretende, outrossim, detectar os efeitos indesejados do atual modelo de desenvolvimento econômico coibindo-os através de planejamento de conservação ambiental. Destaca Rehbinder que “Os princípios guardam a capacidade, quando compreendidos como princípios jurídicos gerais, de influenciar a 235 interpretação e a composição de aspectos cinzentos dos direitos ambientais”. O princípio do poluidor-pagador é aplicado ao direito ambiental, inspirado na 236 teoria econômica, o qual determina a “internalização dos custos relativos externos de deterioração ambiental” impondo-se, assim, ao poluidor “arcar com os custos da 237 diminuição ou afastamento do dano”. No texto constitucional, o princípio do poluidor-pagador foi estabelecido no artigo 225, em seu parágrafo 3º, in verbis: “As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, às sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”. No âmbito internacional, a Organização para Cooperação e para o 235 REHBINDER, Eckard. Politische und rechtlich. Apud DERANI, Cristiane. Direito ambiental econômico. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 141. 236 Segundo o direito econômico, os custos sociais externos que acompanham a produção industrial devem ser internalizados, quer dizer, tomados em conta pelos agentes econômicos, nos seus custos de produção. 237 DERANI. Op. cit., 2008, p. 142. 126 238 Desenvolvimento Econômico (OCDE), através da Recomendação C (72) 128, de maio de 1972, assim definiu o princípio do poluidor-agador: [...] o princípio que usa para afetar os custos das medidas de prevenção e controle da poluição, para estimular a utilização racional dos recursos ambientais escassos e para evitar distorções ao comércio e ao investimento internacionais, é o designado princípio do poluidor-pagador. Este princípio significa que o poluidor deve suportar os custos do desenvolvimento das medidas acima mencionadas decididas pelas autoridades públicas para 239 assegurar que o ambiente esteja num estado aceitável [...] Segundo a aplicação do princípio do poluidor-pagador, v.g., o agente poluidor deve ser atingido por uma tributação que deve, segundo a linguagem econômica, ser igual ao prejuízo marginal social por unidade produzida ou por unidade de poluição emitida. Assim, o prejuízo marginal social corresponderá à diferença entre os custos marginais sociais e privados. O escopo dessa tributação é a eficiência econômica e a defesa do meio ambiente. Enquanto a eficiência é alcançada quando os responsáveis pela poluição arcam com os custos sociais. A defesa do meio ambiente dá-se através da elevação de custos dos produtos poluentes, causada pela tributação. Encarecendo o produto que polui, modificam-se os preços, redireciona-se a demanda para produtos menos poluentes. Nesse processo, estimulam-se as alterações a ser realizadas no processo produtivo, gerando redução dos níveis de poluição. É importante destacar que esse princípio não implica em se permitir ou autorizar a poluição e, muito menos, se pagar para poluir. A premissa, ao contrário, procura garantir a reparação econômica de um dano conquanto não for possível evitá-lo, através das medidas de precaução. Nessa senda, o princípio do poluidor- pagador não se reduz à finalidade compensatória do dano ao meio ambiente, engloba os custos necessários para a precaução e prevenção, bem como sua adequada repressão. A despeito do tema, Antunes ressalta que a aplicação do referido princípio deve ser feita com ponderação, justamente para evitar que se transforme num 238 Fazendo referência à definição dada pela Organização para o Comércio e Desenvolvimento Econômico, substituída nos dias atuais pela OMC – Organização Mundial do Comércio: “the greater the cost share by the polluter, the greater the adherence to the polluter-pays principle”, ou traduzindo: “quanto maior for a parcela de custos suportada pelo poluidor, maior será a satisfação do princípio do poluidor- pagador”. 239 ARAGÃO. Op. cit., p. 60. 127 instrumento que “autorize” a poluição ou que permita a “compra do direito de 240 poluir”. Dessa forma, evita-se que a atividade poluente não traga, em nenhuma hipótese, benefícios econômicos para o poluidor. Os custos das medidas preventivas devem ser mais baratos em relação aos custos da reparação dos efeitos decorrentes da lesão ambiental. A aplicação desse princípio, na seara tributária, todavia, pode ter o inconveniente de o agente poluidor transferir esse custo ao consumidor. Assim, a imposição de um custo ao poluidor não é causa determinante de que o dano será eliminado. A questão é que se deve entender tal diretriz no sentido de orientação. Eventualmente, por questão de política pública, o Estado pode determinar que o causador do dano não deva cobrir a totalidade dos custos oriundos de sua atividade, mas cobrir os custos das medidas ambientais dos objetivos públicos de qualidade 241 ambiental, aplicando-se o princípio do ônus social de forma subsidiária. Sob sua dimensão econômica, um aspecto a se destacar nesse princípio é a repercussão dos custos sociais da poluição ou os efeitos negativos que decorrem da atividade produtiva. A correção dos custos adicionais da atividade poluidora atenua as falhas do mercado e desonera a sociedade da responsabilidade direta pela poluição, constituindo característica dessa diretriz ambiental. Para Benjamin a internalização das externalidades é objetivo principal do referido princípio: [...] o objetivo maior do princípio do poluidor pagador é fazer com que os custos das medidas de proteção do meio ambiente – as externalidades ambientais – repercutam nos custos finais de produtos e serviços cuja produção esteja na origem da atividade poluidora. Em outras palavras, busca-se fazer com que os agentes que originaram as externalidades assumam os custos impostos a outros agentes, produtores e/ ou 242 consumidores. A despeito do objetivo do referido princípio, Derani destaca que se assemelha ao princípio da contabilização de custos: 240 ANTUNES. Op. cit. 241 De acordo com esse princípio, considerado a antítese do princípio do poluidor-pagador, as medidas de implementação da qualidade ambiental devem ter seus custos suportados pela coletividade, o que faz diminuir a carga de impostos que recairia sobre o particular. Tem por objetivo aliviar o mercado da contabilização dos custos ambientais e serve como instrumento de política pública para relativizar o princípio do poluidor-pagador. 242 BENJAMIN, Antônio Herman. Dano ambiental, prevenção, reparação e repressão. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993, p. 229. 128 A objetivação deste princípio pelo direito ocorre ao dispor ele de normas definidoras do que pode e do que não se deve fazer, bem como regras flexíveis tratando de compensações, dispondo inclusive sobre taxas a serem pagas para a utilização de determinado recurso natural. De fato, o princípio do poluidor-pagador concretiza-se por meio da obrigação do poluidor de diminuir, evitar e reparar danos ambientais, com os instrumentos clássicos do direito, bem como por intermédio de novas normas de produção e 243 consumo. A internalização dos custos sociais decorrentes da poluição constitui o foco da problemática ambiental. Baseada em uma teoria econômica, exige-se do Estado uma atuação política no incremento de instrumentos para a estruturação de uma política ambiental sólida, voltada ao processo de prevenção, repressão e reparação. Portanto, em sendo o agente poluidor identificado, a coletividade não pode ser onerada, arcando ela com o custo de reparação, bem como, com os demais efeitos decorrentes da atividade degradante. No atual contexto, infelizmente, não há como negar que tal ônus econômico e ambiental dos danos ainda sejam suportados pela sociedade, pois que nesse processo os custos são, na maioria das vezes, incorporados no preço final dos produtos ou