Entre as frestas das políticas públicas: representações sociais de famílias de crianças em sofrimento psíquico grave
Mostra/ Apri
Data
2020-05-29Autore
Monteiro, Ananaíra
Orientador
Bisol, Cláudia Alquati
Metadata
Mostra tutti i dati dell'itemAbstract
O objetivo desta pesquisa é descrever as representações sociais referentes ao cuidado, nos âmbitos da educação, saúde e assistência social, que emergem nos relatos de famílias de crianças em sofrimento psíquico grave. A resposta que a sociedade apresenta às crianças em sofrimento psíquico grave e às demandas familiares, escolares e sociais, se dá pelo viés de políticas. As políticas públicas e serviços estratégicos no cuidado a essas crianças no Brasil compreendem a educação, expressa pela Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva, a saúde mental, que tem como serviço de referência à crianças e adolescentes os Centros de Atenção Psicossocial Infantojuvenil (CAPSIj), e a assistência social, sob gestão do Sistema Único de Assistência (SUAS), que atua pela Política Nacional de
Assistência Social (PNAS). O sofrimento psíquico grave na infância é de difícil diagnóstico e sujeito à terminologia variável, devido à diversidade teórica que sustenta os olhares sobre os quadros psicopatológicos graves. Considerando esta complexidade, este trabalho elege a terminologia sofrimento psíquico grave. Esta pesquisa, de cunho qualitativo, foi desenvolvida a partir de seis entrevistas realizadas com responsáveis de crianças usuárias de um CAPSIj de um município no interior do Rio Grande do Sul. A análise foi realizada com base na Teoria das Representações Sociais, utilizando-se do método de análise de discurso através da técnica de associação de ideias (SPINK, 2013), sendo possível identificar três eixos, organizados em duas
dimensões associativas em cada. O Eixo I se refere às representações sociais das entrevistadas sobre si mesmas. A primeira dimensão associativa explicita que o exercício de cuidado às crianças é representado pela função de obedecer a ordens e orientações de saberes especialistas, enquanto a segunda apresenta a representação emocional ligada ao exercício de cuidar. O Eixo II apresenta as representações sobre as crianças. A primeira dimensão se refere às representações expressas por normalidade e anormalidade e a segunda sobre o sofrimento psíquico da criança. O Eixo III aborda as representações sobre o cuidado. Na primeira dimensão as representações se referem às intervenções dos dispositivos institucionais em relação ao cuidado das crianças e suas famílias, enquanto a segunda, sobre a medicalização como principal meio de intervenção. As entrevistadas são capturadas pelo discurso técnico e especialista de educadores, médicos e assistentes sociais, pautado em uma visão biomédica. As exigências dos dispositivos institucionais de cuidado contribuem para que haja frestas nas políticas públicas, o que dificulta a trajetória de cuidado. Escola e serviços aparecem relacionados a representações contraditórias de cuidado e negligência diante do sofrimento da criança, justificando assim o deslizamento entre cuidado e controle. Neste cenário, o cuidado parece corresponder a uma necessidade de ordenamento social que evidencia práticas de controle às custas do desaparecimento do sujeito e que parecem não responder à demanda do sofrimento da criança. Em contrapartida, as frestas também aparecem como possibilidade de reinvenção das entrevistadas, que retornam ao seu conhecimento e produzem novas formas de saber acerca do cuidado, baseando-se em suas experiências e considerando a singularidade das crianças.