serviços. As diretrizes do Direito Ambiental são fundamentalmente preventivas, estando direcionadas para o momento anterior ao da consumação do dano, assim, sua preocupação é o mero risco pois que a reparação sempre é excessivamente onerosa e, muitas vezes, inexequíveis. A aplicação do princípio do poluidor-pagador se coaduna com as exigências da tutela dos direitos difusos e coletivos, reconhecidos constitucionalmente e amplamente discutidos. A aplicação do princípio do poluidor-pagador na seara ambiental é, portanto, um instrumento de internalização das externalidades negativas, a qual é descrita como meta da Agenda 21, no documento final da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro, em 1992, que estabeleceu em seu princípio 16: “As autoridades nacionais deverão esforçar-se por promover a internalização dos custos ambientais e a utilização de instrumentos econômicos, tendo em conta o princípio de que o poluidor deverá, em princípio, suportar o custo da poluição, com o devido respeito pelo interesse público e sem distorcer o comércio e investimento internacionais”. Na medida em que o homem percebeu que os bens e serviços ambientais são finitos e que a sua escassez compromete a qualidade de vida, alguns 243 DERANI. Op. cit. 2008, p. 143. 129 reconheceram a imprescindibilidade da adoção de políticas públicas ambientais para aplacar o desequilíbrio ecológico e, na linguagem das ciências econômicas trazida 244 por Pigou, contribuir para a internalização das externalidades negativas. A internalização dos custos ambientais não pode deixar de ser analisada sob a ótica da realização da justiça. A questão ambiental se evidencia, primeiramente, pela chamada mundialização da produção e pela exportação das externalidades ambientais negativas. Há um processo global de massificação do consumo e de degradação do valor de uso das mercadorias, gerando uma depreciação crescente do meio ambiente e graves problemas de ordem social. A externalidade, segundo Moura: Refere-se à ação que um determinado sistema de produção causa em outros sistemas externos. Trata-se de um conceito desenvolvido pelo economista inglês Pigou em 1920, que estabeleceu que existe uma externalidade quando a produção de uma empresa (ou um consumo individual) afeta o processo produtivo ou um padrão de vida de outras empresas ou pessoas, na ausência de uma transação comercial entre elas. Normalmente esses efeitos não são avaliados em termos de preços. Um 245 exemplo disso é a poluição causada por uma determinada indústria. 246 As externalidades negativas ambientais resultam do fato de que as atividades econômicas utilizam bens ambientais e, como muitos deles não possuem preço de mercado, não são contabilizados no processo produtivo, gerando, por via 247 de consequência, um custo social. O maior desafio que se impõe à internalização das externalidades ambientais parece ser o fato de que os mecanismos de mercado são incapazes de criar condições para o desenvolvimento sustentável, ainda quando acompanhados de políticas públicas para tanto. 244 GERENT, Juliana. Internalização das externalidades negativas ambientais – uma breve análise da relação jurídico-econômica. In: BENJAMIN, Antônio Herman; MILARÉ, Édis (Orgs). Revista de Direito Ambiental, ano 11, nº 44, outubro-dezembro de 2006. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, pp. 41-63. 245 MOURA, Luiz Antônio Abdalla de. Economia Ambiental. Gestão de Custos e Investimentos. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2000, p. 5. 246 As chamadas externalidades, especialmente as negativas, diminuiriam acentuadamente se fosse possível internalizar seus custos, de forma a expressá-los nos preços dos bens e serviços de cuja produção, ou o consumo, se originaram. Internalizar, portanto, o custo da exploração predatória e poluidora, de forma que eles se reflitam no preço dos produtos pode ser uma forma eficaz de reduzir as tensões no relacionamento entre o sistema econômico e o meio ambiente. E um dos caminhos para tanto, pode ser a utilização de uma política tributária que penalize as atividades econômicas predadoras e, ao mesmo tempo premie as empresas que adotarem práticas poupadoras de materiais/energia, e lançamento de resíduos e energia dissipada. 247 MOURA. Op. cit., p. 54. 130 Os agentes econômicos, ao utilizarem o meio ambiente como depósito de seus dejetos, sem contabilizar os custos ambientais, provocam falha no mercado e grave prejuízo à coletividade. Dessa forma, acaba-se concretizando a máxima 248 “privatização dos lucros e socialização dos prejuízos”. A ideia é imputar ao poluidor o custo social da poluição por ele gerada, estabelecendo um mecanismo de responsabilidade por dano ecológico, incluindo os efeitos da poluição ou destruição, não somente sobre os bens e pessoas, mas também sobre toda a natureza. E se bem empregada, sequer causa prejuízo à atividade econômica, pois proporciona um estímulo a inovações tecnológicas, as quais também podem ser objeto de benefícios fiscais como forma de estímulo, num processo capaz de corrigir falhas das externalidades do mercado poluidor. Como leciona Alcoforado, quando: A, ao produzir, danifica B, é tratada a partir da perspectiva do paradigma da estratégia competitiva. Mostra porque esta abordagem admite que as restrições ambientais associadas ao paradigma do comando e controle, desde que devidamente formatada, funciona, não como um bloqueador das atividades econômicas, e, sim, como incentivo as inovações reativas que leva a uma maior produtividade dos insumos; mas, para tanto, precisa de alguns ajustes que apontam para a necessidade de integrar-se elementos 249 implícitos nas outras alternativas. Por meio da internalização compulsória dos custos ambientais, busca-se impedir que um determinado agente econômico (poluidor) imponha a toda 250 coletividade o ônus de suportar tal deseconomia. Assevera Modé que o ideal de justiça igualmente é verificado quando se possibilita que, mediante a internalização dos custos ambientais não incorporados aos produtos ou aos processos de produção, se proporcione igualdade de condições entre as diversas empresas, sejam poluidoras (as que pagam pelos custos impostos pelo Estado pela decorrente falta de tecnologia), ou não (as não poluentes que investem em novas 251 tecnologias). 248 AMARAL. Op. cit., p. 41. 249 ALCOFORADO, I.G. A trajetória dos fundamentos das políticas ambientais – Do comando e controle a abordagem neo-institucionalista. 2012. p.1. Disponível em: . Acesso em: 18 set. 2012. 250 FERRAZ, Roberto. Tributo ambientalmente orientado e as espécies tributárias no Brasil, In: TORRES, Heleno Taveira (org.) Direito tributário ambiental. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 340. 251 MODÉ, Fernando Magalhães. Tributação ambiental: a função do tributo na proteção do meio ambiente. Curitiba: Juruá, 2011, p. 71. 131 Hernandez identifica mecanismos públicos para a proteção ambiental: instrumentos econômicos, administrativos, penais, etc. Aponta a ajuda financeira e a criação de mercados e tributos como elementos para sua efetiva aplicação. Visualiza na área tributária, por sua grande capacidade de intervir no mercado, um excelente meio de defesa à causa ambiental diante de sua aptidão de internalizar as externalidades negativas. E esclarece: “En los últimos años, sin embargo, en el marco de un recrudecimiento de los problemas que aquejan al plañe tan dudando gravemente el medio ambiente, y gracias a una creciente concienciación de tal crisis, la nueva perspectiva va encaminada a la utilización de mecanismos que inciden en 252 el sistema de precios”. A internalização da externalidade negativa ambiental é fator indispensável para o equilíbrio da ordem social, regrada constitucionalmente, na medida em que há uma imposição da obrigação com a tutela ambiental a todos imposta, principalmente ao poluidor, aquele que economicamente usufrui do bem ambiental, que deverá ressarcir à sociedade na proporção do proveito auferido. Se acaso o Estado adote uma postura exclusivamente liberal não será capaz de cumprir com seu dever de zelo à tutela do ambiente. O risco social de um dano ambiental é suportado por todos os demais sistemas, enquanto é ausente um mecanismo identificador do agente poluidor. Diante dessa complexidade, constatada uma falha de mercado, esta será suportada por todos os demais sistemas sociais, mas com maior peso no sistema econômico. Assim, a internalização da externalidade negativa acaba por proporcionar equilíbrio no sistema social, caso contrário, caberá ao Estado e à coletividade a função de suportar seus graves efeitos, provocados por apenas um agente. Um desafio apontado à internalização das externalidades negativas reside na quantificação econômica do dano ambiental como forma de se realizar a avaliação econômica dos custos envolvidos. Carneiro adverte quanto à possibilidade de serem gerados prejuízos no mercado internacional caso um país adote medida de internalização de custos diferentemente de outro (ausência de padronização), 252 Tradução livre do autor: “Nos últimos anos, no entanto, como parte da escalada dos problemas que afligem o plano, estão afetando gravemente o meio ambiente, e graças a uma crescente conscientização de tal crise, uma nova perspectiva está sendo encaminhada motivando a utilização de novos mecanismos com incidência nos sistema de preços.” HERNÁNDEZ, Jorge Jiménez. El tribute como instrumento de protección ambiental. Granada: Comares, 1998, p. 72. 132 253 ocasionando prejuízo à sua competitividade no cenário mundial. Em linguagem econômica, no cálculo correto para a internalização das externalidades negativas sobre o agente poluidor deve incidir uma tributação que seja igual ao prejuízo marginal social por unidade produzida ou por unidade de poluição emitida. O prejuízo marginal social corresponde à diferença entre os custos marginais sociais e privados. Esse mecanismo possui dois objetivos: a eficiência econômica e a defesa do meio ambiente. Aquela é alcançada quando os responsáveis pela poluição arcam com os custos sociais; esta ocorre como resultado da elevação de custos dos produtos poluentes causada pela tributação. Com o encarecimento do produto poluente, modificam-se os preços relativos, o que, presumivelmente, redireciona a demanda para produtos menos poluentes, incrementando as modificações a serem realizadas no processo produtivo que reduzem os níveis de degradação. A extrafiscalidade ambiental possui vantagens em relação a outros instrumentos inibidores da poluição, v.g., sanções civis e administrativas, pois se trata de um incentivo permanente, preventivo, de caráter flexível, constituindo genuíno instrumento de socialização da responsabilidade sobre a preservação 254 ambiental. A tributação extrafiscal exerce uma grande influência na atividade econômica, dado que os tributos são um dos maiores custos empresariais. Os tributos podem ser utilizados como instrumento de regulação econômica indireta: uma atividade ou produção que é altamente tributada pode ser abandonada em favor de atividades ou bens sujeitos a tributação menos onerosa, produzindo, indiretamente, a conscientização ambiental. 253 CARNEIRO. Op. cit., p. 80. 254 MODÉ. Op. cit., p. 96. 133 3.4 Racionalidade Econômica, Tributo e Ambiente O Estado tem por finalidade a realização do bem comum por meio da administração pública, que executará políticas públicas e planos de ação, tendo como referência a sociedade. Assim, a utilização de políticas públicas tributárias parece vir ao encontro desse propósito. O fenômeno da tributação mexe de forma direta sobre a riqueza individual. O Estado, através dos tributos, retira parcela da riqueza privada transferindo-a para a coletividade. O tributo ambiental tem por finalidade inserir nessa mecânica, ações em prol do ambiente. A inclusão da solução tributária para os problemas do meio ambiente foi estudado por Pigou. No início do século passado, ele admitia a hipótese da ausência de custos administrativos na instituição de um imposto para a correção das externalidades negativas e o pagamento de um subsídio como compensação para os efeitos externos positivos. Mais recentemente, uma corrente de pensamento vem mostrando força: trata-se da Análise Econômica do Direito. Trata-se de uma escola eclética que comporta várias vertentes e, consequentemente, vários teóricos, tendo como berço a Universidade de Chicago. Tornou-se uma das principais escolas jurídicas da época, vez que mudou significativamente a estrutura das disciplinas das Faculdades de Direito e o cotidiano jurídico norte-americano, passando a ser de grande expressão na área do Direito e da Economia. Assim, a AED pode ser agregada à disciplina do Direito para potencializar a resolução de conflitos nas mais diversas áreas, inclusive na seara ambiental, já que o principal ponto é a rejeição da posição que analisa o Direito apartado das realidades sociais, econômicas, ambientais etc, estimulando a utilização do estudo de outras disciplinas em conjunto com a economia e a política, enaltecendo, então, a interdisciplinariedade. Tal ponderação, acerca da AED, visa outorgar à ciência jurídica mais um recurso de atuação. Deve-se atentar que o sistema jurídico pode ser entendido como um conjunto de incentivos, positivos e negativos, que atuam sobre o comportamento dos indivíduos. Assim, este ângulo de visão fornece aos juristas, cuja preocupação geralmente se restringe aos limites do sistema jurídico, instrumentos capazes de esclarecer o fenômeno jurídico em suas mais diferentes percepções/interações. Por empregar o instrumental econômico para analisar os comportamentos 134 dos indivíduos sob o ponto de vista jurídico, em situações consideradas estranhas ao mercado, o enfoque parte da premissa de que normas jurídicas criam preços implícitos para os comportamentos possíveis perante a lei, e de que indivíduos racionais se comportarão como consumidores, maximizando seus próprios interesses. Dessa forma, sendo os indivíduos racionais e maximizadores, a lei pode impor custos a determinado comportamento induzindo seu comportamento para determinado objetivo. Ronald Coase, em sua obra intitulada The Nature of the Firm, argumenta que a principal razão para o estabelecimento de uma empresa é o fato de poder proporcionar meios eficientes para organizar a produção proporcionando contratos de longa-duração reduzindo, assim, os custos decorrente de negociações constantes. Já na obra The Problem of Social Cost (O problema do custo social), publicado em 1961 pelo Journal of Law and Economics, afirma que a principal contribuição daquela concepção consiste em que o problema central do mercado está nos custos de transação, contrariando, assim, a teoria de Pigou a despeito das externalidade negativas, abrindo-se caminho para que várias premissas e conceitos legais, mesmo aqueles não ligados a questões de mercado, passassem a ser questionados pelo ponto de vista da economia. Elucida Coelho: Em linhas gerais, Coase defendeu que o impasse existente entre uma fábrica poluidora e um condomínio vizinho incomodado pela poluição não deve ser analisado sob a perspectiva de que a primeira necessariamente gera externalidades negativas sobre o segundo; pois se os custos envolvidos com a mudança geográfica do condomínio forem inferiores aos custos de se reduzir a poluição, então as externalidades negativas claramente mudam de endereço. A pergunta central deixa de ser, então, a de como restringir as atividades do poluidor por meio da imposição de direitos e deveres, como fazia Pigou, para concentrar-se no problema de 255 maximização do benefício geral. Desenvolveu a ideia chamada de Teorema de Coase em que defende a ideia de que ao exercitar-se um direito sempre temos custos, os chamados custos de transação e que só seriam desejáveis situações em que os ganhos superassem 255 COELHO, Cristiane de Oliveira. A Análise Econômica do Direito enquanto ciência: uma explicação de seu êxito sob a perspectiva da História do pensamento econômico. Brasil: Ministério da Fazenda, 2007. Disponível em: http://repositories.cdlib.org/bple/alacde/050107-10/. Acesso em 29/10/2012. 135 256 as perdas. É possível extrair-se do teorema que a presença de custos de transação é uma das causas de ineficiência, portanto os custos impedem a própria transação devendo sempre ser mitigados. Ronald Coase propõe que a opção escolhida não levará em conta a quem as regras jurídicas atribuem direitos e a solução adotada será sempre a de menor custo assim, a escolha recairá sobre a solução mais eficiente em termos econômicos. Explica Rieffel: Quando os custos para se fazer um acordo ou negócio são levados em consideração, afeta a eficiência do resultado a maneira pela qual foram inicialmente dispostos os direitos das partes. O jurista passa, assim, a ter um critério econômico para escolher qual é o melhor tipo de norma para regular determinada situação. Dessa constatação pode-se derivar outra conclusão, qual seja, a de estar o operador do direito dotado de um instrumento crítico dos resultados obtidos pelas normas jurídicas. O Teorema conferirá ao Direito uma tarefa de extrema importância econômica: tentar reproduzir os resultados que seriam atingidos em um mundo de custos de transação iguais a zero, um mundo em que os resultados seriam 257 eficientes em termos econômicos. Por sua vez, a abordagem do direito de Posner, em sua abordagem econômica do direito, defende que o pressuposto básico que orienta a versão da 258 análise econômica é o de que as pessoas são maximizadoras racionais de suas satisfações. Para o citado autor, o raciocínio econômico se desenvolve por meio de uma análise, que percebe a racionalidade humana como fundamento para a busca da vantagem pessoal. Essa procura é elemento motivador de quase todos os indivíduos nas relações sociais que engendra. Por essa razão, a racionalidade nada mais é do que uma habilidade para escolher os melhores meios para os fins escolhidos. E complementa seu raciocínio: Deve ficar subentendido que tanto as satisfações não-monetárias quanto as 256 ALVAREZ, Alejandro Bugallo. Análise Econômica do Direito: contribuições e desmistificações. Direito, Estado e Sociedade, v. 9, n. 29, jul./dez. 2006, pp. 49-68. 257 REIFFEL, Luiz Reimer Rodrigues. Um mundo refeito: o consequencialismo na análise econômica do direito de Richard Posner. 2006. 119 f. Dissertação (Mestrado em Direito). UFRGS, Porto Alegre. 2006. p. 50. Disponível em: http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/8053/000566217.pdf?sequence=1. Acesso em 30 de outubro de 2012. 258 O indivíduo procura maximizar o seu prazer, a sua utilidade, a sua satisfação, o seu interesse em minimizar os custos, a desutilidade, o desprazer. O indivíduo é um maximizador. A racionalidade dos indivíduos supõe que, normalmente, quando existe conflito entre o interesse geral e os interesses pessoais eles tendem a procurar satisfazer os seus próprios interesses sobrepondo-os aos interesses gerais. A racionalidade que se toma por base na análise econômica não supõe um cálculo consciente em todas as situações e em todas as escolhas feitas pelo indivíduo. 136 monetárias entram no cálculo individual de maximização (de fato, para a maioria das pessoas o dinheiro é um meio, e não um fim), e que as decisões, para serem racionais, não precisam ser bem pensadas no nível consciente – na verdade, não precisam ser de modo algum conscientes. Não nos esqueçamos de que “racional” denota adequação de meios de fins, e não meditação sobre as coisas, e que parte de nosso conhecimento é 259 tácita. O conceito de ser humano maximizador racional de seu interesse significa que as pessoas respondem a determinados incentivos; assim, se o ambiente for alterado de maneira a permitir que uma mudança em seu comportamento possa fornecer-lhe uma maior satisfação de sua utilidade haverá, consequentemente, uma mudança de conduta. A racionalidade econômica permite a construção de um modelo capaz de antever e justificar a ação humana. Posner além de contribuir para alargar a aplicação da análise econômica neoclássica aos mais diferentes ramos jurídicos, ocupou-se em disseminar suas ideias no meio acadêmico do Direito. Defendeu, então, que a principal função do jurista deveria ser a de garantir que o direito entre as partes fosse sempre eficiente, e, para tanto, apenas o estudo interdisciplinar de Economia e Direito capacitaria os juristas para o exercício dessa atividade já que, para ele, “ o pensador jurídico deveria ter uma educação ampla e acompanhar a evolução das correntes 260 intelectuais de sua época” . Daí o surgimento da importante questão sobre qual 261 seria exatamente o sentido de eficiência. Sobre o tema discorre Bedin: Posner faz um valioso esclarecimento a respeito dos conceitos de valor, utilidade e eficiência para a Economia com o objetivo de melhor situá-los dentro do contexto da AED. O autor explica que em Economia a palavra utilidade é aplicada com dois significados distintos: o primeiro é utilizado para mostrar o valor de um custo ou benefício incerto em oposição a um certo conectando a utilidade ao conceito de risco, ou seja, no momento de fazer uma escolha, o indivíduo optará por aquele que tiver mais chances de ter um resultado positivo. Exemplifica com a pergunta se é preferível receber um milhão de dólares ou ter 10% de chances de receber dez milhões de dólares. A resposta provável é que se prefira receber um milhão de dólares e se tenha aversão ao risco, pois quanto mais dinheiro se tem, menor será a felicidade que se obtém com os dólares adicionais (princípio da utilidade 262 marginal decrescente do dinheiro). 259 POSNER. Op. cit., 2007, pp. 473-474. 260 Idem, p. 568. 261 Posner explica que o conceito de eficiência é, talvez, o mais comum sentido de justiça que se pode encontrar. “A moral system founded on economic principles is congruent with, and can give structure to, our everyday moral intuitions”. In POSNER, R. The Problems of Jurisprudence. Harvard University Press, 1990. p. 90. 262 BEDIN, Barbara. Prevenção de acidentes de trabalho no Brasil sob a ótica dos incentivos econômicos. 2009. 123 f. Dissertação (Mestrado em Direito). UCS, Caxias do Sul. 2009. p. 64. 137 Esse economista utiliza o conceito de eficiência de “Kaldors e Hicks“ também chamado de Pareto Potencial, para explicar como as pessoas, maximizadoras de riquezas, fazem suas escolhas com eficiência. Nesse caso, a situação é eficiente quando os benefícios são superiores às perdas, e os prejuízos sofridos por terceiros podem ser compensados, mesmo que essa compensação não ocorra. Rodrigues esclarece a aplicação do referido critério: Esta solução tenderá a ser satisfatória quando as alterações que estejamos a analisar afectem um grande número de pessoas, não sendo de esperar que os benefícios e os sacrifícios se concentrem em grupos caracterizados por diferentes níveis de riqueza. Tenderá, também, a ser mais satisfatória quando as alterações em análise tenham um impacto reduzido sobre o nível de riqueza de cada pessoa do que quando tenha um impacto muito 263 significativo. O entrelaçamento do direito com a economia prevê que o direito deve ser lido a partir de princípios de valor, de utilidade e de eficiência. Nesse movimento, entre direito e economia, o direito deve se orientar à maximização da riqueza, 264 definida como “à soma de todos os bens e serviços tangíveis e intangíveis”. Pode parecer incoerente a adoção dessa teoria, que defende a maximização da riqueza em detrimento da proteção ambiental, pois que, ao olhar econômico, os recursos naturais só constituem riqueza quando retirados da natureza. Todavia, esse pensar seria empregado como forma de o direito impor, por força normativa, alternativas comportamentais em prol da preservação da natureza, ao tornar viável economicamente esse comportamento. Segundo a escola da AED, Donário adverte sobre o mecanismo de escolha dos indivíduos: Com base nestes pressupostos a teoria desenvolvida pela AED considera que as escolhas dos indivíduos não são efectuadas com base em desvios, mas sim fundamentadas nos resultados esperados de determinado comportamento ou acção, quando efectuam as suas escolhas, legais ou ilegais, actuando em situações de incerteza e de risco. Os indivíduos fazem 265 escolhas racionais, com base na sua equação pessoal. 263 RODRIGUES, Vasco. Análise econômica do Direito. Coimbra: Almedina, 2007, pp. 30-31. 264 POSNER. Op. cit., 2007, p. 477. 265 DONÁRIO, Arlindo. Análise econômica do direito. Conferência realizada no Instituto Nacional de Administração (INA), a solicitação do Tribunal de Contas, em 1 de Junho de 2010, p. 4. Disponível em http://www.universidade-autonoma.pt/upload/galleries/probabilidade-umbral.pdf 138 A análise econômica do direito parte da premissa de que o direito tem a capacidade e objetiva influenciar a conduta dos indivíduos e de que essa prática possui caráter eminentemente econômico. O direito, como instrumento de regulação das condutas sociais, busca impor aos indivíduos um modelo de prática que entende ser ideal, através da norma, como incentivadora de comportamentos e das sanções, 266 como limitadoras à prática de determinadas condutas. Nesse sentido, lecionam Carvalho e Mattos, ao afirmarem que: “Como o direito positivo prescreve condutas e (de) limita o raio dessas escolhas, ao mesmo tempo em que essa própria produção normativa também é realizada por indivíduos que escolhem, e que os direitos em questão são escassos, nada mais apropriado que a Análise Econômica para 267 descrever o fenômeno jurídico e prescrever como ele pode ser mais eficiente”. A racionalidade dos indivíduos faz com que tomem suas decisões, adotando como finalidade a realização de seus próprios interesses. Pelo poder da economia – em proporcionar conforto e bem-estar – tem-se que os critérios de escolha individual sofrem turbações. Dessa maneira, estímulos proporcionados pelo ordenamento, traduzidos em normas jurídicas, podem se constituir como indutores de escolhas mais reflexivas e indutivas. A racionalidade para resolução dos problemas da vida, especialmente em um Estado de Direito, constitui instrumento de formatação dos eixos epistemológicos de uma convergência conceitual entre direito e economia. A análise econômica do fenômeno jurídico parte da premissa de que o homem, ao se confrontar com as opções de condutas possíveis, acaba agindo sob o olhar econômico e, consequentemente, sopesa a relação custo-benefício entre as possibilidades oferecidas, escolhendo pela que melhor atenda seus interesses. Os indivíduos têm a aptidão de classificar suas preferências e eleger a mais conveniente a partir do modelo do cálculo racional. Sobre o pensamento de Posner na busca de satisfação baseada na racionalidade econômica, vê-se: Há uma pretensão clara nos argumentos de Posner de querer reduzir toda a conduta do ser humano a essa perspectiva, ou seja, reduzir a uma busca da satisfação apenas em termos econômicos. Uma das justificativas está relacionada ao fato desta forma de racionalidade econômica fornecer um fator que torna comensuráveis todas as escolhas possíveis por uma pessoa. 266 KORNHAUSER, L. A. 1984 apud PACHECO, Pedro Mercado. El Analisis Economico del Derecho – una reconstrucción teórica. Madri: Centro de Estudios Constitucionales, 1994, p. 27. 267 CARVALHO, Cristiano de & MATTOS, Ely José de. Análise Econômica do Direito Tributário e Colisão de Princípios: um caso concreto. Berkeley: Berkeley Program in Law and Economics. Disponível em: http://www.escholarship.org/uc/item/5sb875z8 139 Em outras palavras, ocorrerá uma espécie de ponderação em que se pode medir e sopesar as alternativas com base em um único critério. Esse fator de comensurabilidade - importante também quando falamos em eficiência - será a ideia de riqueza que poderá ser expressa, em última análise, na 268 forma monetária. Sendo esse mecanismo racional de eficiência das escolhas um fenômeno sociológico, suas consequências têm reflexos no direito, pois interfere na alocação dos recursos disponíveis. Tem-se a percepção de que a economia é uma ciência de escolhas racionais: os custos acabam por determinar as opções, tendo como balizas o valor, a utilidade e eficiência. Assim, conclui-se que o pragmatismo é ponto comum na relação entre direito e economia. Portanto, definida a priorização da ação humana aos interesses maximizadores de riqueza e, definido o fim da referida ação na eficiência econômica, o direito poderá apropriar-se de seus efeitos e, através de um conjunto de incentivos e guias, direcionar a conduta dos indivíduos para a 269 consecução do fim específico que a norma deve alcançar. Os economistas “veem as leis como uma gigantesca máquina de preços – 270 as leis atuam como preços e impostos que geram incentivos”. A ciência econômica traduz as ações do homem para sua própria linguagem, transformando- as em dados objetivos: medindo-as e quantificando-as. Assim, a economia analisa esta forma de comportamento, onde são incentivados pela norma, tentando tirar o máximo proveito econômico. O indivíduo reage a esses incentivos, fazendo ou deixando de fazer algo, de acordo com o que melhor atenda seus desejos. Não se examina o motivo da escolha, mas se trouxe o maior benefício, satisfação ou 271 utilidade ao indivíduo que a escolheu. Segundo Veljanovski, “A economia se baseia na premissa de que as pessoas, na média, se comportam de forma racional e de acordo com seus próprios 272 interesses”. O cálculo a despeito dos benefícios e custos marginais antecede a tomada da decisão, consequentemente, as deliberações apenas serão tomadas se os benefícios forem superiores aos custos. Considerando a previsibilidade do 268 REIFFEL, Op. cit., pp. 75-76. 269 PACHECO, Pedro Mercado. El Análisis Económico del Derecho: una reconstrucción teórica. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1994, p. 44. 270 VELJANOVSKI, Cento. A economia do direito e da lei: uma introdução. Trad. de Francisco J. Beralli. Rio de Janeiro, IL, 1994, p. 23. 271 POSNER. Op. cit., 2000, p. 11. 272 VELJANOVSKI. Op. cit., p. 46. 140 comportamento racional, a análise da maximização racional – que consiste em fazer a melhor opção para satisfazer os desejos do indivíduo –, se torna útil para compreender a dinâmica do mecanismo do agir humano em todas as áreas do Direito. A aplicação dos conceitos econômicos ao Direito é relevante ao se visualizar a possibilidade de utilização, criação e aplicação das normas legais com o objetivo específico de direcionar os indivíduos a fazer ou deixar de fazer algo em prol do bem-estar da sociedade. A ideia central é o emprego de instrumentos para conduzir a vontade dos indivíduos a uma reflexão coletiva. Não se pode afirmar, categoricamente, que todos os atos humanos ou construções jurídicas possuem motivações exclusivamente econômicas ou que devam ser analisadas somente sob esse viés, mas, pode-se dizer que, inobstante a ausência de motivação monetária, tais ações refletem efeitos econômicos que não podem deixar de ser avaliados por implicarem custo e benefício para outros. A ciência jurídica precisa convergir com a racionalidade da ciência econômica sob o ponto de vista do interesse do indivíduo. Dessa forma, alcançando- se tal mister, o direito como ciência social, poderá se harmonizar com os demais interesses de grupos, gerando benefícios em prol da coletividade. Nesse processo, o estudo do mecanismo de transmissão de preços, a princípio objeto no campo da ciência econômica, passa a interessar ao Direito, transmudando-se de uma ciência interessada apenas em simples equalização de condutas por meio da coação, para uma ciência capaz de visualizar os benefícios de outras áreas no conduzir da conduta humana por meio de incentivos. A Economia, por seu turno, também passa a ser vista pelo Direito como elemento transformador, considerando sua interferência na dinâmica de funcionamento das relações sociais. Aduz Stephen: “O que a economia está fornecendo aqui é uma estrutura teórica para a análise da lei: um método de dedução de prognósticos a respeito de um comportamento segundo ‘a lei’ ou um método de dedução de um conjunto de 273 normas para produzir o comportamento desejado”. É viável a utilização dos instrumentos Econômicos ao Direito os quais mostram novos caminhos à resolução ou prevenção dos conflitos. A análise econômica do direito deve ser empregada na seara ambiental, seja para o ato de 273 STEPHEN, Frank H. Teoria Econômica do Direito. Trad. de Neusa Vitale. São Paulo: Makron Books, 1993, p. 2. 141 degradação, seja para o ato de conservação do ambiente, estimulando ou restringindo o agir humano, tornando-o interessante economicamente à preservação ambiental. Dessa forma, o Estado pode, por meio de políticas públicas, instituir tributos com o fim de incentivar ou prevenir a poluição, ou ainda, criar isenções para fatos tributáveis favoráveis à natureza, tendo como base um simples interesse econômico como maximizador da riqueza. A ideia é tornar a preservação do ambiente economicamente interessante, considerando o binômio custo-benefício, oferecido por um promitente tributo ambiental. Trata-se de uma diferente maneira de se abordar a ciência jurídica, empregando-se modelos econômicos que antevejam o comportamento dos indivíduos. A norma legal poderá ser mais eficiente ao direcionar as ações dos indivíduos a práticas que pugnam por um meio ambiente ecologicamente equilibrado. Aquele custo-benefício eminentemente econômico, buscado pelo indivíduo passa a corresponder a um benefício à coletividade ao se alcançar o bem- estar socioambiental. O tributo, ecologicamente orientado, calcado no estudo da economia, pode ser capaz de influenciar na decisão de cada indivíduo, prevenindo o dano ambiental com o escopo de buscar a preservação do bem coletivo. Ferraz aborda a questão: Na atividade econômica, as decisões são orientadas pelo binômio custo/beneficio e, assim, ainda que não seja exclusivo, o custo é critério de extrema relevância nas decisões diárias, não apenas do empresário, mas de todos. Ora, se os custos da degradação ambiental não forem refletidos nos preços, as decisões econômicas nunca serão ecologicamente corretas. A função das green taxes é precisamente essa: “internalizar” os custos ambientais, isto é, trazer para o custo de cada bem ou mercado o custo que 274 seu consumo representa em termos ambientais. Os instrumentos econômicos, somados às sanções penais e administrativas, são alguns dos mecanismos de proteção ambiental que o Estado dispõe para cumprir com sua tarefa constitucional da defesa dos bens jurídicos difusos. Dentre eles, o mais eficaz é o que influencia na decisão econômica, mormente pelo emprego de políticas públicas tributárias, pois fazem com que a opção, ecologicamente mais desejável, seja a escolhida. Seguem as palavras de Modé: [...] a razão motivadora da tributação ambiental não é a mesma sobre as 274 FERRAZ. Op. cit., p. 341. 142 quais se fundam as sanções. A aplicação da tributação ambiental não tem por objetivo punir o descumprimento de um comando normativo (proibitivo); ao contrário, a partir do reconhecimento de uma atividade econômica é necessária à sociedade (seja por fornecer produtos indispensáveis à vida social, seja por garantir empregos e renda a determinada comunidade, ou por outra razão qualquer) busca ajustá-la a uma realização mais adequada do ponto de vista ambiental, desincentivando (pelo reflexo econômico negativo que impõe) que o comportamento de um determinado agente econômico ou conjunto de agentes, se modifique para o que tenha por 275 ambientalmente correto. O Estado é responsável pela efetivação do bem-estar coletivo. É dever e tarefa estatal proporcionar um meio ambiente saudável, interesse a toda coletividade. Destaca-se que das decisões econômicas individuais, baseadas no custo-benefício de uma política tributária, pode-se gerar a mudança de um mau comportamento e criar, via transversa, uma nova consciência social e ambiental, pautada na sustentabilidade do desenvolvimento humano. O emprego do sistema tributário, por meio de suas normas de incentivo, acaba por se apropriar da eficiência da racionalidade econômica, repercutindo na cadeia de produção, circulação e consumo de bens e serviços. Nesse processo, abre-se espaço a soluções dos problemas ambientais, vez que proporciona interação entre interesses públicos e privados ao alcance da missão solidária entre todos, na busca de um meio ambiente sadio. O tributo ecológico estimula um comportamento ambientalmente correto, uma vez que opta por abstrair uma atitude danosa ao meio ambiente pela obtenção de vantagem econômica. A implementação de tal recurso fiscal, a priori, não impõe mudanças estruturais significativas na aparelhagem estatal, contudo, promove uma nova iniciativa cognitiva e procedimental pelos próprios cidadãos-contribuintes. Estando o direito tributário ligado a fatores modernos da sociedade, atuando basicamente sobre fatos econômicos e, observada a integração do direito ambiental com todos os setores do direito, insurge-se a possibilidade de utilizar-se daquele como meio de auxílio deste na proteção ao meio ambiente. Demonstra ser factível a utilização de tributos para assegurar a preservação do meio ambiente em consonância com o ordenamento jurídico. Também é correto supor que, nesse caso, o principal objetivo do tributo não será aumentar a arrecadação dos cofres fazendários, mas evitar – ou ao menos minimizar – os danos causados ao meio ambiente sem, no entanto, impedir o desenvolvimento econômico 275 MODÉ. Op. cit., p. 83. 143 do País. Preservar o meio ambiente é tarefa constitucional a ser atendida por meio de política do Estado brasileiro, em todas as esferas da federação, portanto, direito e dever dos governos municipais, estaduais e federal. Nessa senda, a utilização dos tributos nas políticas públicas ambientais atende às expectativas de maior efetividade das normas ambientais, que têm por finalidade garantir um meio ambiente ecologicamente equilibrado para todos. Não se afirma que esse novo caminho representa uma solução mágica, capaz de sozinha, solucionar todos os problemas ambientais. Representa um remédio jurídico à tutela do ambiente ao par dos já existentes: normas repressivas das esferas penal, administrativa, etc. O Estado ainda está longe de uma efetiva garantia de que os resultados pela aplicação do tributo ambiental serão relevantes. Não se olvida que é função institucional do Estado a preservação ambiental e é dado a ele, exclusivamente, a atribuição fiscal. Reitera-se que, num mundo capitalista, enquanto a preservação não corresponder a um benefício financeiro direto, os resultados serão distantes, favorecendo, quiçá, apenas as mais longínquas gerações. Por fim, para que as ações de consciência ambiental se concretizem, serão necessárias novas formas de implementação, tendo como fulcro, alternativas economicamente viáveis, baseadas na responsabilidade social e na alteração do modelo econômico, por meio de políticas governamentais legítimas, frente ao lapso entre a conscientização das instituições públicas e privadas e das suas ações. O tema aqui posto é mais do que um discurso cheio de boas intenções. O Estado deve buscar a efetividade dos pressupostos a que a lei se destina. E em termos de eficiência, num Estado Democrático de Direito que também é regido pelo capitalismo, nada mais prudente do que a adoção de uma política tributária orientada pela ponderação de interesses, aliada a uma política de regulação, mais do que de império, para que a intervenção do Estado se mostre eficaz na preservação de um patrimônio esgotável. Um dos caminhos é o uso do direito tributário ambiental, colimando mais no incentivo do que na punição; mais à criação de vantagens do que à tributação excessiva sobre os bens naturais. Esse processo (tributação) pode ter um efeito reverso, eis que, ao invés de aumentar a arrecadação e desestimular o uso de tais bens, provavelmente promoverá a burla da lei ou o uso ilegal dos recursos naturais que se buscava proteger. 144 Portanto, sugere-se que se utilize preferencialmente a ponderação dos princípios constitucionais nos casos concretos, para que o Estado alcance o desenvolvimento econômico sustentável e humano, preservando o meio ambiente para as futuras gerações sem, com isso, impedir que o desenvolvimento econômico e a arrecadação do Estado sejam realizados. A criação de benefícios fiscais para que o ente protetor (pessoa física ou jurídica) desenvolva uma cultura ambientalista sólida, com o escopo de estruturar valores ecológicos permanentes próprios de um verdadeiro Estado Socioambiental de Direito. 145 CONSIDERAÇÕES FINAIS As questões ambientais têm sido crescentemente incorporadas à agenda científica dos mais diversos campos do conhecimento e às agendas políticas locais, nacionais, regionais e globais. As exposições precedentes evidenciaram a devastação do meio ambiente e, concomitantemente, a preocupação global, ainda que tímida e ineficaz, com a proteção das bases naturais da vida. Cresce, paulatinamente, a conscientização ambiental, o engajamento dos cidadãos, sem, contudo, haver ainda um consenso a despeito das medidas a serem tomadas no combate à crise ecológica, instaurada pelos efeitos da sociedade de risco da contemporaneidade. O agravamento do processo de poluição e degradação exigiu uma postura governamental de tomada de medidas protetivas no decorrer das décadas, aprimorando suas ações na tentativa de combate à poluição e ao uso intensivo do ambiente, principalmente na adoção de instrumentos econômicos ao uso sustentável dos recursos naturais. Detecta-se uma situação de vulnerabilidade do ser humano na destruição, por ele próprio, de seu habitat, portanto, diante da irreversibilidade e da magnitude dos danos, torna-se primordial uma intervenção estatal à manutenção do meio ambiente, razão por que se deve atentar à efetividade da vasta legislação ambiental brasileira. O Estado Brasileiro mostra sinais de evolução na conformação de um Estado Socioambiental, ao mesmo tempo em que suas bases teóricas estão longe de serem atingidas. A política para o meio ambiente não disponibiliza mecanismos suficientes a um efetivo desenvolvimento sustentável. Portanto, necessário se faz que os princípios contemplados na CF/88 sirvam como verdadeiras balizas, não apenas na atuação do poder público, como também do setor empresarial e da sociedade em geral, em especial, considerando que se trata de direito fundamental da pessoa humana, o meio ambiente ecologicamente equilibrado. O caminho é tortuoso, mas, sem dúvida, deverá ser trilhado com esforço de toda a sociedade, numa conjugação de esforços da administração pública e dos particulares. Certo é que a preservação da herança ambiental das gerações futuras não pode ficar à disposição da vontade de particulares da atual geração, tampouco entregue a fúria desenfreada dos interesses econômicos. 146 É tarefa da ciência jurídica, a busca pela solução da crise ambiental, assim como, o respeito às liberdades individuais e aos princípios basilares do Estado de Direito, por meio de um verdadeiro processo de transformação do sistema político e econômico. Esse processo exige uma intrincada conjugação de fatores para que o Direito dê uma solução ao problema, que vá muito além de meras restrições jurídicas. Aliás, fatores estes que ultrapassem a fronteira de outras ciências para que se investiguem novos instrumentos e estratégias, até se alcançar um caminho viável à marcha contra um desenvolvimento irreversível para o futuro. Um dos maiores desafios da atualidade está no processo de operacionalização da compreensão da sustentabilidade e na transformação do discurso em ação. O ideal de uma sociedade sustentável, que integre e respeite as necessidades humanas e os limites da natureza, não é apenas desejável, mas também necessário, todavia, persiste o desafio de como torná-lo real. Nesse processo de encontro da sustentabilidade, visualizam-se os obstáculos e as discordâncias sobre a construção de um desenvolvimento multidimensional, que conjugue justiça social, sustentabilidade ambiental, viabilidade econômica, democracia participativa, ética comportamental, solidariedade e conhecimento integrador. A sustentabilidade deve emergir como matriz vinculante da atuação estatal e da coletividade, de forma que se consagre a adoção de um novo paradigma, apto a assegurar o direito fundamental ao ambiente limpo e saudável. É preciso um direito, uma forma regulatória nova, para um interesse historicamente novo. Sendo a questão ambiental a consequência de uma opção moderna de sociedade, de ciência, de desenvolvimento, de economia, é indispensável que se opere uma profunda transformação no modo de vida moderno, sem que se restrinja a apenas um arranjo pontual. O comportamento humano destrutivo demanda por parte do Estado uma reação correspondente: uma política pública ambiental adequadamente planejada, com a utilização de instrumental eficiente que atue de modo a assegurar todos os valores fundamentais da Constituição Federal. Assim, a proteção do meio ambiente deve ser concebida sem se descuidar dos ditames constitucionais atinentes a outros direitos fundamentais protegidos, principalmente aos relacionados à ordem econômica, igualmente garantidores de bem estar à humanidade. O instrumental de uma política ambiental exige um diálogo interdisciplinar com as ciências políticas, econômicas, jurídicas, sociais e naturais muito mais 147 intenso que o praticado até então, prospectando uma análise dos efeitos do agir humano para o futuro. É notório que o homem precisa se utilizar dos recursos naturais, mas, ao mesmo tempo, depende inteiramente dele para garantir padrões dignos de vida. Uma política pública ambiental está indissociavelmente conectada aos fundamentos da economia e do direito, além de questões de ordem social, ética e várias outras. Nesta perspectiva, é essencial, inclusive, um processo de racionalização das incertezas. Com efeito, o crescimento econômico tem se mostrado o maior obstáculo a uma salutar gestão ambiental e, nesse tocante, não é supérfluo ressaltar que a economia precisa respeitar as fronteiras ecológicas. Da mesma forma, porém, não se pode relegar socialmente a importância da economia a pretexto de se garantir a proteção ambiental. Muitos são os desafios da política ambiental brasileira no enfrentamento da celeuma: desenvolvimento econômico, associado ao processo de industrialização e à utilização indiscriminada dos recursos postos na natureza. Questão esta, agravada pela ausência de informações a respeito da extensão e relevância dos problemas resultantes da degradação, fatos que são, dentre muitos outros, impeditivos do controle da poluição e da consolidação do Estado Socioambiental de Direito. Uma política ambiental implica na escolha de um novo pacto social, com repercussão nas mais diversas áreas da ciência. É decisiva a utilização dos instrumentos jurídicos de tutela ambiental, com o escopo de aliviar as tensões entre crescimento econômico e conservação dos recursos naturais. Por conseguinte, deve-se evitar, na formatação das políticas públicas ambientais, qualquer forma de hierarquização prévia quanto aos três grandes pilares do desenvolvimento sustentável: o social, o econômico e o ambiental. É função institucional do Estado buscar através de todo o aparato legal de que dispõe, influir legitimamente nas condutas, por meio de estímulos/desestímulos financeiros, a fim de proporcionar uma ordem econômica ajustada aos novos paradigmas, surgindo a intervenção sobre o domínio econômico por meio da tributação, como forma de bem desenvolver a esfera econômica. As políticas ambientais devem estar consubstanciadas em uma acurada análise dos riscos inerentes à sociedade contemporânea, a qual se notabiliza pela complexidade das relações sociais e por estar em veloz e constante transformação. É forçoso reconhecer que a busca por estratégicas ecológicas eficazes envolve uma 148 mudança de paradigma de desenvolvimento, à medida que a inconsistência da maioria das medidas até hoje adotadas pelo Poder Público contribuiu decisivamente para a reprodução de um modelo de exploração predatório, que acarreta enormes prejuízos econômicos e desmantela o sistema ecológico. As teses que tentam explicar ou encontrar soluções para os problemas ambientais são falíveis. A teoria da externalidades não permite resolver todos os problemas da degradação, assim como, nem tudo se resume a uma contabilização de ganhos e perdas de bem-estar. É impossível se fazer uma mensuração econômica das consequências de todos os atos. Questões como ética, educação, moral, justiça social e cidadania devem ser levadas em consideração pelos indivíduos e pelo Estado, assim como, as relativas à reforma constitucional, segurança social, política ecológica e estratégia fiscal. É necessário o encontro de um ponto de equilíbrio entre as instituições políticas e o mercado, assim, reforçar-se-á a eficiência nestes dois domínios. Não apenas a causa ambiental pode ser servida por instrumentos econômicos, como a introdução de questões ambientais no sistema econômico, especialmente o tributário, pode contribuir para torná-lo compatível com os ditames da sustentabilidade. A ausência de valor de troca do bem-estar, proporcionado pela natureza preservada, não significa que se deva esquecer seu elevado valor de uso. O tributo ecológico pode gerir, então, distorção, conduzindo o agir humano no sentido de que a qualidade de vida não se mede pela quantidade de recursos consumidos. Com a atribuição de um valor econômico aos recursos e ao ambiente por meio da intervenção limitadora e proibitiva do Estado é possível evitar sua destruição desmedida, razão por que é imprescindível a associação: economia/ecologia no trajeto para o desenvolvimento sustentável. É de se esperar, antes, a utilização do direito como instrumental para a garantia da paz social nesta seara. As políticas públicas, de cunho ambiental, exigem grande esforço na medida de sua complexidade, mormente, tendo que considerar a internalização das externalidades negativas decorrentes das atividades econômicas como medida do custo social. A proteção do meio ambiente deve ser concebida, percebendo os perigos, muitas vezes imperceptíveis, próprios da nossa sociedade de risco e atentos ao caráter cada vez mais mutante da sociedade contemporânea, fatores estes que vão ao encontro com a fruição do direito fundamental ao ambiente ecologicamente 149 equilibrado. Os instrumentos econômicos, mais especificamente, os tributos ambientais, são soluções limitadas, considerando a complexidade da crise instaurada, pois que não são suficientes a solver todos os tipos de perturbação ecológica e, estão diretamente vinculados à vontade política e aos aspectos econômicos. Todavia, é pertinente sinalizar acerca da relevância do tributo ecológico, para a persecução dos objetivos do estado socioambiental e, adequação à evolução social, especialmente, no tangente à intervenção direta do Estado no domínio econômico. Assim, melhor será alcançado o objetivo de proporcionar uma eficaz interação entre os componentes do sistema, com a finalidade precípua de fornecer segurança ao domínio econômico e tornar possível o restabelecimento do bem-estar ambiental. É necessária a adoção de políticas ambientais atentas às desigualdades sociais; o consumismo exagerado; à complexidade da celeuma que envolve a compatibilidade entre proteção ambiental e crescimento econômico; à função jurisdicional, frente à ineficiência dos demais poderes estatais na proteção do ambiente e, à busca de um modelo sustentável de desenvolvimento. Inobstante a percepção teórica do enfrentamento da questão, é imensa a dificuldade em solvê-la, sendo esta uma tarefa que merece estudo constante, nunca esquecendo a relação entre as políticas ambientais, o direito e a economia, na busca da dignidade humana. A tributação ambiental brasileira poderia estar muito mais desenvolvida, porém, isto não ocorreu ainda pela falta de conhecimento dos agentes públicos da potencialidade da utilização do tributo como ferramenta de transformação ambiental e pela falta de uma conscientização ecológica global. Não se pretende concluir, todavia, que o direito tributário ambiental seja a chave para solucionar a crise, mesmo porque, a questão ambiental é intricada, porém, pode-se afirmar que esta ferramenta é de grande valia a ser utilizada nas políticas tributárias no combate à crise ambiental, pois que, intervém diretamente na dinâmica econômica da ordem social. A ideia de se prevenir aos danos ecológicos é sublime, pois, muitas vezes, os efeitos da devastação são irreversíveis e, quando reversíveis, são extremamente onerosos e de difícil reparação, seja pelo custo, pela demora ou pela complexidade. Uma política tributária ambiental, se bem executada, pode, sem sombra de dúvida, servir de remédio para cuidar desta ferida aberta na natureza. A par disso, a 150 educação ambiente parece ser o embrião de toda a celeuma, pois que tem por fim disseminar a semente de uma conscientização ecológica incorporando fortemente a proposta de construção de sociedades sustentáveis. Percebe-se que ainda se está diante de um mal incurável, uma enfermidade persistente, um câncer maligno, provocado pelas mãos humanas, mas não se deve ser pessimista, pois com medidas dessa natureza, pode-se prolongar a saúde do Planeta. Considerando todos esses aspectos, a tributação dos comportamentos insustentáveis mostra-se uma ferramenta estatal eficiente e poderosa na tomada de decisões, ao alcance de sua tarefa de defesa da incolumidade do meio ambiente. O tributo ecológico pode se tornar um catalisador do objetivo do Estado Socioambiental. Mostra-se, ainda, mais evidente o uso desse aparado jurídico ao se verificar uma cooperação efetiva do Estado/sociedade, do fisco/contribuinte, numa verdadeira simbiose, onde convergem interesses econômicos e ecológicos – um dos principais desafios deste tempo - num poderoso processo, deflagrado por iniciativa exclusiva do poder público à garantia do bem comum. 151 REFERÊNCIAS ALCOFORADO, I.G. A trajetória dos fundamentos das políticas ambientais – Do comando e controle a abordagem neo-institucionalista. 2012.. Disponível em: . Acesso em: 18 set. 2012. ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Virgílio Afonso da Silva (Trad.). São Paulo: Malheiros, 2008. AMARAL, Paulo Henrique do. Direito tributário ambiental. São Paulo: Rev. dos Tribunais, 2007. ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. 2.ed. Coimbra: Almedina, 2001. ANTUNES, Paulo Bessa. Direito ambiental. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2005. ARAGÃO, Maria Alexandra de Souza. 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 MEDIDA CAUTELAR NA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 
 Relator (a): Min. ILMAR GALVÃO 
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